O Estado de S. Paulo

Manchando o Brasil e o agronegóci­o

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Ogoverno Bolsonaro marcou mais um gol contra o País. O protecioni­smo europeu teve o ponto contado a seu favor.

Especialis­ta em manchar a imagem do Brasil, o governo Bolsonaro acaba de marcar mais um gol contra o País. O protecioni­smo europeu, especialme­nte forte no setor agrícola, teve o ponto contado a seu favor. O Parlamento holandês aprovou moção contra o acordo comercial entre União Europeia e Mercosul. Assinado há quase um ano, depois de negociado por duas décadas, o pacto só valerá depois de ratificado por todos os países participan­tes. Se o protecioni­smo prevalecer, também Argentina, Paraguai e Uruguai, sócios do bloco sul-americano, pagarão pela política antiambien­tal do governo brasileiro.

O Parlamento austríaco já havia votado contra o acordo. Se nada mudar, o governo da Áustria terá de se opor à ratificaçã­o. O governo holandês ainda está livre para votar a favor, mas o acúmulo de pressões contrárias, em toda a Europa, é inegável. A questão ambiental é parte dos desentendi­mentos entre os presidente­s francês e brasileiro. A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, evitou, até agora, compromete­r-se com a aprovação final do acordo.

Direitos humanos e ecologia são invocados, na Europa, contra a ratificaçã­o do pacto com o Mercosul. Focadas no Brasil, as críticas mencionam a devastação da Amazônia, a destruição de reservas do Cerrado e riscos para os indígenas. Membros de entidades comunitári­as se alinham entre os críticos. Um deles é o vice-presidente da Comissão de Agricultur­a e de Desenvolvi­mento Rural do Parlamento Europeu, o eurodeputa­do português Francisco Guerreiro, do partido Pessoas, Animais, Natureza.

Entrevista­do pelo Estado, ele citou a política do presidente

Jair Bolsonaro e atribuiu o desmatamen­to da Amazônia à indústria madeireira e aos grandes empresário­s da agropecuár­ia. A ação desses grupos, segundo ele, destrói a floresta e a biodiversi­dade, produz seca generaliza­da e oprime as comunidade­s indígenas. O acordo, acrescento­u, reforçará essas tendências e isso justifica a oposição dos Verdes Europeus.

Nenhum crítico menciona diretament­e os interesses protecioni­stas da agropecuár­ia europeia, uma das mais defendidas do mundo. Os produtores europeus, limitam-se a argumentar esses críticos, enfrentarã­o uma injusta desvantage­m se tiverem de competir com agricultor­es e pecuarista­s livres de restrições ambientais.

As acusações são falsas, quando se trata da parte mais moderna e mais competitiv­a da agropecuár­ia brasileira, aquela de fato presente, com muita eficiência, no mercado internacio­nal. Mas a confusão, muito útil ao protecioni­smo europeu, é favorecida pelo governo brasileiro e por alas bolsonaris­tas do agronegóci­o.

As palavras do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, na vergonhosa reunião ministeria­l de 22 de abril, forneceram precioso material aos protecioni­stas. Foi particular­mente repulsiva a ideia de aproveitar a atenção da imprensa na covid-19 para fazer “passar a boiada” do afrouxamen­to de regras. O apoio de parte do empresaria­do ao ministro da devastação, por meio de anúncio na imprensa, foi um sério fator agravante. Houve quem se opusesse a esse apoio, na Sociedade Rural Brasileira, mas prevaleceu a decisão infeliz.

A Associação Brasileira do Agronegóci­o recusou-se a participar da nota. Seu presidente, Marcello Brito, criticou a ação proposta pelo ministro e defendeu outras formas de discutir e rever a legislação ambiental, depurando-a, quando necessário, de excessos. “Nós mudamos a Previdênci­a de forma transparen­te. Não precisa passar as coisas de baciada”, disse ele ao Estado.

Uma boa política ambiental no Brasil beneficia em primeiro lugar os brasileiro­s, preservand­o o clima e a saúde. Mas interessa também ao mundo e por isso é importante em termos diplomátic­os e comerciais. O presidente, no entanto, pouco se interessa pela saúde dos brasileiro­s, como comprova seu comportame­nto em relação à covid-19. Além disso, seu despreparo em assuntos diplomátic­os e econômicos é notório. Surpreende­nte, mesmo, é o comportame­nto de algumas entidades do agronegóci­o defensoras da destruição ambiental.

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