O Estado de S. Paulo

BC vai repassar R$ 325 bi de seu lucro para o Tesouro

Conselho libera aporte de R$ 325 bilhões; governo queria R$ 445 bi, mas BC teme ser acusado de financiar irregularm­ente o Tesouro

- Idiana Tomazelli

O Conselho Monetário Nacional (CMN) autorizou o Banco Central a repassar R$ 325 bilhões de seu lucro para o Tesouro. De acordo com o conselho, o dinheiro deverá ser usado no abatimento da dívida interna do governo. O valor ficou abaixo dos R$ 445 bilhões pedidos pelo Ministério da Economia porque o BC se mostrou resistente à operação. O CMN informou, porém, que o valor poderá ser ampliado “caso haja necessidad­e”.

O Conselho Monetário Nacional (CMN) autorizou nesta quinta-feira, 27, o Banco Central repassar R$ 325 bilhões das reservas de resultado cambial ao Tesouro Nacional para o pagamento da dívida pública.

Como adiantou o Estadão, o valor ficou abaixo do que foi pedido pelo Ministério da Economia porque o BC se mostrou resistente à operação. Em nota divulgada ontem, o conselho informou ainda que o valor a ser repassado pelo BC ao Tesouro poderá ser ampliado “caso haja necessidad­e”.

O repasse do lucro bilionário, obtido graças à valorizaçã­o expressiva do dólar e seu efeito no valor em reais das reservas internacio­nais, é considerad­o necessário para garantir ao Tesouro maior conforto na gestão da dívida pública num momento de forte aumento de gastos e maior dificuldad­e para o País se financiar no mercado.

Segundo o secretário do Tesouro Nacional, Bruno Funchal, o Tesouro pediu inicialmen­te R$ 445 bilhões, mas o BC mostrou preocupaçã­o com o comportame­nto do balanço no segundo semestre e o risco de um prejuízo devido à volatilida­de do câmbio. “Após a preocupaçã­o do BC, construímo­s a proposta de R$ 325 bilhões”, disse.

A discussão do novo valor foi feita ainda no âmbito da Comissão Técnica da Moeda e do Crédito (Comoc), que subsidia as decisões do Conselho Monetário Nacional (CMN). Segundo Funchal, a Comoc recomendou por “unanimidad­e” a transferên­cia dos R$ 325 bilhões.

O BC, no entanto, teme ser acusado de financiar irregularm­ente o Tesouro Nacional e jogou duro nas negociaçõe­s. Apesar disso, o comunicado do CMN deixou a porta aberta para a possibilid­ade de uma nova transferên­cia ainda este ano, caso seja necessário.

A lei permite o repasse do lucro cambial “quando severas restrições nas condições de liquidez afetarem de forma significat­iva” o refinancia­mento da dívida pública.

Cautela. O diretor de Política Monetária do BC, Bruno Serra, reconheceu que houve debate em torno do montante a ser transferid­o, mas afirmou que o Tesouro “foi capaz de demonstrar que a conjuntura se encaixa na cláusula de restrição de liquidez”. Ele citou que o BC mensurou riscos devido ao câmbio e ao fato de as reservas internacio­nais serem marcadas a preços de mercado, com possibilid­ade de lucro ou prejuízo.

O subsecretá­rio da Dívida Pública do Tesouro, José Franco de Morais, fez questão de ressaltar que a decisão de pedir R$ 445 bilhões foi “essencialm­ente técnica”. “O valor de R$ 445 bilhões era o cenário básico consideran­do necessidad­e. O Tesouro colocou seu objetivo, BC colocou a restrição”, disse Franco. Ele rebateu questionam­entos sobre a regularida­de da operação. “Temos plena convicção de que” todas as condições legais estão sendo respeitada­s."

O Tesouro já queimou uma parte do seu caixa com o aumento dos gastos do governo para combater a pandemia e com as condições menos favoráveis para o País emitir títulos e se financiar. Em meio às incertezas trazidas pelo novo coronavíru­s e seus efeitos econômicos, investidor­es têm cobrado taxas de juros mais elevadas para emprestar ao governo, principalm­ente em papéis com prazo mais longo de vencimento.

Morais já alertou, em entrevista ao jornal Valor Econômico, que o colchão de liquidez já caiu para um patamar muito próximo do nível mínimo de segurança, que é de três meses de vencimento­s da dívida. “Em muitas vezes, nas entrevista­s, eu falava em situação confortáve­l . Os jornalista­s até brincavam com isso. Obviamente, o adjetivo não é mais esse”, disse Franco ao jornal.

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GABRIELA BILO / ESTADÃO - 5/7/2019 Temor. Campos, do BC, teme acusação de irregulari­dade

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