Um lugar para a dor
Este é um livro de estreia, uma bela estreia literária. Mais um livro sobre luto, família, história e identidade que a coluna indica (está difícil fugir desses temas no momento). Publicado em 2019, O Quarto Branco é resultado de um projeto desenvolvido pela jornalista Gabriela Aguerre durante uma pós-graduação em escrita criativa. Acostumada às palavras e às histórias reais, faltava um tema para ela se lançar na ficção.
A escrita de O Quarto Branco começou, portanto, de forma planejada e consciente, mas a autora se deixou levar pela intuição e pelas histórias que atravessavam a narrativa e que a atravessavam enquanto contava a história de Gloria, uma mulher na casa dos 40 anos que perde um bebê e descobre que não poderá mais ter filhos.
O romance começa neste momento delicado e de dor, e a partir daí seguimos Gloria não em uma jornada de superação ou coisa parecida. Mas uma jornada de aceitação – ela entende, e diz, que tudo termina ali, que ninguém vai continuar a sua história – e de recuperação de uma identidade que lhe foi roubada ainda bebê, quando a família vivia no Uruguai e sua irmã gêmea morreu. E esse foi o tema inicial da autora: o duplo e a falta desse duplo.
Gloria embarca em uma viagem rumo ao seu país natal, de onde a família saiu por causa da ditadura, numa tentativa de reencontro com a irmã morta e num acerto de contas com um passado nebuloso. Acompanhamos sua viagem, também no tempo e pelas memórias, enquanto outro luto se avizinha.
Como a autora disse na época do lançamento, O Quarto Branco é um livro que admite que as coisas não são como elas devem ser, mas simplesmente são como são. Que não há nada a ser feito diante do que aconteceu e do que vai acontecer e que, entendendo isso, a inconformidade se transforma em um inconformismo tranquilo.