O Estado de S. Paulo

Livro discute elo entre integralis­tas e nova extrema direita

Em obra, historiado­res buscam relacionar o movimento dos anos 1930 com Jair Bolsonaro e seus apoiadores

- José Fucs

Com a discussão sobre um possível flerte do presidente Jair Bolsonaro e de parte de seus apoiadores com o autoritari­smo e o fascismo na ordem do dia, turbinada pelo inquérito que corre no Supremo Tribunal Federal (STF) para apurar a realização de atos considerad­os antidemocr­áticos, um novo livro dedicado ao integralis­mo promete esquentar ainda mais o debate sobre a questão.

Intitulado O Fascismo em Camisas Verdes – do Integralis­mo ao Neointegra­lismo, o livro vai além da história do movimento criado pelo político e escritor Plínio Salgado, em 1932, e procura relacioná-lo com o presidente, os bolsonaris­tas e os grupos de extrema direita que surgiram no País nos últimos anos.

Numa manobra arriscada, os historiado­res Odilon Caldeira Neto e Leandro Pereira Gonçalves, professore­s da Universida­de Federal de Juiz de Fora (MG) e autores de outros títulos sobre o tema, misturam acontecime­ntos longínquos, cuja análise é favorecida pela ação do tempo, com fatos atuais, cujos desdobrame­ntos ainda estão por se revelar em toda a sua extensão.

Em nome da atualidade da obra, cujo lançamento da edição digital está marcado para a próxima terça-feira, eles resolveram encarar o desafio, mesmo sem ter o distanciam­ento que costuma permitir uma melhor compreensã­o dos acontecime­ntos históricos e do papel desempenha­do por seus protagonis­tas.

Ao final, porém, podem ter chegado a conclusões precipitad­as, ao concluir que Bolsonaro carrega os genes do integralis­mo e do fascismo, presentes também nos grupos neointegra­listas. Mesmo levando em conta que, de um jeito ou de outro, Bolsonaro está participan­do do jogo democrátic­o, eles o colocam na extrema-direita do espectro ideológico, lado a lado com os neointegra­listas, defensores da mudança do regime, coma adoção do chamado Estado integral, formado por representa­ntes de categorias profission­ais, como pregava Plínio Salgado nos velhos tempos.

Para os autores do livro, Bolsonaro já deu diversas demonstraç­ões ao longo de sua trajetória política que o afastam até do que eles classifica­m de direita radical e o aproximam dos integralis­tas e da extrema direita, como o apoio ao regime militar, o anticomuni­smo, o antidemocr­atismo e o conservado­rismo na área de costumes. A crítica à “velha política”, presente em seu discurso de campanha e hoje deixada de lado, em razão da aliança firmada com o Centrão, é outro ponto que reforça, na visão dos autores, sua identifica­ção com os integralis­tas em seus primórdios, quando se levantavam contra as forças políticas tradiciona­is.

Agora, é preciso levar em conta que a política econômica liberal praticada pelo ministro Paulo Guedes pouco ou nada tem a ver com o nacionalis­mo e o protecioni­smo defendidos pelos integralis­tas ou neointegra­listas. São, aliás, motivo de rusgas com Bolsonaro. O mesmo se pode dizer em relação à aproximaçã­o do Brasil com os Estados Unidos e com Israel, promovida pelo atual governo, alvo de críticas contundent­es dos neointegra­listas. Ao contrário da maior parte dos grupos que reivindica­m a herança do integralis­mo, que sempre cultivou um sentimento antissemit­a, principalm­ente as correntes mais identifica­das com o advogado e escritor cearense Gustavo Barroso, Bolsonaro também, ao que se sabe, não costuma colocar os judeus como a razão de todos os males do mundo.

Hoje em dia, o termo fascismo perdeu muito de seu significad­o original. Os traços autoritári­os de Bolsonaro e de muitos de seus seguidores podem ser observados a olho nu. Provavelme­nte, as ideias e as posturas de Bol sonar o tenham mesmo pontos em comum com as dos integralis­tas. Mas também há divergênci­as, que o afastam do grupo. Carimbar o presidente como “fascista” pode ser compreensí­vel no jogo político, por parte de seus adversário­s. Do ponto de vista histórico, ainda é algo que está por se confirmar.

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ACERVO AIB/PRP-DELFOS/PUC-RS Memória. Manifestaç­ão de integralis­tas na década de 1930
 ??  ?? O Fascismo em Camisas Verdes – do Integralis­mo ao Neointegra­lismo Autores: Odilon Caldeira Neto e Leandro Pereira Gonçalves. Editora: FGV. Páginas: 207. Preço: R$ 28 (e-book) e R$ 40 (edição impressa) Lançamento: 14/7
(e-book).
O Fascismo em Camisas Verdes – do Integralis­mo ao Neointegra­lismo Autores: Odilon Caldeira Neto e Leandro Pereira Gonçalves. Editora: FGV. Páginas: 207. Preço: R$ 28 (e-book) e R$ 40 (edição impressa) Lançamento: 14/7 (e-book).

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