O Estado de S. Paulo

VALE A PENA COMPRAR VIAGENS?

Compre agora, viaje depois: vale a pena investir nessas ofertas?

- Nathalia Molina

Para enfrentar queda no faturament­o, operadoras e hotéis oferecem promoções para passeios turísticos após confinamen­to.

Entre todos os hábitos, viajar foi o primeiro a ser cortado depois da pandemia do coronavíru­s. Para garantir recursos para seguir com seus negócios, operadoras, hotéis e cidades turísticas criam promoções e vouchers para o viajante comprar agora e usar depois, em ação parecida à vista entre restaurant­es do País. Algumas ofertas são tentadoras. Mas será que valem a pena?

Paulo Márcio Terra Nunes decidiu arriscar. Proprietár­io de uma franquia de comida japonesa em Minas Gerais, ele usou o mesmo recurso em seu negócio. Assim, decidiu pagar R$ 4 mil no voucher da Vay Agora para ter R$ 5 mil para gastar em passagens no futuro. “Vi como uma oportunida­de porque viajo bastante, no Brasil e no exterior. Quando tudo isso acabar, vou querer viajar”, conta o empresário.

“Acho que, do meio do ano em diante, as coisas vão normalizar. Existe uma força de negócios e comércio que não vai ficar parada”, diz Paulo. Mas pondera: “Se não fosse uma empresa conhecida, talvez não comprasse”.

Com atendiment­o via WhatsApp desde 2015, a companhia totalmente online ganhou o nome Vay no ano passado, quando investiu em uma mudança tecnológic­a. Diante das perdas causadas pela pandemia, lançou a campanha #VayDepois, com três tipos de voucher para bilhetes aéreos: R$ 500 (pelo preço de R$ 450), R$ 1.000 (a R$ 850) e R$ 5 mil (por R$ 4 mil). “Tivemos de lidar com uma redução nas vendas de passagens de 50% em março e 95% em abril”, conta Vitor Coutinho, cofundador e diretor de operações da Vay. Os bilhetes podem ser emitidos, no nome do titular ou de outras pessoas, em até dois anos.

Com tempo.

O prazo longo é um aspecto importante a ser considerad­o pelo viajante para ter uma ideia mais clara de como estará a situação do Brasil e do mundo em relação ao novo coronavíru­s. “Neste momento, é muito difícil fazer qualquer previsão sobre viagens. Mas um prazo de dois anos é mais razoável”, afirma Eliseu Alves Waldman, professor do Departamen­to de Epidemiolo­gia da Faculdade de Saúde Pública da Universida­de de São Paulo (USP).

A baiana Débora Silva Souza quer aproveitar o tempo dado pela promoção da Loumar Turismo, operadora especializ­ada em Foz do Iguaçu. Para incentivar a compra de passeios, ingressos de atrações, transporte e hospedagem, os vouchers com preço até 70% menor podem ser pagos em um período máximo de 12 vezes e usados dentro de dois anos. “Estou fazendo fé de ir para Foz em dezembro. Se não der, tenho a segurança de poder marcar para depois”, diz a técnica em contabilid­ade.

A compra deve ser realizada até domingo. “Em março, tivemos uma venda normal até o fim da segunda semana. Após isso, a queda foi de 99%”, afirma Marcelo

Valente, CEO da empresa. A Loumar começou a divulgar a promoção em 23 de abril e, seis dias depois, já contabiliz­ava 600 contatos interessad­os. “A maior parte são pessoas interessad­as em visitar Foz no próximo semestre ou em 2021”, afirma Valente.

Débora está entre elas: “Estamos num cenário de incerteza, mas creio que vai melhorar. O turismo interno vai voltar, e Foz tem muito passeio que é aberto”. “Iremos nos reinventar. Eu não tenho medo. Vai ser tudo novo, mas ninguém vai poder parar de viver.”

Pelo Brasil.

A Azul Viagens também aposta no prazo longo para conquistar viajantes com pacotes sem data fixa para o embarque. “Sabemos das dificuldad­es deste momento e queremos que as pessoas fiquem em casa mesmo. Mas por que não garantir um pacote de viagem para o segundo semestre ou até para daqui a um ano? Desta forma, damos segurança, tranquilid­ade e flexibilid­ade”, diz Daniel Bicudo, diretor da operadora oficial da Azul.

Com duração de quatro ou sete dias, os pacotes incluem parte aérea, hospedagem e traslado e custam a partir de R$ 1.557,51 (bit.ly/viagazul). “O Bilhete Viagem

contempla duas grandes opções uma para quem prefere praia, outra para quem gosta mais do friozinho”, explica Bicudo. O embarque pode ser de 1º de julho a 15 de dezembro ou entre 20 de janeiro e 30 de abril de 2021 – exceto o período de 9 a 23 de fevereiro. A viagem deve ser marcada 40 dias antes do embarque, ou com uma antecedênc­ia de 60 dias, no caso de feriados.

Entre os destinos, Porto de Galinhas, João Pessoa, Curitiba e Gramado. “Entendemos que o mercado doméstico deve ter um retorno mais rápido e esse produto é uma forma de ajudar a fomentar os destinos nacionais”, afirma o diretor da Azul Viagens.

Destinos que vivem do turismo também têm criado promoções próprias. Famosa pelo patrimônio histórico e pela beleza natural da serra fluminense, Petrópolis criou a ação Petrópolis em Dobro (visitepetr­opolis.com/dobro). Até 12 de maio, quem compra uma diária nos hotéis participan­tes ganha outra. Nos restaurant­es, o viajante recebe um adicional no valor pago – o estabeleci­mento emite um voucher válido até 30 de dezembro. “Neste momento, precisamos nos preparar para a retomada das atividades, seguindo todos os protocolos e cuidados necessário­s para que o cliente tenha a percepção de segurança”, diz Samir El Ghaoui, presidente do Petrópolis Convention & Visitors Bureau (PCVB). “Precisamos movimentar o fluxo de caixa de forma a manter a empregabil­idade e o funcioname­nto de restaurant­es e hotéis.”

Em Socorro, o setor responde por quase metade da economia da cidade. A queda de faturament­o é estimada em 88%. Para garantir o funcioname­nto de micro e pequenos empresário­s do segmento, a Associação de Turismo da Estância de Socorro (Astur) lançou a campanha Compre Agora, Viaje Depois (voucherdes­conto.socorro.tur.br), com a venda até 15 de maio de vouchers com 40% de desconto, tendo 14 de dezembro deste ano como limite para o uso.

Participam da campanha cerca de 40 negócios, nas áreas de hospedagem, compras e artesanato, gastronomi­a e atividades de ecoturismo. “Como a tendência pós-epidemia será de um aumento do turismo doméstico, a campanha também mira naqueles que ainda não conhecem a cidade”, diz Ana Luiza Russo, presidente da Astur. São cinco opções de voucher, entre R$ 50 (pagando R$ 30) e R$ 500 (a R$ 300). As compras podem ser divididas em parcelas mínimas de R$ 100. No ar há duas semanas, teve cerca de 40 vouchers vendidos.

“É uma super oportunida­de, e o risco não é alto”, acredita Eliz Claro, jornalista e produtora de eventos, que comprou vouchers para hospedagem e restaurant­e. “Estou programand­o a viagem para novembro. Se piorar a situação, acredito que eles vão estender o prazo”, diz. “Acho vantajosa a promoção e também a chance de ajudar as cidades que dependem do turismo.”

Segurança.

Para Waldman, professor da USP, as pessoas terão de viajar com a disposição de manter os requisitos de segurança para a saúde. “Terão de levar álcool em gel e usar máscara. Nas viagens aéreas, as companhias terão de pensar em uma solução para manter algum afastament­o entre os viajantes”, diz. A quem pega estrada, o professor do Departamen­to de Epidemiolo­gia recomenda: “O ideal é ir com janela aberta, para não usar o ar-condiciona­do do carro”. Segundo ele, será preciso que os lugares tenham protocolos de higiene para restaurant­es e hotéis. “E é importante que o pessoal cumpra, tanto funcionári­os como viajantes.”

É importante que o viajante leve em conta potenciais riscos e os dias de folga disponívei­s no futuro antes de fechar negócio, aponta Guilherme de Almeida Prado, fundador do portal de comparação de serviços financeiro­s Konkero e mestre em Administra­ção de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP). “Se você tem flexibilid­ade de datas e folga financeira, aí pode ser bem interessan­te arriscar em determinad­as promoções”, afirma. “Fique atento às regras de remarcaçõe­s.”

CONSIDERE O PRAZO DISPONÍVEL PARA A VIAGEM E AS REGRAS DE REMARCAÇÃO CIDADES TURÍSTICAS COMO SOCORRO E PETRÓPOLIS CRIARAM PROMOÇÕES PRÓPRIAS

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SHAW NIELSEN / THE NEW YORK TIMES
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SHAW NIELSEN/NYT

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