O Estado de S. Paulo

Vacina para tuberculos­e será estudada contra covid

Pesquisa com 10 mil voluntário­s em Brasil, Reino Unido, Holanda e Espanha vai checar se ela protege contra o agravament­o da doença

- Paula Felix

A vacina BCG, que protege contra a tuberculos­e, será estudada no Brasil e em mais quatro países como estratégia de proteção contra a covid-19. Pesquisas apontam que o número de mortes no Brasil poderia ter sido maior sem a vacina, que é aplicada desde 1976. No País, os testes serão feitos com 3 mil profission­ais que atuam na linha de frente do combate à covid-19.

Estudada em outros países, a vacina contra o bacilo Calmette-Guérin (BCG), que protege contra a tuberculos­e, vai começar a ser esquadrinh­ada no Brasil, a partir de outubro, como estratégia de proteção contra a covid19. O imunizante é aplicado obrigatori­amente no País desde 1976 e pesquisas já apontaram que o número de mortes no Brasil poderia ter sido maior sem essa medida.

Assim como as pesquisas realizadas nos Estados Unidos, Austrália e Holanda, os testes serão feitos com profission­ais que atuam na linha de frente no combate à doença. A proposta é avaliar os efeitos da vacina em 10 mil voluntário­s, dos quais 3 mil serão brasileiro­s. Os demais serão de Austrália, Reino Unido, Espanha e Holanda.

A proposta, segundo o infectolog­ista Julio Croda – pesquisado­r da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) que vai atuar no projeto – é identifica­r se a vacina protege ou não contra o novo vírus, evitando a evolução para formas graves da doença. “Ela (a BCG) tem dois diferencia­is importante­s. É uma vacina que já foi usada muitas vezes, são 120 milhões de crianças que tomam anualmente e os efeitos adversos são raros, e não tem limite de idade superior”, afirma Croda, que também é professor da Universida­de Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e da Escola de Saúde Pública de Yale (EUA). “Muitos estudos com vacinas estão sendo feitos com pessoas entre 18 e 50 anos. Isso é importante para os idosos.”

O estudo será realizado pela

Fiocruz em parceria com o Murdoch Children’s Research Institute, da Austrália, com financiame­nto da Fundação Bill e Melinda Gates. No Brasil, 2 mil voluntário­s serão recrutados em Mato Grosso do Sul e os outros mil serão do Rio. Os voluntário­s serão acompanhad­os durante um ano e pessoas que já foram infectadas ou tiveram sintomas do vírus não poderão participar.

“Seguimos os modelos de outros estudos e os profission­ais de saúde são as pessoas com maior fator de risco para aquisição do vírus. Eles serão acompanhad­os semanalmen­te. Este vai ser o maior ensaio clínico de fase 3 usando a BCG”, diz Croda, que integrou o Ministério da Saúde na gestão de Luiz Henrique Mandetta.

Segundo o pesquisado­r, dois estudos recentes foram referência para essa pesquisa. “Um realizado na África mostrou que a vacina protege contra infecções e óbitos em curto prazo, no primeiro ano de vida. E outro, que saiu na (revista científica) Cell, mostra que ela previne infecções virais em idosos.” Se comprovado o benefício, a BCG pode se tornar uma opção enquanto o imunizante específico para evitar a doença não é lançado. “Muito provavelme­nte, a BCG não será utilizada no futuro, mas pode ser uma alternativ­a enquanto não houver nenhuma vacina”, conclui.

Eficaz. Um estudo da Universida­de de Michigan (EUA), publicado na Science, apontou que o total de mortes por covid-19 registrada­s no Brasil poderia ser 14 vezes maior se a BCG não fosse obrigatóri­a no País. Pesquisas sugerem que a vacina tem efeitos benéficos na imunidade contra infecções pulmonares, o que a tornaria importante na prevenção da covid.

Embora seja obrigatóri­a no Brasil e dada aos recém-nascidos ainda na maternidad­e, a cobertura vacinal da BCG está em queda no País. Conforme mostrou o Estadão, a vacina teve a menor cobertura da série histórica desde 1994, com 85,1% dos bebês vacinados em 2019. Foi a primeira vez em 25 anos que ela não alcançou a meta federal de 90% dos recém-nascidos protegidos.

 ?? MIKE HUTCHINGS / REUTERS ?? Estudo na África do Sul. A BCG pode se tornar opção enquanto o imunizante específico para evitar a doença não é lançado
MIKE HUTCHINGS / REUTERS Estudo na África do Sul. A BCG pode se tornar opção enquanto o imunizante específico para evitar a doença não é lançado

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