Restrições deixam imigrantes em limbo jurídico
Segundo a ONU, mais de 4 milhões de solicitantes de asilo podem ficar sem documentação regular por paralisação de serviços
Três meses após a Organização Mundial da Saúde declarar a pandemia do novo coronavírus, 161 países ainda têm restrições nas fronteiras, sendo que 99 não abrem exceção nem para os que procuram refúgio. Com isso, quem tentava sair ou voltar ao seu país de origem se vê diante de difíceis opções: ficar onde está até a crise passar, mesmo em situação irregular, ou recorrer a traficantes de pessoas.
Segundo um relatório da Agência da ONU para Refugiados (Acnur), 4,2 milhões de solicitantes de refúgio correm o risco de não ter sua situação regularizada. São pessoas que no fim de 2019 ainda aguardavam uma resposta para a solicitação. Com a pandemia, serviços consulares e emissões de vistos foram suspensos.
Na União Europeia, isso já se traduz em números. A quantidade de pedidos de asilo registrados em março caiu 43% comparado a fevereiro em razão da paralisação dos serviços.
“Em vários países, o número de pessoas num limbo jurídico aumenta. Nossa recomendação é que os governos forneçam a documentação necessária e coloquem as pessoas em programas sanitários”, afirma o diretor da Divisão de População da Cepal, Jorge Martínez Pizarro.
Equador, Chile e Portugal, por exemplo, prorrogaram a validade de vistos, enquanto o Panamá ofereceu abrigo para quem não conseguia voltar a seu país de origem. No Peru, refugiados e imigrantes receberam cobertura de saúde temporária quando estavam com suspeita de covid-19.
Na América Latina, venezuelanos que ainda tentam deixar o país se tornam alvos fáceis de traficantes de pessoas e grupos criminosos. Segundo organizações humanitárias que monitoram a movimentação entre Venezuela e Colômbia, atualmente os venezuelanos pagam até 100 mil pesos (US$ 25) para cruzar pontos de difícil acesso da fronteira perto de Cúcuta e 25 mil pesos (US$ 6) para “um
• Medidas
guia” levá-los até o outro lado.
Famílias separadas. O venezuelano Kabir Camero, de 26 anos, vive no Brasil desde 2017 e trabalha no Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) em Roraima. Com documentação em dia e trabalho fixo, a preocupação com a mãe que ficou na Venezuela o faz pensar em voltar, mas o medo de não conseguir entrar no Brasil depois é maior. “Minha mãe vinha às vezes, mas voltava para tomar conta da nossa casa. Com a pandemia, ela não consegue mais vir e está sozinha lá. Eu fico preocupado, pensei em voltar, mas está muito difícil viajar. Talvez eu consiga sair, mas não consiga voltar para cá”, conta.
Com a pandemia, o Brasil adotou nove ações para restringir a mobilidade nas fronteiras.
O número de venezuelanos tentando voltar ao país em razão da pandemia tem aumentado. Na Colômbia, mais de 24 mil venezuelanos esperam para regressar, sendo que 900 estão na região fronteiriça, mas as restrições do governo de Nicolás Maduro podem acarretar uma espera de até seis meses para que o retorno ocorra, por corredores humanitários. Até junho, 76 mil venezuelanos haviam deixado a Colômbia e retornado.
“Em vários países, o número de pessoas num limbo jurídico aumenta. Nossa recomendação é que os governos forneçam a documentação necessária” Jorge Martínez Pizarro
DIRETOR DA DIVISÃO DE
POPULAÇÃO DA CEPAL