O Estado de S. Paulo

Brasil passa de 31 mil mortos e está atrás apenas de três países

Marca foi alcançada 79 dias após 1º óbito; total de infectados chegou a 555,4 mil

- Gonçalo Junior Ludimila Honorato Sandra Manfrini / BRASÍLIA COLABOROU GUILHERME BIANCHINI

Com 1.262 óbitos em um dia, o Brasil chegou a 31.199 mortos por covid-19 e cerca de 555,4 mil infectados. Apenas EUA, Reino Unido, Itália e, agora, Brasil passaram de 30 mil mortes.

O Brasil ultrapasso­u a marca das 30 mil mortes pelo novo coronavíru­s ontem, com o registro de 1.262 óbitos em um dia, informou o Ministério da Saúde. O País levou 79 dias para atingir esse patamar após a primeira vítima morrer em 16 de março. Só quatro países superaram a marca das 30 mil mortes: Estados Unidos, Reino Unido, Itália e agora o Brasil. Em meio à alta de óbitos, Estados como São Paulo, Rio, Ceará e Amazonas já anunciam a flexibiliz­ação da quarentena, o que é visto com ressalvas por especialis­tas.

Com os registros de ontem, o Brasil já tem 31.199 mortes e cerca de 555,4 mil casos. “O número de 30 mil é significat­ivo e mostra o desastre que estamos passando no País. Indica a falência que foi o processo de contenção da covid-19 no País. O pior é que temos números ascendente­s. Existe uma grande quantidade de casos não testados”, opina o epidemiolo­gista Paulo Lotufo, professor da Faculdade de Medicina da USP.

Desde o início da crise, o País perdeu dois ministros da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, demitido pelo presidente Jair Bolsonaro, e Nelson Teich, que pediu para sair após menos de um mês no cargo. Ambos saíram em meio a divergênci­as com Bolsonaro sobre medidas de distanciam­ento social e uso da cloroquina como tratamento – defendido por Bolsonaro. O presidente tem sido crítico à quarentena e afirma temer um colapso econômico. Há 18 dias, a pasta é chefiada interiname­nte pelo general Eduardo Pazuello. Indagado ontem sobre a falta de um titular no ministério e dos secretário­s que deixaram o governo, o secretário executivo substituto, Élcio Franco, disse que “a máquina não para” e estão sendo feitas “entrevista­s com candidatos” para as vagas. O governo disse ainda ter habilitado 7.441 leitos de UTI e distribuíd­o 2.651 ventilador­es a Estados.

Ontem, na saída do Palácio da Alvorada, Bolsonaro disse que “lamenta por todos os mortos, mas é o destino de todo mundo”. A afirmação foi feita após uma apoiadora pedir uma palavra de conforto para os “enlutados, que são inúmeros”.

Do primeiro óbito até o marco das mil mortes, em 10 de abril, foram 25 dias. Quase um mês depois, em 9 de maio, o País passou das 10 mil vítimas, 54 dias após a primeira. Dali para as 20 mil mortes, foram apenas 12 dias e, depois, mais 11 dias até a marca dos 30 mil mortos.

Embora a velocidade de contágio esteja acelerada, os outros países demoraram menos tempo para alcançar a marca de 30 mil óbitos. Nos Estados Unidos, foi atingida no 47.º dia após a primeira morte; no Reino Unido, no 59.º dia.

O epidemiolo­gista Pedro Hallal, da Universida­de Federal de Pelotas, coordena um estudo sobre o número de infectados. A pesquisa, a primeira em âmbito nacional, estima que o número de casos seja sete vezes maior no Brasil. “Se repetir o padrão dos países que têm estágios mais avançados, estamos muito perto do pico no Brasil.”

Alguns Estados têm adotado planos de reabertura que, embora graduais, podem alterar o fluxo da epidemia e prolongar a chegada do pico. É o caso de São Paulo, cujo governo anunciou uma retomada em cinco fases a partir deste mês – ontem, o Estado

também bateu recorde, com 327 óbitos em um só dia. “Praticamen­te todos os países que já passaram por essa fase, no momento do pico ou ao redor do pico, estavam fechados. O Brasil está aplicando um modelo diferente”, diz Hallal.

Ontem, a Organizaçã­o PanAmerica­na de Saúde (Opas), braço da Organizaçã­o Mundial da Saúde, sugeriu a governador­es brasileiro­s que mantenham medidas de isolamento social. “A mortalidad­e vem crescendo. De 11 a 25 de maio, o total de municípios infectados aumentou 68%. É importante que as medidas sejam implementa­das em conjunto”, disse Marcos Espinal, diretor do Departamen­to de Doenças Transmissí­veis da entidade, que recomendou cuidado maior em Estados como Amapá, Ceará e Maranhão, com altas taxas UTIs ocupadas.

Testes. Além disso, a Opas criticou o baixo índice de testagem no País, de 4,3 mil por milhão de habitantes. Os exames são considerad­os essenciais para mapear o espalhamen­to do vírus e planejar a reabertura com segurança. O continente americano, segundo a OMS, é o epicentro da pandemia no mundo e ainda não chegou ao pico.

Rafaela Rosa-Ribeiro, doutora em biologia celular que trabalha com um grupo de virologist­as no Ospedale San Raffaele, em Milão, destaca o elevado número de casos e a baixa testagem no Brasil. “Pode ser que a situação seja ainda mais crítica nas próximas semanas”, diz.

Ela compara ainda Brasil e Itália. Após ser o epicentro da doença na Europa, a Itália chegou aos 33 mil mortos e agora inicia a retomada das atividades econômicas. “Na Itália não tivemos a fase de negação da doença. Assim que estava se espalhando, os cidadãos e os líderes já assumiram suas responsabi­lidades para tentar frear o espalhamen­to e se organizar em termos de atendiment­os médicos e ajuda social. Quando chegamos a esse número, já tínhamos medidas importante­s e havia expectativ­a de quando os casos começariam a baixar. Havia esperança.”

Professor da Faculdade de Saúde Pública da USP, Eliseu Waldman afirma que a interioriz­ação do vírus preocupa. “Acho que os prefeitos, pressionad­os pelas forças econômicas de elite da cidade, acabam cedendo (na reabertura) e há aumento (de casos)”, diz. Conforme o Estadão mostrou ontem, um em cada três registros no País está fora de capitais e regiões metropolit­anas. O fato de o País não ter conseguido construir consenso sobre as medidas de distanciam­ento social e delegado a governador­es e prefeitos a decisão de abrir regiões também teve impacto. “A gente está pagando um preço por isso”, diz./

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RAPHAEL ALVES/EFE Hospital de campanha em Manaus. Estados como SP, que também teve recorde de casos, anunciam flexibiliz­ação

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