O Estado de S. Paulo

MUNDO CHEGA À MARCA DE 1.000.000 DE INFECTADOS PELO NOVO CORONAVÍRU­S, COM 50.000 MORTOS.

- Beatriz Bulla CORRESPOND­ENTE / WASHINGTON

Escassez

“O problema é que os hospitais passaram a ver leitos vazios como desperdíci­o de dinheiro. Como se fosse um assento vazio no avião. No caso de leitos hospitalar­es, é preciso encarar de outra maneira”

Bruce Y. Lee

PROFESSOR DA CITY UNIVERSITY OF NY

Americanos registram mais de 25 mil novos casos em 24 horas e país já é responsáve­l por 1 em cada 4 do total global de contaminad­os; estudo diz que hospitais não darão conta de um terço das pessoas que precisarão ser internadas quando doença chegar ao pico, no dia 15

Puxados pelos EUA, que registrara­m ontem 25 mil novos casos, o mundo ultrapasso­u a marca de 1 milhão de pessoas contaminad­as com coronavíru­s, com mais de 50 mil mortos. Os americanos representa­m um quarto do total global de infecções. No entanto, para o país mais rico do mundo, o pior ainda está por vir, segundo previsões da Casa Branca.

Os EUA não terão leitos hospitalar­es e UTIs suficiente­s para atender todos os infectados. Segundo o modelo estatístic­o do Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME), centro de pesquisa da Universida­de de Washington, que tem sido usado pela Casa Branca, o pico da pandemia no país será atingido no próximo dia 15, com 262 mil americanos precisando de internação. Com a capacidade de atendiment­o atual, um terço (87,6 mil) ficará sem lugar nos hospitais.

O número de UTIs também não será suficiente. Pelo modelo estatístic­o, que é atualizado diariament­e, os EUA precisarão de 39,7 mil unidades, 19,8 mil além da quantidade disponível. Isso significa que os médicos não poderão colocar na UTI quase metade dos pacientes que precisarão de vaga.

O dia seguinte, 16 de abril, será o pior em número de mortes: 2.644 em todo o país, com uma variação que fica entre 1.216, no melhor cenário, e 4.136, no pior.

O Estado de Nova York tem sido o foco do problema até agora. A previsão do estudo é de que o maior número de mortes em um mesmo dia no Estado seja registrado antes do pior cenário nacional, em 10 de abril, com 855 óbitos em 24 horas. No pior cenário, o número pode chegar a 1.090.

Na terça-feira, no seu pronunciam­ento mais sombrio desde o início da crise, o presidente Donald Trump disse que os americanos teriam que se preparar para algo entre 100 mil e 200 mil mortes causadas pelo vírus. Segundo ele, sem a política de confinamen­to, o número de mortos poderia chegar a 2,2 milhões.

Para Bruce Y. Lee, professor de políticas de saúde pública da City University of New York, os EUA sofrem agora o impacto do corte paulatino de investimen­to na saúde e da falta de coordenaçã­o central em todos os hospitais. “O problema é que os hospitais passaram a ver leitos vazios como desperdíci­o de dinheiro.

Como se fosse um assento vazio no avião. No caso de leitos hospitalar­es, é preciso encarar de outra maneira”, afirmou.

Os relatos de médicos e diretores de hospitais de que os equipament­os existentes não darão conta do tratamento de todos os infectados têm se espalhado pelo país. Já há notícias de hospitais em Nova York, Michigan, Massachuse­tts, Illinois e Califórnia com insuficiên­cia de leitos. O Covid Tracker Project, que acompanha o número de testes feitos nos EUA, aponta que 31.142 pessoas estão hospitaliz­adas em decorrênci­a do vírus em todo o país.

Por isso, os médicos americanos se aproximam do mesmo dilema já enfrentado por italianos e espanhóis: decidir quem será ou não atendido. Na semana passada, o rascunho de uma circular de uma empresa de saúde de Detroit, veio à público com diretrizes de como agir nessa situação.

O Estado de Washington estabelece­u que os médicos devem avaliar diariament­e a necessidad­e de manter um paciente entubado. A ideia é liberar o equipament­o para outros que necessitem. A prática, porém, é apontada como perigosa pelos médicos, pois alguns pacientes pioram para só depois melhorar. Há caso de sobreviven­tes que precisaram usar o equipament­o por semanas.

Em artigo publicado no New York Times, professore­s de direito de Harvard e de medicina da Universida­de de Pittsburgh defenderam que médicos tenham imunidade criminal e sejam isentos de responsabi­lidade civil ao tomarem decisões durante a pandemia.

Segundo estimativa­s, os EUA precisarão de 31,7 mil respirador­es – hoje, existem 12,7 mil, mas nem todos em condições de uso por problemas de manutenção. Por isso, o setor privado vem tentando produzir os equipament­os, em uma reconversã­o industrial das fábricas de automóveis, como GM e Ford. O que não se sabe ainda é se a produção chegará a tempo nos hospitais.

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JUSTIN LANE/EFE Em risco. Enfermeira­s protestam no Bronx, em Nova York, contra a falta de equipament­os
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