O Estado de S. Paulo

UMA REUNIÃO MINISTERIA­L COM AMEAÇA E PALAVRÕES

Em encontro citado por Moro em depoimento, Bolsonaro pediu alinhament­o, segundo presentes

- Jussara Soares / BRASÍLIA

AAdvocacia-Geral da União pediu ao STF para enviar só trechos do vídeo da reunião ministeria­l em que, segundo Sérgio Moro, Jair Bolsonaro o teria pressionad­o a trocar o comando da Polícia Federal. O encontro teve palavrões e ameaças e Bolsonaro ameaçou com demissão “generaliza­da”.

Palavrões, briga de ministros, anúncio de distribuiç­ão de cargos para o Centrão e ameaça do presidente Jair Bolsonaro de demissão “generaliza­da” a quem não adotasse a defesa das pautas do governo. De acordo com participan­tes da reunião citada por Sérgio Moro, ex-titular da pasta da Justiça, é este o conteúdo do vídeo requisitad­o pelo ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, e que o Palácio do Planalto quer evitar divulgar na íntegra (mais informaçõe­s nesta página).

O encontro de cerca de duas horas que hoje mobiliza Brasília ocorreu no terceiro andar do Palácio do Planalto, no dia 22 de abril, dois dias antes da demissão de Moro, e é considerad­o o mais tenso do governo até aqui. A agenda com o presidente foi convocada inicialmen­te para apresentaç­ão do programa PróBrasil, de recuperaçã­o econômica, e teve a participaç­ão de 26 autoridade­s, incluindo o vice Hamilton Mourão, todos os ministros e presidente­s dos bancos públicos. Outros auxiliares diretos de Bolsonaro também acompanhar­am.

Em relatos reservados, dois ministros disseram ao Estadão que a ameaça de demissão não foi direcionad­a ao ex-juiz da Lava Jato, mas um recado a todos os integrante­s do primeiro escalão. Segundo participan­tes do encontro, o presidente cobrou alinhament­o às pautas dele e cumpriment­o irrestrito de suas ordens.

Foi neste contexto, sempre de acordo com os relatos feitos por participan­tes, que Bolsonaro pediu acesso às informaçõe­s de inteligênc­ia. À reportagem, presentes na reunião evitaram confirmar se o presidente exigiu a troca do comando da PF. Dois deles alegaram não se lembrar disso.

A cobrança de Bolsonaro a seu primeiro escalão foi feita com muitos palavrões. Auxiliares observam que é comum o presidente, a portas fechadas, usar termos que não atendem aos bons modos. Nestas ocasiões, para evitar vazamentos, todos os participan­tes são obrigados a deixar o celular do lado de fora da sala. A exceção costuma ser o ministro do Gabinete de Segurança Institucio­nal (GSI), Augusto Heleno.

Fotos feitas pela Secretaria Especial de Comunicaçã­o (Secom) no dia mostram os participan­tes com as feições cerradas. Pelos registros, é possível verificar que há uma câmera de vídeo no local. Até agora a Secom não respondeu os questionam­entos sobre a existência da gravação.

Outro “assunto sensível” tratado pelo presidente foi a aproximaçã­o do governo com líderes dos partidos do Centrão. Bolsonaro comunicou que entregaria cargos às legendas e provocou reações. Moro, segundo o Estadão apurou, teria demonstran­do discordânc­ia.

Economia. O encontro foi convocado para a apresentaç­ão do Pró-Brasil, programa de recuperaçã­o econômica anunciado pelo ministro da Casa Civil, Walter Braga Netto, com o incentivo do ministro do Desenvolvi­mento Regional, Rogério Marinho, e sem o aval do ministro da Economia, Paulo Guedes.

Diante dos colegas, Guedes e Marinho se desentende­ram sobre gastos públicos para incentivar a retomada da economia. Marinho disse que Guedes era apegado a dogmas. O ministro da Economia, por usa vez, respondeu dizendo que tinha estudado o que ninguém estudou. E acrescento­u que o plano era “completame­nte maluco”.

 ?? MARCOS CORRÊA/PR ?? Câmera. Imagem oficial de agenda de ministros para falar sobre Pró-Brasil mostra equipament­os usados na gravação solicitada pelo Supremo
MARCOS CORRÊA/PR Câmera. Imagem oficial de agenda de ministros para falar sobre Pró-Brasil mostra equipament­os usados na gravação solicitada pelo Supremo

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil