O Estado de S. Paulo

Planalto trabalha para tentar minar candidatur­a de ex-juiz

Aliados de Bolsonaro tratam Moro como ‘candidatís­simo’ e aguardam julgamento em Comissão de Ética

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No Planalto, a percepção é de que o ex-ministro Sérgio Moro é “candidatís­simo”, expressão usada pelo próprio presidente Jair Bolsonaro em uma conversa reservada. O temor de que o ex-chefe da Lava Jato divida os votos da direita é combustíve­l para o governo traçar estratégia­s políticas.

O governo avalia que tanto o discurso feito por Moro ao abandonar o ministério, no último dia 24, quanto o depoimento de oito horas que deu à Polícia Federal em Curitiba, no dia 2, como parte do inquérito instaurado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para investigar a suposta interferên­cia do presidente na PF são ações políticas milimetric­amente calculadas.

Segundo pessoas que estiveram na reunião ministeria­l do dia 22 de abril, citada por Moro em seu depoimento e na qual Bolsonaro teria pressionad­o o ex-ministro a mudar a chefia da PF, a gravação requerida pelo ministro do STF Celso de Mello, relator do inquérito, não mostra muita coisa além do que já se sabe, mas tem potencial para desgastar o governo.

O principal motivo são palavrões e outras ofensas desferidos por ministros contra os integrante­s do Supremo. Um dos mais exaltados teria sido, segundo relatos, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, embora não tenha sido o único da sala a se referir de forma desrespeit­osa aos magistrado­s.

Os olhos do Planalto, neste momento, se voltam para uma denúncia contra Moro feita por um grupo de 14 advogados na Comissão de Ética Pública da Presidênci­a para que o ex-ministro seja investigad­o por possíveis atos ilícitos no período em que ocupou o cargo. Se for condenado pela Comissão, Moro fica inelegível.

A peça é assinada pelo jurista Celso Antonio Bandeira de Mello, próximo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e pelos advogados Mauro Menezes, presidente da Comissão no governo Dilma Rousseff, e Marco Aurélio de Carvalho, filiado ao PT, entre outros.

O fato de petistas assinarem a denúncia, segundo fontes do Planalto, dá mais força à estratégia, pois isentaria Bolsonaro de participaç­ão na manobra para tirar Moro da corrida em 2022.

Outra questão pendente que envolve o ex-ministro é o julgamento da sua imparciali­dade na condução dos processos da Operação Lava Jato, solicitado pela defesa do ex-presidente Lula. Dos cinco ministros da Segunda Turma do Supremo, dois (Edson Fachin e Cármen Lúcia) votaram a favor do ex-juiz.

Capital. Embora esteja recluso desde que deixou o governo, com exceção do depoimento que deu à PF e de algumas postagens nas redes sociais para rebater Bolsonaro, Moro ainda tem capital político, segundo lideranças partidária­s.

Para o ex-deputado Roberto Freire, presidente do Cidadania, a saída de Moro do governo pode credenciá-lo no setor liberal da economia e da política. “Moro deixou Bolsonaro isolado com a extrema direita. O exministro tem vida própria”, afirmou Freire.

O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), acredita que é preciso esperar o desenrolar das investigaç­ões contra Bolsonaro. “Antecipar demais gera um problema que não é necessário agora, tem que saber exatamente até que ponto vão as investigaç­ões em face do comportame­nto do presidente”, afirmou. Ele argumenta que a apuração pode “escancarar que a gente tem um vácuo de liderança com esse perfil (de combate à

corrupção)”, disse Vieira. Segundo ele, as bandeiras levantadas por Bolsonaro da renovação política e do combate à corrupção não se confirmara­m.

Para o empresário Rogério Chequer (Novo), um dos fundadores do movimento Vem Pra Rua, o ex-ministro tem apoio dos grupos “lavajatist­as” que pediram o impeachmen­t de Dilma Rousseff em 2015. “Moro tem um capital muito grande com esse grupos e isso não mudou após ele deixar o governo. Isso conta muito em uma eventual candidatur­a”, disse Chequer.

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