O Estado de S. Paulo

No fio da navalha

- ✽ ANÁLISE; Felipe Scudeler Salto DIRETOR EXECUTIVO DA IFI.

OProjeto de Lei Orçamentár­ia Anual (PLOA) é o locus das projeções de receitas e fixação de despesas públicas para o ano seguinte. Quanto mais realista, melhor. Ignorar o risco de rompimento do teto de gastos é uma péssima indicação. Paradoxalm­ente, não há compromiss­o com o resultado primário, apenas com o teto.

O déficit primário do PLOA, como já fora anunciado em abril, poderá flutuar. O compromiss­o do governo é apenas com o teto de gastos, e não com o resultado fiscal, o que preocupa. Isto é, há um descolamen­to embutido nessa estratégia em relação à trajetória da dívida pública. Além disso, todas as esperanças ficam penduradas no teto de gastos.

O déficit estimado pelo governo é de R$ 233,6 bilhões, enquanto o calculado pela IFI é de R$ 265,3 bilhões. Se o déficit for maior ou menor, desde que em razão das receitas, o governo não se responsabi­lizará. Claro que a incerteza colocada pela crise é elevada e dificulta a elaboração de cenários, mas, neste caso, recomenda-se prudência.

O anúncio feito ontem indicou que, na visão do governo, as despesas sujeitas ao teto de gastos ficarão exatamente iguais ao teto, que é calculado em R$ 1.485,9 bilhões. Esse valor nada mais é do que o teto de 2020 corrigido pela inflação acumulada em 12 meses até junho.

Esse cenário do PLOA mostra que o governo está operando com margem zero. Não considera, na proposta orçamentár­ia, por exemplo, a provável criação de gastos novos, a exemplo do chamado Renda Brasil. Se ele for criado sem corte de outra despesa, teremos um quadro de risco de descumprim­ento do teto, mesmo no cenário róseo do PLOA, mais benigno que o da IFI.

Há ainda o risco de outras medidas que elevem os gastos a partir de 2021. De maneira direta, o governo opera no fio da navalha e não aponta um norte a respeito do teto de gastos.

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