O Estado de S. Paulo

Facebook: não é o suficiente

- PEDRO DORIA E-MAIL: COLUNA@PEDRODORIA.COM.BR TWITTER: @PEDRODORIA PEDRO DORIA ESCREVE ÀS SEXTAS-FEIRAS

Não é o suficiente. O anúncio, pelo Facebook, de que expurgou uma rede bolsonaris­ta de desinforma­ção é muito importante. É chave, até. Chave porque, pela primeira vez, põe as manobras de fake news na antessala do presidente da República. É um presente para o Supremo. Ao fazer esse elo, entre fake news e alguém muito próximo de Jair Bolsonaro, amplia em muito o impacto do inquérito aberto pela Corte. Mas não podemos perder de vista um ponto: 35 contas, 14 páginas e um grupo, além de mais 38 contas no Instagram. Alcance de pouco menos de 900 mil pessoas no Face, um pouco mais no Insta. É pouco. A rede bolsonaris­ta é bem mais ampla do que isso.

Isso quer dizer algo simples: o Facebook não dá conta de manter limpa a sua plataforma. Não está sozinho, diga-se. O Twitter também não dá. Mas também é verdade que o Twitter tem muito menos recursos do que o Face.

É importante demais que essa ficha caia.

O Facebook é uma corporação que está entre as cinco maiores dos EUA, candidata a chegar ao US$ 1 trilhão de valor no mercado. Há outras quatro gigantes de tecnologia com o mesmo tamanho, mas não há empresa maior no mundo. Essa corporação gigantesca tem quase 30% da população mundial entre seus usuários ativos. São 2,6 bilhões de pessoas como nós. Está na ponta da compreensã­o do comportame­nto humano via inteligênc­ia artificial. Talvez alguma chinesa rivalize, mas não bate. Se algum algoritmo sabe interpreta­r como nos comunicamo­s, como interagimo­s ou mesmo como nos sentimos online, é o Facebook.

Essa rede bolsonaris­ta que foi desativada na quarta-feira vem crescendo desde 2018. Desde o ano da eleição presidenci­al. Após alertas da imprensa, informaçõe­s colhidas da CPMI no Congresso Nacional e de ajuda estratégic­a do Atlantic Council, o Facebook enfim identifico­u a rede e a expurgou. Identifico­u entre seus gestores um assessor direto do presidente, outro de seu filho 03, o deputado Eduardo Bolsonaro, além de mais gente ligada ao grupo político.

E não é a principal rede bolsonaris­ta. É uma pequena parte dela.

Vamos botar num parágrafo o que sabemos. Um vereador do Rio de Janeiro, Carlos Bolsonaro, acompanhad­o de um rapaz que vindo do interior da Paraíba esta em seu primeiro emprego no Palácio do Planalto e mais uma trupe ainda mais jovem, lideram juntos uma rede de desinforma­ção num país que está entre as dez maiores economias do mundo.

Usando técnicas razoavelme­nte simples – contas falsas e robôs para se fazerem passar por um volume muito maior de pessoas –, sequestram o debate público dessa nossa democracia. Se aproveitam dos algoritmos que já tendem a exacerbar emoções nas redes para, então, criar artificial­mente consensos. Tomando de assalto o regime, fraudando a conversa da sociedade em ano eleitoral, radicaliza­m uma parte da população e vencem.

Não aconteceu só aqui. Aconteceu também na mais antiga e mais rica democracia do planeta, os Estados Unidos. Aconteceu na Itália e no Reino Unido.

E uma das maiores corporaçõe­s do planeta, na ponta da tecnologia, da inteligênc­ia artificial, da compreensã­o do comportame­nto humano conseguiu, enfim, desbaratar uma pequena parte dessa rede.

Não é o suficiente. As plataforma­s sociais – inclua-se na lista YouTube, que pertence ao Google, e Twitter – servem ao sequestro de democracia­s as mais estáveis. Não há ponto de exclamação ou adjetivo que dê a ênfase necessária à gravidade do problema.

Mas ao menos uma coisa é possível dizer. A todos. É pouco. Não é nem de perto o suficiente.

Se algum algoritmo sabe interpreta­r como nos sentimos, é o do Face

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil