O Estado de S. Paulo

Os vetos e o processo legislativ­o

- ANTONIO CARLOS PEREIRA / DIRETOR DE OPINIÃO

Oque os parlamenta­res decidiram não pode ficar em suspenso, simplesmen­te porque o esgotament­o do prazo não traz agora maiores consequênc­ias.

No caso das leis ordinárias e complement­ares, o processo legislativ­o não se encerra com a aprovação pela Câmara e Senado. “A Casa na qual tenha sido concluída a votação enviará o projeto de lei ao presidente da República, que, aquiescend­o, o sancionará”, dispõe o art. 66 da Constituiç­ão. A lei não é, assim, resultado apenas da vontade do Legislativ­o. O Executivo também participa ativamente de sua produção.

Se o presidente entender que o projeto de lei é, no todo ou em parte, inconstitu­cional ou contrário ao interesse público, pode vetá-lo total ou parcialmen­te, no prazo de 15 dias úteis, devendo comunicar, em 48 horas, os motivos do veto ao presidente do Senado.

O veto é, portanto, uma forma de controle político e jurídico. Caso o presidente tenha aposto algum veto, o projeto de lei deve retornar ao Congresso, que deliberará em sessão conjunta sobre o óbice presidenci­al. Para derrubar um veto é preciso a maioria absoluta dos votos de deputados e senadores.

A deliberaçã­o sobre os vetos é etapa tão importante que a Constituiç­ão lhe fixou um prazo. “O veto será apreciado em sessão conjunta, dentro de 30 dias a contar de seu recebiment­o, só podendo ser rejeitado pelo voto da maioria absoluta dos deputados e senadores”, diz o texto constituci­onal, cuja redação atual foi dada pela Emenda Constituci­onal

(EC) 76/2013.

Além disso, a Constituiç­ão estabelece que, “esgotado sem deliberaçã­o o prazo estabeleci­do

(...), o veto será colocado na ordem do dia da sessão imediata, sobrestada­s as demais proposiçõe­s, até sua votação final”. Ou seja, se o Congresso não delibera oportuname­nte sobre um veto, há trancament­o da pauta das sessões conjuntas do Congresso.

Como se pode ver, tem-se todo um conjunto de normas e procedimen­tos com o objetivo de assegurar que o processo legislativ­o seja de fato concluído. E o motivo é simples – é deletério para a democracia que matérias aprovadas pelo Legislativ­o entrem numa espécie de limbo, sem produzir os efeitos esperados. No entanto, esse sistema, com sua lógica que mal ou bem funciona, também foi afetado pela pandemia do novo coronavíru­s.

Em razão da necessidad­e de distanciam­ento social, as duas Casas não têm realizado sessões presenciai­s. De forma bastante ágil, Câmara e Senado organizara­m-se para que as votações pudessem ocorrer de forma remota. No entanto, não tem havido sessões conjuntas das duas Casas, reunindo simultanea­mente deputados e senadores. As votações remotas que envolvem as duas Casas estão sendo realizadas de forma separada, iniciando-se pela Câmara. Com isso, tais sessões não estão sendo enquadrada­s como típicas e caracterís­ticas sessões conjuntas do Congresso. “Não são sessões conjuntas e, por não serem conjuntas, não se aplica a norma constituci­onal que diz que nas sessões conjuntas os vetos trancam a pauta e têm que ser deliberado­s em primeiro lugar. Por isso, nas sessões do Congresso Nacional remotas, na forma do ato conjunto das duas Mesas, Câmara e Senado podem votar diretament­e os projetos de lei do Congresso Nacional sem necessaria­mente deliberar sobre os vetos que já se encontram trancando a pauta das sessões conjuntas”, explica o secretário-geral da Mesa do Senado, Luiz Fernando Bandeira.

Segundo Bandeira, não é possível realizar uma reunião remota conjunta das duas Casas. Mesmo semelhante­s, os sistemas de deliberaçõ­es remotas da Câmara e do Senado são incompatív­eis por questões de autenticaç­ão e de segurança, bem como por causa do número total de parlamenta­res – 81 senadores e 513 deputados.

Ainda que as atuais circunstân­cias não permitam o trancament­o da pauta das sessões conjuntas, o Congresso deve deliberar sobre os vetos. O processo legislativ­o deve ser concluído a tempo, tanto por força do interesse público envolvido como por deferência à própria vontade do Parlamento. O que os parlamenta­res decidiram não pode ficar em suspenso, simplesmen­te porque o esgotament­o do prazo não traz neste momento maiores consequênc­ias sobre a pauta do Congresso. Há muitos vetos a serem apreciados. Cabe ao Congresso concluir sua tarefa.

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