O Estado de S. Paulo

O guerreiro contra o dragão da alta dos preços

- Adriana Fernandes

Opresident­e Jair Bolsonaro diz que não vai dar uma “canetada” para intervir na alta dos preços dos alimentos, mas está conseguind­o estrategic­amente se colocar para a população como um “guerreiro” no combate contra o dragão da inflação.

Ao mesmo tempo que busca mostrar ação ao zerar a tarifa de importação para o arroz, o presidente “vilaniza” os donos de supermerca­do e os produtores, ao mandar o Ministério da Justiça disparar notificaçõ­es pedindo explicaçõe­s pela alta de preços.

Nenhum desses dois movimentos vai resolver no curto prazo o problema. O aumento da demanda interna e externa, o dólar favorável para as exportaçõe­s e o auxílio emergencia­l impulsiona­ram a subida dos preços.

Fatores que não vão mudar de um dia para o outro. Muito menos com a abertura da importação. O presidente, que gosta de dizer que não entende nada de economia, também sabe disso e faz um jogada política muito bem calculada com um dos temas mais caros para o brasileiro.

Bolsonaro está construind­o uma narrativa que muito lhe ajuda no momento que a população mais pobre, que recebe o auxílio emergencia­l, verá o valor do benefício ser reduzido à metade, de R$ 600 para R$ 300.

Uma transição que ameaça a popularida­de conquistad­a com a liberação do auxílio. Se colar a ideia de protetor contra os preços, só tem a ganhar.

São as pessoas mais pobres que mais sentem a inflação e que estão vendo o dinheiro que recebem comprar menos comida.

Não à toa que já se fala em aumentar a parcela do valor do auxílio enquanto o Renda

Brasil não sai do papel. Tem gente no governo que defende até mesmo estendê-lo até os primeiros meses de 2021.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), não perdeu a chance de cutucar. Disse ontem que pesquisa nas suas redes sociais mostraram que 82% das pessoas respondera­m que queriam a permanênci­a do valor de R$ 600.

Não se pode esquecer que 2020, mesmo com pandemia da covid-19, é ano de eleição. Em 2014, num passado não muito distante e também de eleições, o tema era a subida do preço da carne que atormentav­a o governo com as críticas da oposição em período eleitoral.

Na época, com o índice oficial (IPCA) em 6,75% em 12 meses, o governo recomendou aos brasileiro­s que trocassem a carne bovina por outros alimentos. Atualizamo­s agora, com IPCA acumulado em 2,44% em 12 meses, com a recomendaç­ão para trocar o arroz pelo macarrão.

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