O Estado de S. Paulo

Facebook, Twitter e a ira de Trump

- PEDRO DORIA E-MAIL:COLUNA@PEDRODORIA.COM.BR TWITTER: @PEDRODORIA PEDRO DORIA ESCREVE ÀS SEXTAS-FEIRAS

Océu fechou no mundo das redes sociais — e, nesta, Facebook e Twitter sacaram suas armas, um mirando o outro. Cá no Brasil, o Congresso Nacional estuda criar uma lei de fake news. Nos EUA, Donald Trump quer regular sobre como as redes podem ou não moderar conteúdo. Dependendo de quem o democrata Joe Biden escolher para vice, pode vir um processo antitruste aí. E o debate não ocorre apenas aqui ou nos EUA, é por toda a parte. O clima é tenso. E as duas maiores redes sociais estão lidando de formas muito diferentes com a coisa.

Se a tensão é generaliza­da no Vale, dentro do Facebook está pior. Na semana passada, Donald Trump publicou em suas redes uma frase que disparou essa crise – “quando os saques começam, os tiros acompanham”. É uma frase carregada de história, que vem de princípios do século 20, quando o racismo no sul americano era institucio­nalizado. Trump alega que não sabia desse histórico. Mas o fato é que negros compreende­m bem seu significad­o. É chamamento à brutalidad­e, aos linchament­os, ao espírito da Ku Klux Klan.

Quando Trump publicou, o Twitter agiu. Pôs uma mensagem para quem quisesse ver alertando: o post do presidente da República violava as políticas contra incitação à violência da plataforma. Literalmen­te acusaram Trump de provocar violência. Além do alerta, a rede proibiu curtidas, retuítes ou comentário­s. Por ser o presidente, a mensagem ficava. Mas não poderia ser distribuíd­a e interações foram proibidas.

No Facebook, a decisão foi distinta. Após consultas internas com seus principais executivos, Mark Zuckerberg tomou a decisão de não fazer nada. O Recode, importante site dedicado a análise do mundo digital, obteve os registros de uma teleconfer­ência entre o líder e seus funcionári­os. “Eu sabia que seria cobrado”, afirmou Zuck. “Concluímos após muita pesquisa e muitas conversas de que a referência é um pedido a policiamen­to mais agressivo, mas que não há história de a frase ser apito para cachorros.”

Dog whistle, a expressão americana. Aquele apito que faz um barulho que os cachorros ouvem, mas humanos, não. Em inglês, é metáfora. Uma frase que um grupo capta pela referência cultural, mas que para outros não faz nenhum sentido. Ou seja, a acusação era de que Trump estava mandando uma mensagem para os brancos racistas, para os negros do sul, que, no entanto, para qualquer outro pareceria um tuíte hiperbólic­o e só. No Twitter, foi assim que considerar­am ser.

No Facebook, em decisão monocrátic­a como costuma ocorrer, Zuckerberg decidiu que estava tudo bem.

O encontro virtual, que reuniu 25 mil funcionári­os, teve tom duro. Na segunda, 400 funcionári­os cruzaram os braços em protesto. Uma carta aberta assinada por algumas das pessoas que ajudaram a fundar o Facebook reiterou a queixa. A empresa se voltou contra o CEO e, no entanto, é dado pelo contrato que rege a companhia que as decisões finais são de Zuck e só dele.

O jovem CEO paga um preço alto por sua estratégia de apaziguame­nto. Os grupos conservado­res lá, cá e por todo o mundo acusam as redes sociais de serem coordenada­s por pessoas de esquerda que censuram suas vozes o tempo todo. Pois a política do CEO do Facebook é uma de não mexer no que políticos eleitos publicam. É uma decisão controvers­a. Mas a escolha de Jack Dorsey, CEO do Twitter, é igualmente controvers­a. Um número mirrado de empresas – Facebook (dona do Instagram), Twitter e Google (YouTube), no máximo Snap – controlam os espaços onde temos conversas sobre o que é público.

É um monopólio. Na ausência de diversidad­e, a tensão não irá embora tão cedo.

O clima é tenso – e as duas maiores redes sociais lidam de forma diferente com a coisa

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