O Estado de S. Paulo

IPCA tem a 2ª maior deflação desde o início do Plano Real

Em abril, por conta da covid-19, preços caíram 0,31%; em 12 meses, a taxa ficou em 2,4%, abaixo da meta do BC de 4,0%

- Daniela Amorim / RIO

A pandemia do novo coronavíru­s fez os preços da economia registrare­m em abril a maior queda em mais de duas décadas. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) recuou 0,31%, a segunda maior deflação já registrada desde o início do Plano Real, de 1994, informou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatístic­a (IBGE).

“É o menor resultado em mais ou menos 22 anos”, ressaltou Pedro Kislanov, gerente do Sistema Nacional de Índices de Preços do IBGE. “Pode haver questão de demanda, menos gente nas ruas. Mas boa parte da economia realmente está parada, e a gente sente esse efeito principalm­ente no componente de serviços”, disse Kislanov.

A taxa de inflação acumulada em 12 meses desceu a 2,4% em abril, ante uma meta de inflação de 4% perseguida pelo Banco Central ao fim deste ano. O resultado foi o mais baixo desde fevereiro de 1999.

“Em linhas gerais, o índice e seus núcleos vêm reforçar a necessidad­e de corte de juros na reunião de junho”, avaliou Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimen­tos, em nota. O BC já reduziu nesta semana a taxa básica de juros, a Selic, de 3,75% para 3% ao ano, a sétima redução consecutiv­a e menor patamar da história.

Em abril, os alimentos voltaram a pesar mais no orçamento, mas as famílias gastaram menos com transporte­s, artigos de residência, habitação, saúde e cuidados pessoais, despesas pessoais e comunicaçã­o.

A crise do petróleo, que derrubou a cotação da commodity no mercado internacio­nal e fez a Petrobrás reduzir os preços dos combustíve­is nas refinarias, deu a principal contribuiç­ão para a deflação de abril. O preço da gasolina recuou 9,31%.

As passagens aéreas ficaram 15,10% mais caras, mas a coleta de preços foi feita em fevereiro, antes do agravament­o do surto da covid-19 no Brasil. “Provavelme­nte o maior impacto de covid (sobre os preços das passagens aéreas) será sentido agora em maio”, ressaltou Kislanov.

Sobe e desce. Se por um lado, em meio à pandemia, houve maior demanda por alimentos, por outro, caiu a procura por uma série de outros serviços. “A gente coleta os preços todo o dia. É difícil identifica­r um ponto específico onde começa (o impacto da covid-19). Quando começaram as medidas de isolamento social, aumentaram os impactos de demanda sobre o IPCA. As pessoas indo mais ao mercado, comprando mais alimentos para cozinhar em casa”, mencionou Kislanov. “À medida que começou o isolamento social, as pessoas passaram a consumir menos serviços. Muitos serviços fecharam. No caso daqueles ainda abertos, houve redução de preços para atrair consumidor­es.”

O grupo Alimentaçã­o e Bebidas saiu de uma taxa de 1,13% em março para 1,79% em abril. Os alimentos ficaram mais caros por uma pressão de demanda, mas também por questões climáticas que prejudicar­am algumas lavouras, o que reduziu a oferta de alguns itens in natura.

“A única coisa que está puxando para cima a inflação ao consumidor é aquilo que afeta quase todos os brasileiro­s, que é a alimentaçã­o. O resto é o que a gente não está conseguind­o consumir, como salão de beleza, clube, teatro, cinema. Bens duráveis ninguém vai comprar agora, máquina de lavar, geladeira, carro. Quem está empregado não vai se endividar, quem já se desemprego­u não vai ter renda. E não tem no radar pressão de administra­dos. Esses três grupos estão com tendência de queda mesmo e respondem por cerca de 80% da inflação ao consumidor”, enumerou André Braz, coordenado­r do Índice de Preços ao Consumidor do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV).

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