Assassinato de negros cresce 11,5% e cai 13% entre os demais
Atlas da Violência mostra que eram negras 3 em cada 4 pessoas assassinadas em 2018, ano de queda de homicídios
Dados do Atlas da Violência apontam que a taxa de assassinatos de negros no Brasil cresceu 11,5% ao longo da última década, chegando a 37,8 por 100 mil habitantes. As mortes dos demais, por outro lado, caíram 12,9%, para 13,9 por 100 mil. Os números do Atlas – estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública – têm como base o Sistema de Informação sobre Mortalidade do Ministério da Saúde. Especialistas dizem que as condições socioeconômicas da população negra e o racismo ajudam a explicar os números. Ligada a esses fatores está a cooptação dos mais vulneráveis por facções criminosas. Em 2008, 32,7 mil negros foram assassinados no Brasil. A classificação de negros considera pretos e pardos. O número cresceu até 2017 e apresentou queda em 2018, ano mais recente avaliado. Apesar dessa redução, três em cada quatro vítimas dos 57.956 assassinatos registrados em 2018 eram negras.
Os assassinatos de negros no Brasil cresceram ao longo da última década, período em que os homicídios contra não negros registraram queda. O dado foi revelado ontem pelo Atlas da Violência, estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. A taxa de mortes de negros cresceu 11,5%, chegando a 37,8 por 100 mil habitantes, e a de não negros caiu 12,9%, com uma taxa de 13,9.
Especialistas dizem que ajudam a explicar esse dado as condições socioeconômicas da população negra, que a expõem mais frequentemente à violência, assim como o racismo que estigmatiza uma parcela da população e impõe sobre ela um uso de força desmedida. Ligado a esses fatores também está a cooptação dos mais vulneráveis pelas facções criminosas, cujas disputas de território e poder são marcadas pelos assassinatos em série.
A análise usa dados registrados pelo Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde em todos os Estados para entender o perfil das vítimas das mortes violentas no País. Em 2008, 32,7 mil negros foram assassinados no Brasil. O número cresceu continuamente até 2017 e apresentou queda em 2018, ano mais recente avaliado. Apesar dessa redução, o número de vítimas de 2018 (43,8 mil mortes de negros) é 34% maior na comparação com o dado de 2008.
Tendência inversa é notada entre os não negros. Em 2008, foram registrados 15 mil assassinatos. O número permaneceu estável ao longo dos anos e sofreu queda em 2018, quando aconteceram 12,7 mil homicídios. A redução notada no período foi de 15,4%. “As políticas têm sido minimamente capazes de proteger a vida de não negros, mas a disparidade é tamanha com os dados de vítimas negras que é como se estivéssemos falando de países diferentes”, disse a diretora executiva do Fórum, Samira Bueno.
O dado brasileiro mostra que a cada não negro morto em 2018, 2,7 negros foram mortos. Com exceção dos números do Paraná, em todos os outros Estados a taxa de homicídios confirmou essa disparidade. Em Alagoas, por exemplo, a cada não negro assassinado, 17 pessoas negras foram mortas. “Nós somos produto de um processo histórico de escravidão e racismo estrutural. Em função da trajetória histórica de racismo, e das consequências econômicas e educacionais, o negro é muito mais vulnerável a sofrer violência. Existem ainda os efeitos diretos, o racismo que mata. A ideia do ‘negro perigoso’ muitas vezes existe nas polícias e implica uso da força diferenciado entre negros e não negros. Temos muito a caminhar nessa estrada para entrar num processo civilizatório mínimo”, disse Daniel Cerqueira, economista do Ipea que coordena o Atlas.
A maior taxa de homicídios de negros no Brasil em 2018 (considerando números absolutos e não a proporcionalidade negra na população) foi relatada em Roraima, com 87,5 por 100 mil habitantes, seguido por Rio Grande do Norte (71,6) e Ceará (69,5). A maior variação na década aconteceu no Acre, onde os assassinatos cresceram 300%, seguido por Roraima (264,1%) e Ceará (187,5%).
A tendência mais recente mostra redução dos casos. Os números só não caíram em quatro Estados entre 2017 e 2018 (Roraima, Tocantins, Amapá e Rio). A menor taxa de homicídios de negros no Brasil em 2018 foi em São Paulo (9,8 por 100 mil habitantes), que também apresenta a menor taxa de mortes entre não negros: 6,9.
O Ministério da Justiça e Segurança Pública não comentou a pesquisa. O presidente do Colégio Nacional de Secretários de Segurança, Cristiano Sampaio, destacou as melhorias adotadas em 2018, como o Sistema Único de Segurança Pública e os recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública. “Estamos vivendo um novo momento e os dados podem melhorar e muito”, disse.
Mulheres. O padrão de violência mais acentuado contra negros é notado também nos registros de morte de mulheres. A taxa de homicídios contra mulheres não negras caiu de 3,2 por 100 mil habitantes em 2008 para 2,8 em 2018 (-11,7%). Já entre as negras a taxa passou de 4,6 em 2008 para 5,2, alta de 12,4%. “A raça é um critério extremamente importante para entender os processos de vulnerabilidade no Brasil relacionados à falta de acesso aos serviços e às políticas públicas. A mulher, então, sofre uma tripla vulnerabilização de gênero, raça e classe social que a expõe aos riscos que a nossa sociedade apresenta”, disse a pesquisadora do Fórum Amanda Pimentel.