O Estado de S. Paulo

Militares ganham mais poder sobre Orçamento

Avaliação é de que, com a entrada do ministro Ramos no colegiado que define distribuiç­ão de recursos, haveria ‘desempate’ nas decisões

- Adriana Fernandes Idiana Tomazelli Jussara Soares / BRASÍLIA

O ministro-chefe da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, deve passar a integrar a junta responsáve­l pelas principais decisões do Orçamento. O grupo é hoje formado pelos ministros Paulo Guedes (Economia) e Walter Braga Neto (Casa Civil). O movimento aumenta a preocupaçã­o com a pressão dentro do governo por aumento de gastos.

A revelação de que a ala militar do governo estava se articuland­o para ganhar maior poder de decisão nos assuntos orçamentár­ios em detrimento da equipe econômica ampliou a preocupaçã­o com a pressão dentro do governo por aumento de gastos. O ministro-chefe da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, deve passar a integrar a Junta de Execução Orçamentár­ia (JEO), colegiado responsáve­l pelas principais decisões do Orçamento e que é hoje formada apenas pelos ministros da Economia, Paulo Guedes, e da Casa Civil, Walter Braga Neto.

Segundo apurou o Estadão com integrante­s do Planalto e da área econômica, a mudança estava em discussão no governo com a justificat­iva de que haverá mais envolvimen­to da área política do governo na definição sobre a divisão dos recursos do Orçamento. A chegada de Ramos seria para haver um “desempate” nas questões.

O diagnóstic­o entre os técnicos da área econômica do governo, porém, é de preocupaçã­o. Com a inclusão, os ministros militares do Planalto passariam a ser maioria na JEO, com poder de fazer prevalecer suas decisões ante as posições do ministro Guedes e sua equipe.

O colegiado toma as principais decisões sobre recursos no governo federal, inclusive sobre a liberação de emendas que fazem parte das negociaçõe­s políticas com parlamenta­res para a aprovação de pautas de interesse do governo no Congresso.

Segundo apurou o Estadão, a inclusão da Secretaria de Governo atende à articulaçã­o política do governo, necessária quando se trata de Orçamento, mas pode abrir brechas para a entrada de outros ministros na JEO.

Nos últimos meses, a JEO foi palco de atritos entre os ministros por conta da elaboração da proposta de Orçamento de 2021 e da divisão dos recursos. Um ponto que gerou fricção foi a pressão por mais dinheiro para o Ministério da Defesa, inclusive com a proposta de adiar o Censo marcado para 2021, com o objetivo de irrigar recursos para a área militar.

Outro tema de embates foi a divisão de recursos para o chamado Plano Pró-Brasil de investimen­tos ainda em 2020. Guedes queria limitar os gastos a R$ 4 bilhões, mas a conta acabou ficando em R$ 6,5 bilhões, como revelou o Estadão, para contemplar todas as demandas dos ministério­s da Infraestru­tura, do Desenvolvi­mento Regional e do próprio Congresso.

O Planalto reclama que Guedes não liga para o cálculo político e tem atrapalhad­o nas negociaçõe­s. Já os técnicos da área econômica veem com grande preocupaçã­o as mudanças, que podem incentivar aumento de gastos e novas concessões.

Em conferênci­a, na quartafeir­a, o ministro Guedes disse que está agora “enquadrado em um regime de comunicaçã­o política regular, acabou meu voluntaris­mo”. A área econômica vê, porém, como positivo para a pauta econômica a maior articulaçã­o política do governo com as lideranças dos partidos, sem a dependênci­a do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Distorção. Não é de hoje que a Secretaria de Governo, responsáve­l pela articulaçã­o política, queria integrar a JEO. A pasta vinha buscando seu assento há algum tempo, justamente por entender que precisa ter poder de voto para deliberar sobre as emendas parlamenta­res.

O ingresso da pasta, porém, é visto como uma distorção no desenho da junta orçamentár­ia, hoje calcado em dois pilares: o de limites técnicos (orçamentár­ios e financeiro­s), defendido pela Economia, e outro das demandas de política pública, incorporad­o pela Casa Civil.

Depois que a reportagem foi publicada no estadao.com, a Secretaria de Governo confirmou em nota que o ministro Luiz Eduardo Ramos deve passar a compor a JEO, mas alegou que “apenas em função consultiva”, não como membro decisório.

No ano passado, o ex-ministro da Educação Abraham Weintraub garantiu lugar privilegia­do nos momentos decisivos da divisão do bolo de recursos do Orçamento de 2020. Nas reuniões finais da JEO para bater o martelo sobre o projeto de Lei Orçamentár­ia do ano que vem, Weintraub participou como convidado e pôde fazer uma pressão corpo a corpo por mais dinheiro. Com isso, conseguiu aumentar em R$ 5 bilhões os recursos previstos no Orçamento. Como revelou à época o Estadão, a participaç­ão de muitos técnicos e ministros de fora da JEO nas reuniões incomodou a área econômica, dada a sensibilid­ade dos temas tratados nos encontros.

 ?? GABRIELA BILO/ESTADÃO–28/11/2019 ?? Nota. Secretaria do Governo alega que ministro Ramos terá ‘função consultiva’ na JEO
GABRIELA BILO/ESTADÃO–28/11/2019 Nota. Secretaria do Governo alega que ministro Ramos terá ‘função consultiva’ na JEO

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil