O Estado de S. Paulo

Governador do RJ se alinha ao Planalto

Governador em exercício anuncia ‘diálogo’ com Flávio Bolsonaro sobre socorro financeiro da União ao Rio; defesa de governador afastado tenta reverter afastament­o no STF

- / COLABORARA­M FÁBIO GRELLET, PAULO ROBERTO NETTO e VINICIUS NEDER

Três dias após o afastament­o de Wilson Witzel (PSC), o governador em exercício do Rio, Cláudio Castro (PSC), e a família Bolsonaro explicitar­am um processo de aproximaçã­o. Castro anunciou ontem ter conversado por telefone com o senador Flávio Bolsonaro (Republican­os-rj). O Rio depende da União para assuntos como o Regime de Recuperaçã­o Fiscal, que precisa ser renovado esta semana para garantir o funcioname­nto da máquina do Estado. Já a família do presidente quer ter influência no Palácio Guanabara.

Até dezembro, o governador terá de escolher o novo chefe do Ministério Público estadual. A nomeação do novo procurador-geral de Justiça é considerad­a de interesse do clã Bolsonaro, já que a escolha pode influencia­r, por exemplo, o andamento da investigaç­ão do esquema de “rachadinha” (apropriaçã­o do salário de servidores) na Assembleia Legislativ­a do Rio (Alerj) – que alcança o antigo gabinete de Flávio Bolsonaro. Até agora, o MP tem se mostrado alheio a esse tipo de interferên­cia política. O atual chefe da Promotoria, Eduardo Gussem, é tido como um chefe que dá autonomia aos diferentes grupos de promotores.

A Constituiç­ão do Rio estabelece que o procurador-geral de Justiça, obrigatori­amente, deve ser escolhido pelo governador a partir de lista tríplice formada por eleição por voto secreto entre os membros do Ministério Público com mais de dois anos de carreira. Tradiciona­lmente, o nome mais votado tem sido o escolhido.

A defesa de Witzel entrou com recurso no Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar reverter o afastament­o determinad­o na sexta-feira pelo ministro Benedito Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O pedido, apresentad­o no sábado, foi distribuíd­o ontem ao presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, que pediu manifestaç­ão da Procurador­ia-geral da República (PGR). Em linhas gerais, o recurso contesta o afastament­o por meio de uma decisão monocrátic­a ( mais informaçõe­s nesta página).

Telefone. As conversas entre o governo fluminense e o Planalto haviam cessado desde que Witzel e o presidente Jair Bolsonaro passaram a brigar publicamen­te, há pouco menos de um ano. O motivo foi a pretensão de Witzel ser candidato a presidente em 2022. Ontem, no Twitter, Castro anunciou a reaproxima­ção. “Recebi agora há pouco uma ligação do senador Flávio Bolsonaro, que se colocou à disposição para ajudar o Estado na renovação do Regime de Recuperaçã­o Fiscal. Diálogo! Todos pelo Rio!”, escreveu.

O plano de recuperaçã­o do Rio completa três anos no próximo dia 5, e o governo fluminense luta para se manter no regime. Pelas regras, o Estado faz um plano de recuperaçã­o com uma série de medidas de ajuste fiscal, como elevação da contribuiç­ão previdenci­ária dos servidores. Em troca, o pagamento das dívidas com a União, ou garantidas por ela, é suspenso. O tema era tratado pelo secretário da Fazenda, Guilherme Mercês, sem a participaç­ão direta de Witzel.

Em nota, Flávio afirmou que o governador afastado “estava se recusando a reconhecer que o Rio não fez o dever de casa”. “Parece que o Cláudio vai adotar outra postura, mais humilde, realista e colaborati­va”, disse.

Estancar as investigaç­ões sobre a “rachadinha” não atenderia apenas à família Bolsonaro. No relatório inicial do Conselho de Controle de Atividades Financeira­s (Coaf), 22 deputados estaduais tiveram movimentaç­ões atípicas identifica­das e encaminhad­as ao MP. Alguns casos já foram arquivados e um virou denúncia: o do deputado Márcio Pacheco (PSC), do partido de Witzel e Castro. O governador em exercício também foi alvo de mandado de busca e apreensão na última sextafeira, mesmo dia em que Witzel foi afastado do governo.

Enquanto estiver como interino, Castro não deve promover mudanças expressiva­s na estrutura do governo. Ontem, após reunião com o secretaria­do, ele determinou a suspensão de todos os pagamentos, processos de compras e contrataçõ­es com fornecedor­es do Estado para os próximos dez dias. Ele também definiu a criação de um “Comitê de Programaçã­o das Despesas Públicas”, que vai analisar todos os gastos com valores iguais ou superiores a R$ 1,8 milhão.

Ontem, em entrevista à rede de TV CNN, Witzel disse que Castro está “fazendo o papel dele” ao tentar se aproximar do Planalto. “Sempre estive à disposição do governo federal, nunca fechei as portas.” Witzel também afirmou que não tinha a intenção de disputar a Presidênci­a em 2022, contrarian­do declaraçõe­s anteriores. “Meu objetivo era seguir junto e formarmos uma nova liderança política no País.”

Na entrevista, ele afirmou que nomeou até dois secretário­s por indicação de Flávio. O senador retrucou, pelo Twitter, dizendo que não pediu nenhum espaço no governo estadual: “Além de traidor e psicopata, ( Witzel) é mentiroso!”

Após apresentar o recurso no Supremo, o governador afastado tem até amanhã para apresentar sua defesa à comissão especial do impeachmen­t da Alerj.

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RAFAEL CAMPOS/GOVERNO RJ Rio. Governador em exercício, Cláudio Castro determinou suspensão de novos contratos em reunião com o secretaria­do

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