Em alta no Brasil, dólar enfraquece lá fora
Pandemia e eleição tiram da moeda americana status de porto seguro na crise; política e juros fragilizam o real
O ouro superou pela primeira vez, na semana passada, a barreira dos US$ 2 mil a onça-troy. A valorização de quase 35% no ano tem, entre os principais fatores, o enfraquecimento do dólar. Afirmação que é um choque para nós, brasileiros, que vimos o dólar fechar a sexta-feira a R$ 5,41 (alta de 35% em 2020).
De acordo com especialistas consultados pelo E-investidor (plataforma de finanças pessoais e investimentos do Estadão), o dólar está mesmo em desvalorização. Porém, no Brasil isso não é percebido porque o real tem um desempenho ainda pior.
“O dólar só não está mais alto aqui porque ele está fraco no mundo”, resume Marcelo Boneri, gerente da mesa de futuros da Ágora Investimentos.
A cesta de moedas DXY, que mostra a relação do dólar contra moedas de países desenvolvidos, já caiu 3,25% no ano, aos 93,389 pontos (o índice sobe quando o dólar está forte e cai quando está fraco). Frente ao euro, o dólar tem queda anual de 5,02%. Enquanto isso, em relação ao real, a moeda americana sobe mais de 35%.
A crise causada pela pandemia de coronavírus e a eleição nos EUA levaram ao enfraquecimento do dólar. Thomás Gibertoni, especialista de investimentos da Portofino Investimentos, pontua que o país está injetando dinheiro na economia para reaquecê-la. “Essa empenho fiscal faz os EUA emitir mais moeda ou tomar mais dívidas e isso faz o dólar ficar mais fraco em relação às outras moedas”, afirma Gibertoni.
Estes dois fatores levaram o dólar do papel histórico de porto seguro em momentos de crise a alavanca para migração a outros investimentos, como euro e metais (caso do ouro). O dólar segue forte perante moedas de países emergentes, cuja economia mais frágil sofre mais nas crises.
No caso do Brasil, o cenário é agravado pela combinação entre problemas políticos e fiscais – mesmo que a temperatura tenha baixado recentemente, com privatizações e reformas voltando à pauta em Brasília.
“O fator Brasil pesa muito na nossa moeda”, admite Boneri, da Ágora. “Nosso risco é maior em relação ao nossos pares, o que tira toda nossa atratividade, deixa o investidor estrangeiro receoso e consequentemente o dólar sobe mais aqui”, complementa o economista-chefe da Frente Corretora, Fabrizio Velloni.
Recentemente, os cortes sucessivos na taxa básica de juros do País (na mínima histórica de 2% ao ano) passaram a afastar cada vez mais os investidores estrangeiros. Por isso, o real é a moeda mais afetada entre os emergentes.
“Tivemos uma longa temporada de cortes da Selic, muito maior que nossos pares, e isso faz com que fiquemos menos atrativos para ficar investido”, afirma Gibertoni.
VALORES DE MERCADO REFERENTES AO PREGÃO DE 07/08/2020