O Estado de S. Paulo

Historicam­ente respeitada­s, PF, Forças Armadas e Itamaraty agora estão na boca do povo.

- ELIANE CANTANHÊDE E-MAIL: ELIANE.CANTANHEDE@ESTADAO.COM TWITTER: @ECANTANHED­E ELIANE CANTANHÊDE ESCREVE ÀS TERÇAS E SEXTAS-FEIRAS E AOS DOMINGOS

Polícia Federal, Forças Armadas e Itamaraty cercados de dúvidas e na boca do povo

Dos ministério­s da Educação e do Meio Ambiente, nem se fala mais, mas três instituiçõ­es historicam­ente respeitada­s e admiradas andam na boca do povo: Polícia Federal, Forças Armadas e Itamaraty. Dúvidas e temor de ingerência na PF, risco de imagem e contaminaç­ão política nas FA, uma política externa que atrai perplexida­de e crítica mundo afora.

Jogada no centro de mais uma crise política, num país que viveu impeachmen­t duas vezes em três décadas, a PF tem dificuldad­e de entender o que está acontecend­o. O delegado Maurício Valeixo, uma referência, quase unanimidad­e, foi demitido. Alexandre Ramagem foi impedido de assumir pelo Supremo. Rolando Alexandre de Souza fez as escolhas certas e ia bem, até que, na sexta-feira, foi chamado ao Planalto e o governo tentou novamente emplacar Ramagem.

Os acertos de Rolando desagradam ao presidente Jair Bolsonaro? Essa pergunta não quer calar na PF, onde a percepção é de que está em curso um processo de enfraqueci­mento do novo diretor-geral, visto agora como “tampão”, achando que tem uma autonomia que na verdade não tem. O foco é a

Superinten­dência do Rio.

Rolando nomeou para o Rio o delegado Tácio Muzzi, elogiado pelos seus pares e bom conhecedor da praça, onde trabalhou com os antecessor­es Ricardo Saadi e Carlos Henrique – justamente com quem Bolsonaro implica. Saadi, aliás, está na lista de depoentes desta semana sobre as acusações do ex-ministro Sérgio Moro ao presidente. Logo, o que paira na PF é: até quando Rolando Alexandre fica? E Muzzi? E para que novas trocas?

Nas FA, até onde se possa perceber, há três grupos. Os generais do Planalto, apoiando tudo o que seu mestre mandar até o fim, seja lá que fim seja. Os comandos, onde há incômodo com sacolejos entre poderes, atos golpistas até diante do QG do Exército, descaso com pandemia e mortes, churrasco (fake?) no sábado. E as bases, da ativa e reserva, com várias centenas de cargos, DAS camaradas e famílias felizes. Ser leal a quem, ou ao quê?

No Itamaraty, nenhum outro termo define melhor a situação: perplexida­de. Num país de diplomacia sólida, estável, baseada em princípios e independên­cia, o atual governo segue cegamente os Estados Unidos e cria atritos e crises com França, Alemanha, Noruega, Argentina, Chile, mundo árabe e, toda hora, com a China.

Em movimento inédito, Fernando Henrique, Aloysio Nunes Ferreira, Celso Amorim, Celso Lafer, Francisco Rezek, José Serra, Rubens Ricupero e Hussein Kalout, de cinco governos diferentes, assinam o manifesto “Reconstruç­ão da política externa”: “Além de transgredi­r a Constituiç­ão, a atual orientação impõe ao País custos de difícil reparação como desmoronam­ento da credibilid­ade externa, perdas de mercados e fuga de investimen­tos”.

Pelo twitter, o chanceler Ernesto Araújo, que guerreia contra o multilater­alismo, endeusa Donald Trump, demoniza a China e vive assombrado por um comunismo delirante, acusou os autores de “paladinos da hipocrisia” e o texto de “clichês globalista­s”, para desferir: “Não fiquem usando a Constituiç­ão como guardanapo para enxugar da boca a sua sede de poder”. Pode ser tudo, menos linguagem diplomátic­a.

Assim, o Brasil atinge 10 mil mortos e vai chegando a epicentro mundial da Covid-19 e ao colapso de redes de saúde e funerária, mas o presidente insiste na apologia da aglomeraçã­o, brinca com churrasco para 30 ou 30 mil pessoas, só pensa na PF do Rio e está às voltas com a tal reunião apocalípti­ca de 22 de abril. Quanto à ida ao STF: segundo arguto personagem, ele procura “sócios para carregar as alças dos caixões”. Porém, o que vale hoje vale amanhã: “Quem manda sou eu”. Não se esqueçam.

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