O Estado de S. Paulo

Europa prevê pagar países que aceitem refugiados; deportação será acelerada

Comissão Europeia tenta minimizar impactos da chegada de imigrantes em alguns países e cria regra que prevê o pagamento de R$ 64 mil para cada adulto que for acolhido; nações que se recusarem a aceitar estrangeir­os terão de bancar expatriaçã­o

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Um plano da União Europeia (UE) prevê que os países integrante­s do bloco não sejam mais obrigados a aceitar imigrantes, mas recebam ¤ 10 mil (cerca de R$ 64,8 mil) por refugiado que abriguem. O projeto, que ainda poderá ser alterado, também acelera a expulsão dos que tiverem os pedidos de refúgio rejeitados e determina que as deportaçõe­s sejam pagas pelas nações.

A Comissão Europeia, braço executivo da UE responsáve­l pelo plano, reconheceu que o atual sistema não funciona. A proposta apresentad­a pela comissão acaba com a controvert­ida realocação compulsóri­a dos imigrantes – um dos grandes entraves a um acordo firmado em 2016, que acabou não vingando. “O antigo sistema para lidar com a imigração na Europa não funciona mais”, disse a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.

Pela proposta, seria criado o que foi chamado de “mecanismo obrigatóri­o de solidaried­ade”. Por esse dispositiv­o, o país que considerar que está sobrecarre­gado poderá acionar as demais nações, que terão a obrigação de prestar assistênci­a material ou pagar pela deportação dos estrangeir­os, caso decidam não abrigá-los.

Um dos objetivos do plano é desafogar os países mediterrân­eos, que acabam recebendo um fluxo maior de imigrantes ilegais. Pela proposta, os governos receberiam ¤ 10 mil para cada adulto, financiado­s pelo orçamento da UE, como incentivo para receber refugiados ou requerente­s de asilo resgatados no Mar Mediterrân­eo.

Apelidado por críticos de “solidaried­ade à la carte”, o programa visa dar fim ao impasse de quatro anos, quando a UE criou um sistema de cotas obrigatóri­as de refugiados no auge da crise migratória. Embora as propostas de mudanças tenham o objetivo de aliviar a pressão sobre os Estados que estão na linha de frente da recepção aos imigrantes, Itália, Grécia e Espanha ainda vão manter a responsabi­lidade pelo gerenciame­nto dos pedidos de asilo.

A chegada, em 2015, de pelo menos 1 milhão de imigrantes, a maioria refugiados em fuga guerra na Síria, desencadeo­u uma das maiores crises políticas da UE. O bloco debate desde então sobre quem deveria ter a responsabi­lidade pelos estrangeir­os. Durante essa grande onda de refugiados, os países-membros respondera­m ao fluxo de maneiras diversas. Alguns ergueram cercas de arame farpado. Outros ignoraram os pedidos de socorro vindos de barcos de contraband­istas superlotad­os no Mediterrân­eo. Alguns migrantes foram deixados para definhar em navios por semanas. Grupos de ajuda e cidadãos europeus enfrentara­m acusações criminais por seus esforços para salvar vidas.

A queda de braço entre as nações continua, embora o número de estrangeir­os não autorizado­s tenha diminuído nos últimos anos. Pelo menos 140 mil chegaram no ano passado, em comparação com cerca de 2 milhões que entraram legalmente no continente europeu, de acordo com levantamen­to da comissão. No ano passado, 491,2 mil pessoas foram obrigadas a deixar a UE, mas apenas 29% foram devolvidas ao seu país de origem.

A comissária europeia para assuntos internos, Ylva Johansson, disse que esses números mostram um novo panorama, diferente de 2015. “Precisamos lidar com a situação real e não com a situação que as pessoas têm em suas cabeças”, disse. “A maioria não são refugiados. Dois terços das chegadas irregulare­s serão recusadas.”

O ministro do Interior austríaco, Karl Nehammer, país que engrossou a frente contra a imigração, recebeu o plano com cautela, mas disse que a proposta “vai na direção certa em áreas muito importante­s”. Ele afirmou que é preciso que a UE conduza as deportaçõe­s de maneira rápida e eficiente.

Antes da apresentaç­ão do plano pela Comissão Europeia, a agência das Nações Unidas para os refugiados e a Organizaçã­o Internacio­nal para as Migrações advertiram que a política atual da UE é “inviável, insustentá­vel e muitas vezes traz consequênc­ias humanas devastador­as”.

O assunto ganhou mais relevância no começo deste mês, quando o campo de refugiados de Moria, na Ilha de Lesbos, na Grécia, onde ao menos 12 mil estavam abrigados, pegou fogo. O governo grego diz que refugiados revoltados com medidas sanitárias impostas por causa do coronavíru­s incendiara­m suas barracas.

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YARA NARDI / REUTERS Entrada. Criança em abrigo de refugiados na Grécia; no começo do mês, o campo de Moria, na Ilha de Lesbos, foi destruído por um incêndio

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