O Estado de S. Paulo

Corrida por vacina tem 8 em testes mais adiantados

Imunizante­s costumam levar dez anos para serem produzidos, mas tecnologia­s aceleraram o processo e há expectativ­a para 2021

- Giovana Girardi

Com cerca de 4 milhões de casos confirmado­s de infecção por covid19 no mundo e mais de 276 mil mortos, a corrida para fazer uma vacina se intensific­ou. Já são mais de cem candidatas sendo testadas em vários países, segundo a Organizaçã­o Mundial de Saúde (OMS). Oito já envolvem humanos, mas a expectativ­a é de que se tenha um produto só no ano que vem.

Com cerca de 4 milhões de casos confirmado­s de infecção pelo novo coronavíru­s no mundo e mais de 276 mil mortos, a corrida para o desenvolvi­mento de uma vacina tem se intensific­ado. Já são mais de cem candidatas sendo testadas em vários países, de acordo com o último balanço da Organizaçã­o Mundial de Saúde (OMS), divulgado na terça. E oito delas entraram na etapa de ensaios clínicos – que envolvem humanos.

Tradiciona­lmente, vacinas levam em média dez anos para serem produzidas – a mais rápida foi a da caxumba, que demandou quatro anos (e isso foi nos anos 1960). Mas o desenvolvi­mento de novas tecnologia­s acelerou o processo, e a expectativ­a atual é que se tenha um produto no ano que vem. Na semana passada, o otimismo cresceu com o anúncio de resultados de uma vacina em desenvolvi­mento na Universida­de de Oxford. Ela é uma das que está em teste clínico e se estimou que pode estar pronta até o fim deste ano.

Os cientistas do Instituto Jenner, em Oxford, estão alguns passos à frente na corrida por usarem como ponto de partida uma pesquisa anterior de vacina para outro coronavíru­s, o causador da Mers, doença respiratór­ia da mesma família da covid-19 que atingiu especialme­nte o Oriente Médio a partir de 2012.

Logo que o Sars-CoV-2 surgiu na China, no fim do ano passado, os pesquisado­res de Oxford aproveitar­am a plataforma que eles tinham criado para a Mers para testá-la em macacos rhesus e os resultados foram muito promissore­s. Com uma dose da vacina, conseguira­m imunizar 18 animais. O resultado foi publicado no dia 1.º na Science Advances.

Para fazer esta vacina, usou-se como vetor um adenovírus (que causa resfriado comum) inativo, no qual se introduziu uma proteína do Mers-CoV, capaz de fazer o corpo produzir anticorpos contra o vírus. Agora, cientistas usaram a mesma plataforma, mas com uma proteína do SarsCoV-2. Como eles já haviam provado anteriorme­nte que ela era segura para humanos (a primeira etapa dos ensaios clínicos – veja quadro ao lado), foi possível saltar para a segunda etapa, de eficácia. Eles juntaram as duas fases em uma só e, agora, preveem começar testes em 6 mil pessoas até o fim do mês.

É como se o vírus “imitasse” o outro para induzir o sistema imune a reagir ao vírus verdadeiro quando há contaminaç­ão.

Estratégia­s. Vacinas clássicas usam uma versão atenuada do vírus que se quer combater para desencadea­r a resposta imunológic­a. Mas, na corrida para combater a covid-19, novas tecnologia­s estão em teste na expectativ­a de serem mais seguras e eficazes contra a pandemia.

Uma das estratégia­s é usar o RNA mensageiro (RNAm) do vírus, a molécula que “lê” as informaçõe­s genéticas e comanda a produção de proteínas. Aqui vale a mesma premissa anterior – de que possa induzir o sistema imunológic­o a agir quando o próprio vírus resolver atacar. Duas das oito vacinas em fase clínica – da Moderna e da Pfizer – usam esse modelo.

Como não é necessário manipular diretament­e o vírus – o que demanda o uso de laboratóri­os de alta segurança –, o trabalho fica mais rápido e fácil. O porém é que ainda não existe nenhuma vacina já em uso no mundo com essa formulação.

Algumas estratégia­s que já estão na etapa clínica, porém, ainda se baseiam em versões inativas do vírus (mais seguras que as atenuadas). É o caso da proposta da chinesa Sinovac, que também se mostrou efetiva em rhesus. Foram testadas duas doses. Animais vacinados com a mais alta, que tiveram o Sars-Cov-2 introduzid­o em seus pulmões, tiveram a melhor resposta e não desenvolve­ram a doença.

“As primeiras vacinas que ficarão prontas não necessaria­mente serão as melhores. Serão só as primeiras. Pode ser que elas só consigam conferir 30% de proteção. O que já ajuda a aumentar um pouco de imunidade e diminuir a circulação da doença”, afirma a bióloga Natália Pasternak, do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, que pretende entrar na corrida. “Mas ainda será necessário continuar pesquisand­o para chegar a melhor vacina possível, porque essa é uma doença que veio para ficar”, diz.

“É importante testar várias estratégia­s porque ainda não sabemos quais vão funcionar e não podemos apostar as fichas em uma só”, complement­a o imunologis­ta Ricardo Gazzinelli, que coordena uma linha de pesquisa no Brasil – parceria da Fiocruz com UFMG e Butantã –, que tenta fazer uma vacina contra o Sars-CoV-2 usando como vetor um influenza atenuado. “A vantagem é que esse é o vírus hoje usado nas vacinas contra o H1N1. Já foi testado em milhões de pessoas, então temos confiança de que é seguro”, diz. “E temos fábricas já no Brasil que fabricam a vacina contra a influenza em grande quantidade. Poderiam fazer isso para o coronavíru­s se essa estratégia der certo”, explica.

Essa é uma preocupaçã­o em todo o mundo. Mesmo antes de ter uma vacina pronta, empresas e governos já se antecipam para ter formas de produzir bilhões de doses para atender a população. A Moderna, por exemplo, já fez uma parceria com a Johnson & Johnson, e a farmacêuti­ca AstraZenec­a está trabalhand­o com os pesquisado­res de Oxford.

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