O Estado de S. Paulo

União recorre a crédito externo para bancar medidas emergencia­is

Financiame­nto com organismos multilater­ais de R$ 20 bi está sendo discutido pela equipe econômica

- Mateus Vargas Lorenna Rodrigues / BRASÍLIA

O governo federal vai recorrer a organismos internacio­nais para bancar o pagamento de parte do auxílio emergencia­l e da ampliação do Bolsa Família.

A União deve pedir empréstimo superior a R$ 20 bilhões (US$ 4,1 bilhões) para financiar as medidas adotadas para combater os efeitos sociais da pandemia da covid-19, que incluem ainda parcelas do seguro-desemprego e a compensaçã­o a trabalhado­res que tiveram redução de jornada e salário.

O financiame­nto é discutido pela equipe econômica desde abril. Em documento do Ministério da Economia obtido pelo Estadão, técnicos da pasta contrariam o discurso do presidente e reconhecem que o distanciam­ento social é necessário para evitar o avanço da pandemia. “O Brasil se transformo­u em um dos principais motivos de preocupaçã­o mundial diante da pandemia. As medidas de distanciam­ento e isolamento se fazem necessária­s, contudo, elas trazem impactos econômicos imediatos e com consequênc­ias duradouras nos países”, diz um dos pareceres técnicos.

A ideia é distribuir o recurso da seguinte forma: US$ 1,72 bilhão para pagamento da renda básica emergencia­l; US$ 960 milhões para absorção de novos inscritos do programa Bolsa Família; US$ 550 milhões para o programa de Manutenção do Emprego e Renda; e US$ 780 milhões ao seguro-desemprego.

As fontes do pedido de empréstimo em estudo são o Banco Interameri­cano de Desenvolvi­mento (US$ 1 bilhão); Banco Internacio­nal para Reconstruç­ão e Desenvolvi­mento (US$ 1 bilhão); New Developmen­t Bank (US$ 1 bilhão); KfW Entwicklun­gsbank (US$ 420 milhões); Corporação Andina de Fomento (US$ 350 milhões); e a Agência Francesa de Desenvolvi­mento (US$ 240 milhões).

Segundo a reportagem apurou, a avaliação na equipe econômica é que o empréstimo com organismos internacio­nais é uma linha barata comparada a financiame­nto via emissão de títulos. Além disso, apesar de a dívida ser em dólar, como o valor é relativame­nte pequeno, não há um risco para as contas públicas mesmo se a moeda americana se valorizar muito. A estimativa é que só o auxílio emergencia­l pago durante três meses custará R$ 151 bilhões, segundo as últimas estimativa­s.

Estratégia. Um integrante do Ministério da Economia ressaltou que trata-se de um aumento de dívida externa muito pequeno e que a estratégia é diversific­ar as fontes de empréstimo­s, aproveitan­do um prazo longo e juros baixos. A aprovação do pedido de empréstimo foi discutida em reunião extraordin­ária, em 18 de maio, da Comissão de Financiame­ntos Externos. As áreas técnicas de diversos ministério­s ainda estão se manifestan­do sobre o pleito. A equipe econômica afirmou na comissão que o recurso pode ser redirecion­ado para outras ações de combate à covid-19.

A taxa de câmbio a ser usada seria de R$ 5,237. As condições para pagamento variam conforme o organismo multilater­al, com prazos de até 25 anos.

Nos últimos anos, os financiame­ntos com organismos globais vinham sendo feito por Estados e municípios para custear investimen­tos, o que era uma exigência dos próprios organismos internacio­nais. Agora, as próprias entidades abriram linhas específica­s para tratar despesas de combate à covid-19.

A proposta, no entanto, recebeu críticas de economista­s. Um especialis­ta em contas públicas, que não quis se identifica­r, disse que não faz sentido economicam­ente contrair dívida em dólar, já que, neste momento, o Tesouro tem autorizaçã­o para aumentar a dívida para bancar despesas com o coronavíru­s. Já o economista do Ibre/FGV, Manoel Pires, disse que não há restrição para contrataçã­o de dívida com organismos internacio­nais para custear gastos correntes. “O endividame­nto para financiar essas despesas extraordin­árias é inevitável. A questão é se esse é o melhor expediente. Não me parece muito problemáti­co por enquanto, dado os valores envolvidos e a posição do câmbio hoje.”

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WERTHER SANTANA/ESTADÃO–14/5/2020 Destino. Recursos ajudarão a combater efeitos da covid-19

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