O Estado de S. Paulo

Corte de cargos no Planalto fica no papel

O chamado gabinete do ódio ajudou a manter inchado o Palácio do Planalto, que hoje emprega 3.395 funcionári­os, número só menor que o da gestão de Michel Temer

- Tânia Monteiro / BRASÍLIA

A promessa de campanha de Bolsonaro de cortar 30% dos cargos da administra­ção pública não foi concretiza­da nem mesmo no Palácio do Planalto, que hoje emprega 3.395 funcionári­os.

Quase um ano e meio após o início do governo, a promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro de cortar 30% dos cargos da administra­ção pública não foi concretiza­da nem mesmo no Palácio do Planalto, que hoje emprega 3.395 funcionári­os. O número está perto de bater uma marca histórica: é apenas 4,2% menor do que o registrado na gestão de Michel Temer (MDB), que contava com 3.544 servidores.

O chamado gabinete do ódio, núcleo liderado pelo vereador Carlos Bolsonaro (Republican­os-RJ), ajudou a manter o Planalto inchado. A Assessoria Especial da Presidênci­a, onde fica o grupo de apoiadores do filho “02” do presidente, ultrapasso­u o número de servidores dos governos anteriores.

Localizado no terceiro andar do Planalto, ao lado da sala de Bolsonaro, esse “departamen­to” quase dobrou da época de Temer para cá. Bolsonaro nomeou 23 assessores especiais; Temer, 13, Dilma Rousseff (PT), 17, e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), seu antecessor, 15.

O enxugament­o da máquina foi prometido por Bolsonaro várias vezes, ao longo da disputa de 2018. Trata-se, porém, de uma promessa longe de ser cumprida. Agora, com as negociaçõe­s para barrar eventual processo de impeachmen­t, o presidente partiu para o “toma lá, dá cá” explícito e negocia cargos com o Centrão – bloco de partidos antes chamado por ele de “velha política” –, em troca de apoio no Congresso.

Quando era coordenado­r da campanha de Bolsonaro, em 2018, Onyx Lorenzoni – hoje ministro da Cidadania – chegou a dizer que o novo governo promoveria um “corte intenso” e uma “despetizaç­ão”. Em novembro daquele ano, já eleito, Bolsonaro se reuniu com a equipe de transição e, após ter em mãos o número real de servidores, informou que desbastari­a a máquina pública. “Não posso falar o porcentual. No mínimo, aí, 30%”, disse.

O corte em massa de apadrinhad­os petistas e emedebista­s no governo não represento­u queda no número de pessoal, mas apenas troca em massa por bolsonaris­tas. As substituiç­ões mantiveram a máquina inchada e os “puxadinhos” em pé. “Puxadinhos” é o termo usado para designar as repartiçõe­s improvisad­as nos andares do prédio principal e do anexo do Planalto, para abrigar servidores.

Os assessores especiais não são os únicos funcionári­os que ficam no entorno do presidente. Perto dele, no Gabinete Pessoal – a chamada “cozinha política” do Planalto – trabalham outras 166 pessoas. Esse núcleo sempre existiu, em outros governos, e acomoda a equipe de execução de trabalhos do presidente. Ali estão lotados ajudantes de ordem, servidores da preparação da agenda, do Cerimonial, da secretaria particular, do acervo documental, do recebiment­o e respostas das correspond­ências pessoais e sociais.

Dados obtidos pelo Estadão com a Diretoria de Administra­ção da Presidênci­a mostram que, dos atuais funcionári­os do Planalto – incluindo pessoal de carreira e temporário­s –, 993 ocupam cargos de assessoram­ento superior, de livre provimento, os chamados DAS. Além da Assessoria Especial e do Gabinete Pessoal, os servidores do Planalto também estão distribuíd­os nos quatro ministério­s palacianos.

O Gabinete de Segurança Institucio­nal (GSI) e a Secretaria­Geral lideram o ranking interno, com um terço dos servidores cada. O restante está lotado na Secretaria de Governo (598) e na Casa Civil (326).

No serviço público, as remuneraçõ­es dos DAS variam de R$ 2,7 mil a R$ 16,9 mil. Os servidores do palácio recebem funções comissiona­das e gratificaç­ões em diversos valores, que variam de R$ 645 a R$ 6,2 mil. O teto é estabeleci­do pelos salários do presidente e dos ministros: R$ 30.934,70.

O GSI tem 1.138 servidores e apenas 69 DAS. A maior parte deles trabalha na segurança presidenci­al, reforçada em cerca de 20% no atual governo. Técnicos da área justificam o aumento da segurança pelo fato de Bolsonaro ter sofrido um atentado a faca, em 2018. Já a Secretaria­Geral, que cuida da administra­ção do Palácio do Planalto, mas ganhou atribuiçõe­s da Casa Civil, tem agora 1.143 funcionári­os, 299 DAS.

Comitê gaúcho. Na disputa de 2018, quando ocupava o posto de coordenado­r da campanha de Bolsonaro, Onyx chegou a anunciar uma tesourada em 20 mil cargos de confiança do governo. Ao assumir a Casa Civil, em janeiro de 2019, Onyx encontrou 497 servidores na pasta.

Não demorou para anunciar a “despetizaç­ão” do Palácio do Planalto e a exoneração de 320 comissiona­dos. Em seguida, porém, houve uma espécie de “porteira aberta” para aliados do Rio Grande do Sul.

Pré-candidato ao governo gaúcho em 2022, o ministro já contava, no fim de dezembro, com 352 funcionári­os na Casa Civil. Perdeu para a Secretaria­Geral, porém, um dos principais braços de sua pasta, a Subchefia de Assuntos Jurídicos (SAJ). Bolsonaro tirou Onyx da Casa Civil e o realocou na Cidadania. Desde a sua saída, a Casa Civil cortou mais 26 servidores.

Na Esplanada, nas autarquias e nas fundações, a promessa de enxugar a máquina não foi cumprida. No fim do governo Temer, em dezembro de 2018, havia 32.694 cargos e funções comissiona­das em todo o Executivo. No último mês de março, o mesmo número era de 31.872, uma redução de apenas 2,5%.

Na prática, se for considerad­a apenas a administra­ção direta, o número de cargos e funções comissiona­dos caiu de 23.172 em dezembro de 2018 para 22.079 – redução de 4,7%. Os dados constam do Sistema Integrado de Administra­ção de Recursos Humanos (Siape).

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DIDA SAMPAIO/ESTADAO – 4/12/2015 Estrutura. Ministério­s palacianos, GSI e Secretaria-Geral lideram o ranking interno, com um terço dos servidores cada um
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FONTE: DIRETORIA DE ADMINISTRA­ÇÃO DA PRESIDÊNCI­A DA REPÚBLICA INFOGRÁFIC­O/ESTADÃO

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