Empresas digitais ganham mercado e atraem investidor
Magazine Luiza vê vendas darem um salto de 49% no trimestre, puxadas pelo digital, enquanto Mercado Livre antecipa lançamentos
Enquanto muitas empresas acumulam queda na atividade por causa da pandemia, negócios digitais não param de crescer no País. O Mercado Livre, por exemplo, dobrou o volume de vendas durante a quarentena. O Magazine Luiza anunciou cinco aquisições em pouco mais de um mês, depois de ver sua operação digital saltar 182%. A fintech Neon recebeu o maior aporte do ano, impulsionada pelo aumento das transações financeiras. O mesmo ocorreu com a empresa de jogos Wildlife, que virou unicórnio (nome dado às empresas que superam US$ 1 bilhão em valor de mercado) no fim de 2019, e recebeu US$ 120 milhões de fundos em agosto.
Esses resultados são um exemplo de como a pandemia reforçou o poder da tecnologia e da digitalização dentro das empresas. Apesar do tombo recente das ações de tecnologia em Nova York, que poderia soar como um risco para os negócios, as previsões são promissoras. A digitalização da população por causa do isolamento social é um caminho sem volta e deve continuar em ascensão após a pandemia, dizem especialistas.
Mesmo negócios que já nasceram digitais decidiram antecipar lançamentos. A big tech latino-americana Mercado Livre planejava para o quarto trimestre a estreia de supermercados na plataforma, mas adiantou para abril. “Também decidimos intensificar investimentos em logística, com novos centros de distribuição”, diz o líder da empresa no País, Fernando Yunes.
Ele conta que, durante a pandemia, o número de novos compradores saltou de cerca de 600 mil para algo em torno de 1,3 milhão por mês. A chegada de novos vendedores cresceu ainda mais, de 25 mil para 70 mil por mês. Com isso, a participação da empresa no mercado brasileiro de e-commerce cresceu de 30% para 34%, e elevou a valorização de seus ativos. No mês passado, o Mercado Livre chegou a ultrapassar a gigante de mineração Vale em valor de mercado, quando alcançou a marca de US$ 60 bilhões (R$ 317 bilhões), ante US$ 59 bilhões (R$ 312 bilhões) da mineradora, segundo a Economática.
Da mesma forma, o Magazine Luiza, concorrente do Mercado Livre, viu suas vendas crescerem 49% no trimestre, reflexo especialmente da operação digital, que teve uma expansão de 182% no período. Para incrementar os negócios, foi às compras e adquiriu cinco empresas entre o fim de julho e setembro.
Segundo a gerente de marketplace do Magalu, Mariana Castriota, a empresa encerrou seu processo de digitalização, tornando-se omnicanal – ou seja, atua em todos os canais, seja online ou offline. “Como uma empresa que nasceu analógica, esse processo foi importante, refletindo nos bons resultados da companhia.” Esses avanços influenciaram o valor de mercado do grupo, que teve a maior valorização na B3 em 2020. Hoje, a empresa vale R$ 143 bilhões.
“A internet é parte cada vez maior da vida das pessoas. Hoje, a decisão de compra está nas mãos do consumidor”, diz Mariana. No Brasil, a população já era bastante digitalizada no uso de redes sociais e WhatsApp. Mas havia resistência em relação às compras online. A pandemia mudou essa relação.
Dinheiro novo. De olho nesse “novo normal” e no crescimento das operações online, os fundos de venture capital, que investem em startups, continuaram ativos, apesar da pandemia. Segundo dados da consultoria de inovação Distrito Dataminer, esses investidores aportaram US$ 1,42 bilhão (R$ 7,5 bilhões) entre janeiro e agosto deste ano. O volume é inferior ao de 2019, mas considerado alto para um momento de elevada volatilidade nos mercados.
O aporte feito recentemente na fintech Neon, de US$ 300 milhões (R$ 1,59 bilhão), está fora dessas estatísticas e foi o maior feito no ano. “Nessa rodada, os investidores confirmaram a crença na robustez do negócio”, diz o copresidente executivo da fintech, Jean Sigrist, destacando que a pandemia reforçou o valor das empresas digitais.
Nos últimos 12 meses, a Neon triplicou o número de clientes, para 9 milhões, e elevou para 800 a quantidade de funcionários. Além disso, o volume de dinheiro investido dos clientes dobrou durante a pandemia. “Nossa ambição é nos tornarmos o banco da classe C. Ser digital faz toda a diferença”, diz o sócio da fintech.
Outra startup que recebeu aporte milionário foi a empresa de games Wildlife. A companhia acaba de levantar um investimento de US$ 120 milhões, liderado pelo fundo americano Vulcan Capital, que já apostou em empresas como a Loft, do setor imobiliário. A nova rodada fez a empresa, que tem mais de 100 milhões de usuários ativos mensais em seus jogos, passar a valer US$ 3 bilhões.
Segundo Leonardo Teixeira, sócio da Iporanga Ventures, um fundo de venture capital que investe em startup, a pandemia foi um “anabolizante” para o uso de tecnologias no Brasil e no mundo. E, não por acaso, as empresas digitais foram as que tiveram melhor desempenho na carteira do fundo. “No começo, a gente questionava se era transitório ou não. Hoje, vemos que muita coisa vai continuar depois da crise”, diz ele, que investe em tecnologia desde 2011.