De volta às lojas?
Em condições normais de temperatura e pressão, estaríamos agora no auge da temporada de liquidações. Época em que as lojas costumavam queimar seus estoques para a alegria de quem sonhava renovar o visual da sala ou que esperava arrematar aquele objeto de desejo, há muito acalentado, por um preço menos proibitivo.
Diante do quadro atual, porém, longas filas ou disputas braço a braço nunca pareceram mais distantes. Ainda assim, após meses observando a vida pelas janelas, é natural que a reabertura das lojas de design e decoração estimule no consumidor a vontade de sair. Ao menos para dar uma espiadinha nas vitrines em busca de boas ofertas. Nada, espera-se, comparável à maciça corrida aos pontos de venda de anos anteriores.
Para o comércio, a crise é sem precedentes e a expectativa de ampliar as vendas, naturalmente grande. O isolamento social representou o fechamento quase que total dos pontos de venda, afetando tanto os pequenos negócios, quanto as redes de varejo. E gerando perdas ainda difíceis de mensurar. Com a queda do faturamento, todos buscaram refúgio no comércio online e, nesse sentido, podemos dizer que a paralisação representou um acelerador no processo de digitalização das operações. Hoje é possível encontrar mais produtos na internet do que nas próprias lojas e, por certo, a maioria dos clientes já se deu conta disso.
O desejo de voltar a frequentar as lojas físicas, porém, permanece latente. O consumidor parece não ter ficado imune aos dias vividos em quarentena, hoje se conhece melhor e, para muitos, promover mudanças urgentes na forma que vivenciam suas casas se tornou objetivo de primeira ordem. E isso, fatalmente, deverá ter impacto nos espaços comerciais, reais ou virtuais.
Ao que tudo indica, o cliente póspandemia estará mais bem informado e mais atento do que nunca às consequências de suas compras. Não apenas para seu bolso, mas para a própria saúde do planeta. De repente, ainda que por vias tortas, o longo retiro nos mostrou que é possível – e muitas vezes até mais prazeroso – consumir menos, não produzir tanto lixo e, no final, dar a ele a destinação adequada.
Ao mesmo tempo, aprendemos que comprar apenas o que precisamos pode ser bem mais interessante do que ceder a compras de impulso, já que o barato, muitas vezes, pode sair caro. Comprar pelo menor preço, sim. Mas apenas aquilo que for realmente útil e durar o maior tempo possível.
Frente a móveis e objetos, por exemplo, percebemos a importância de valorizar a autenticidade, de optar por soluções mais simples, de reciclar nosso acervo e, fundamentalmente, de adotar de uma vez por todas a cultura do “let it go”. Ou, em livre tradução, o princípio de abrir mão do que não usamos mais para só então pensar em novas aquisições. Evitando assim o desperdício e o acúmulo desnecessários.
Por outro lado, em sua nova dinâmica, a casa tem tudo para se converter em poderoso propulsor de vendas. É preciso, por exemplo, criar condições para que um escritório possa ser instalado em meio a um quarto ou uma sala. Que o banheiro possa estar adaptado à prática da meditação, ou ainda que a cozinha possa abrir espaço para longos papos. Ao redor da mesa e ao pé do fogão. Como antigamente.
De uma coisa, porém, todos podem estar certos: cada vez mais buscaremos uma conexão pessoal com tudo aquilo que pretendemos comprar. E o espaço físico das lojas não foge à regra. No novo normal, ser recebido de forma calorosa, contar com informações precisas e, em última análise, ter a oportunidade de tocar os produtos prometem se tornar itens tão essenciais quanto dispor de álcool gel sempre à mão, ou manter as condições recomendadas de distanciamento mínimo.
Olhando mais adiante, é possível até imaginar um progressivo, desde que seguro, afluxo às lojas, com um consequente reaquecimento das vendas. “A maioria dos meus clientes hoje faz videoconferências a partir de seus quartos”, comenta uma conhecida designer de interiores. Segundo ela, trata-se de uma realidade sem volta e que vai demandar um verdadeiro redesenho dos espaços da casa, além de móveis e equipamentos radicalmente novos. O que, convenhamos, já é um bom começo.