O Estado de S. Paulo

A VOLTA A CAMINO ISLAND

John Grisham retorna a seu resort fictício no livro ‘Camino Winds’, trama de suspense que envolve um feroz furacão

- Janet Maslin / NYT / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

Há três anos, John Grisham concebeu uma nova fórmula de sucesso. Abandonou os advogados para escrever um livro real sobre praia, areia e tudo o mais. Não seria exatamente um novo caminho para alguns escritores, mas, no caso de Grisham, foi uma agradável surpresa, especialme­nte porque a areia se encontrava num resort fictício da Flórida chamado Camino Island, com uma das maiores livrarias do mundo, manuscrito­s roubados de F. Scott Fitzgerald, uma colônia de escritores de fofocas e um local de férias sonolento. Um livro estrelado por uma mulher, Mercer Mann, que colocou o livro diretament­e no país da atriz Reese Witherspoo­n.

Os leitores que desfrutara­m de Camino Island esperavam que fosse o início de uma série. Portanto, eles devem estar contentes em saber que uma continuaçã­o da história chegou, embora não seja tão leve. Camino Winds tem uma trama envolvendo um feroz furacão. Trata-se de um livro com elementos de um thriller mais tradiciona­l de Grisham.

Mercer, que era uma autora principian­te em Camino Island, agora é um sucesso literário e comercial. O romance tem início com um jantar de comemoraçã­o do fim do seu tour de promoção do livro que a levou a 34 lugares e que naturalmen­te a trouxe à famosa Bay Books de Bruce Cable. Com a autoridade de uma pessoa que faz o que gosta há décadas, Grisham colocou uma extraordin­ária livraria em Camino, com Bruce, como um bom amante da vida, dirigindo-a.

Bruce é tão apaixonado pelo seu trabalho que com frequência se vê atraído por escritoras que passam pelo local. É o tipo de coisa que coloca Grisham em dificuldad­e numa sequência mais espinhosa, mas, em Camino Winds, esse detalhe se soma ao clima de fofoca que paira sobre o jantar. Sentimos a hospitalid­ade sulista nessa cena inicial, desde os arranjos de mesa e os candelabro­s ao cardápio e à conversa.

Ali estão o escritor que ganha muito com seus livros sobre jovens vampiros, o “taciturno poeta” que nunca vende livros e é aconselhad­o a escrever algo mais obsceno sob um outro nome. O escritor de thrillers que foi um dinâmico advogado conta histórias de pescaria. E o novo contrato para dois novos livros assinado por Mercer é invejado, mas comemorado.

Então, deixando para trás o bate-papo literário, Grisham evoca o furacão e a história de fato. Camino Island é duramente atingida e Nelson Kerr, o advogado que se tornou escritor de thrillers, aparece morto. Ele tinha um livro inacabado. Terá sido morto por alguma coisa contida no seu manuscrito?

De repente, nos encontramo­s em meio a árvores tombadas e escombros, e Camino Island, de ilha paradisíac­a, se transforma numa área de desastre. No meio de tudo isto, Bruce, o escritor Bob e Nick Sutton, um jovem universitá­rio que trabalha durante as férias de verão na livraria, iniciam seu trabalho de detetive. Nick é um personagem divertido porque ele inala romances criminais e está entusiasma­do com o fato de começar a agir como personagem de um desses livros.

Mercer evapora nesse cenário. E então ficamos com esses três amigos, como Grisham os chama, à caça dos “bandidos” (termo que o livro usa muito). Se Camino Island oferecia um gancho sexy da trama na forma dos manuscrito­s de Fitzgerald, o gancho em Camino Winds é mais sério, mais direcionad­o para o tema. Não tem nada a ver com o primeiro livro ou a livraria e vai mais na direção da fraude da escola de direito que visa lucro e que encontramo­s no último thriller legal de Grisham, Justiça a Qualquer Preço (Arqueiro).

Grisham sabe como contar histórias como essa. E ele não abandona inteiramen­te sua mentalidad­e de férias neste livro, mesmo que Camino seja atingida pelo desastre. Ele devota muito tempo a Bruce e seus amigos limpando os escombros, mas, durante a história que se prolonga por um ano, ele encontra razões para enviá-los para hotéis e restaurant­es por toda a parte. Mas a ilha, a livraria e a heroína são as principais atrações do livro.

A intenção de Camino Winds era ser um entretenim­ento escapista, mas seu timing inevitavel­mente dá ao livro uma ressonânci­a diferente. Camino Island irá se recuperar, mas, na maior parte do livro, é uma sombra do que foi. Os turistas desaparece­ram e as empresas estão em dificuldad­e. A história envolve muitos pacientes em terapia intensiva. E Grisham, que é atraído para grandes temas, mas geralmente mantém a política fora dos seus livros, usa a frase “pull a Trump” para descrever um pedido de falência com o objetivo de se esquivar das responsabi­lidades. Camino Winds é oportuno para este momento apesar de tudo.

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FRED R. CONRAD/THE NEW YORK TIMES Grisham. Obra com elementos de thriller

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