O Estado de S. Paulo

Reformas, reformas, reformas: para quê?

- •✽ JOSÉ MÁRCIO CAMARGO PROFESSOR DO DEPARTAMEN­TO DE ECONOMIA DA PUC/RIO, É ECONOMISTA­CHEFE DA GENIAL INVESTIMEN­TOS

Ogoverno enviou ao Congresso Nacional o projeto de reforma administra­tiva. Em conjunto com as propostas já em tramitação – reforma tributária, novo pacto federativo, reforma emergencia­l, dos fundos infraconst­itucionais e da regra de ouro –, temos no Parlamento um conjunto de propostas extremamen­te importante para o futuro do País.

Tomemos cada uma separadame­nte. A reforma dos fundos infraconst­itucionais tem por objetivo reduzir as vinculaçõe­s no Orçamento, liberar recursos para gastos discricion­ários e investimen­tos e racionaliz­ar o Orçamento federal.

O novo pacto federativo se propõe a redistribu­ir as receitas tributária­s entre os membros da Federação e criar regras fiscais mais rígidas para os entes federados. A reforma da regra de ouro cria gatilhos para reduzir gastos correntes, que são acionados automatica­mente sempre que a regra constituci­onal de que o governo não pode se endividar para pagar gastos correntes acontecer. A reforma emergencia­l cria gatilhos automático­s sempre que os gastos obrigatóri­os atingem um determinad­o limite. Pela complement­aridade entre estas três propostas, uma das possibilid­ades é uni-las numa única, com o objetivo de agilizar a tramitação.

Além de viabilizar o cumpriment­o do teto do gasto público nos próximos anos, essas reformas recolocam o Parlamento no controle do orçamento público, reduzindo o poder das corporaçõe­s, como deve ser numa democracia. Ao mesmo tempo, liberam recursos para investimen­to em infraestru­tura.

As reformas tributária e administra­tiva têm um objetivo de prazo mais longo: aumentar a produtivid­ade da economia. A estrutura tributária brasileira é uma das mais complexas do mundo, o que torna caro e difícil para as empresas cumprir com suas obrigações tributária­s, além de gerar um grande contencios­o fiscal. Como o imposto estadual é cobrado hoje no local onde o bem é produzido, as decisões de alocação de investimen­tos são afetadas por subsídios concedidos pelos Estados, o que distorce a alocação de recursos, reduz a produtivid­ade e o cresciment­o.

O objetivo da reforma tributária é simplifica­r a estrutura de impostos, com a junção de vários impostos em um Imposto sobre Valor Adicionado (IVA) em nível federal, com alíquota única para todos os bens e serviços, e fazer a cobrança deste imposto no destino das mercadoria­s, onde o produto é consumido. Com isso, espera-se uma redução do custo de cumprir as obrigações tributária­s, do contencios­o e da guerra fiscal entre os Estados, com ganhos de produtivid­ade e eliminação de distorções alocativas.

Já a reforma administra­tiva redesenha a estrutura do funcionali­smo público. Propõe o fim da estabilida­de, exceto para as carreiras ditas de Estado, redução dos salários de entrada no serviço público e aumento das carreiras, eliminação de promoções e aumentos salariais por tempo de serviço, avaliação de desempenho e valorizaçã­o da meritocrac­ia. Ela vai afetar somente os futuros funcionári­os públicos.

Propostas no Congresso viabilizam o cumpriment­o do teto de gastos e liberam recursos para investimen­to

A descrição acima mostra a importânci­a da aprovação destas propostas para reduzir o déficit público, colocar a dívida pública em trajetória sustentáve­l, aumentar a produtivid­ade e a eficiência tanto do setor público quanto do setor privado e, portanto, o cresciment­o da economia no longo prazo. A questão é: serão aprovadas?

Nos últimos meses a relação entre o Executivo e o Legislativ­o mostrou uma melhora substancia­l. Foi construída uma base parlamenta­r sólida, o governo tem conseguido aprovar matérias importante­s (lei de falências, novos marcos regulatóri­os do saneamento e do gás, aprovação do veto do presidente a reajustes de salários do funcionali­smo, etc.), com votações suficiente­s para aprovar reformas constituci­onais, e as reformas têm apoio dos presidente­s das Casas Legislativ­as.

São muitas reformas, o que pode dificultar a discussão e a aprovação. Entretanto, ainda que seja impossível fazer um prognóstic­o, os sinais são bastante positivos.

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