Bielo-russo toma posse em segredo e é contestado
Presidente faz cerimônia surpresa, oposição protesta e polícia reprime os manifestantes
O presidente da Bielo-rússia, Alexander Lukashenko, alvo de um grande movimento de protesto nas ruas desde sua reeleição em agosto, prestou juramento ontem para o sexto mandato em uma cerimônia que não havia sido anunciada. Ao descobrir a posse, a oposição reagiu e iniciou manifestações reprimidas pela polícia com bombas, jatos de água e dezenas de prisões. Estados Unidos, Alemanha e Lituânia não reconheceram o líder como presidente reeleito.
A cerimônia de posse só foi anunciada pela agência oficial Belta e pela presidência depois de concluída. “Alexander Lukashenko prestou juramento no idioma bielo-russo, depois assinou o documento e a presidente da Comissão Eleitoral entregou o certificado de presidente da República da Bielo-rússia”, anunciou a agência estatal.
A imprensa local relatou que dezenas de pessoas ficaram feridas nos primeiros confrontos entre manifestantes e a polícia logo após o anúncio oficial. Além de jatos de água, os agentes utilizaram gás lacrimogêneo para dispersar a multidão.
Muitos policiais estavam vestidos de preto e, segundo ativistas dos direitos humanos, usaram uma força desproporcional contra os manifestantes. Além da capital, Minsk, foram registrados atos em outras cidades.
Durante a manhã, os meios de comunicação independentes e as plataformas da oposição já haviam mencionado a possibilidade de a posse ocorrer de forma confidencial, depois que o cortejo presidencial foi visto cruzando a capital em alta velocidade. A principal avenida de Minsk foi fechada ao público e um grande dispositivo policial foi mobilizado ao redor da sede do governo.
“Essa posse é claramente uma farsa”, disse Svetlana Tikhanovskaya, principal rival de Lukashenko, em um comunicado no aplicativo Telegram. Tikhanovskaya, uma novata na política, hoje está exilada na Lituânia, reivindicou mais uma vez sua vitória nas urnas da eleição presidencial de agosto – ela concorreu no lugar do marido, impedido de disputar a eleição.
O porta-voz do governo alemão, Steffen Seibert, declarou em uma entrevista coletiva que “não foram cumpridas as exigências mínimas para eleições democráticas” na Bielo-rússia.
Já o ministro das Relações Exteriores lituano ironizou a cerimônia. “Que farsa! Eleições fraudulentas, posse fraudulenta”, tuitou Linas Linkevicius.
Para os opositores e a imprensa independente, a cerimônia, que deveria acontecer até 9 de outubro, foi organizada em sigilo para não se transformar em um novo catalisador de uma grande manifestação. O governo da Ucrânia informou que os seus embaixadores não foram convidados, como era de costume. Segundo a presidência bielo-russa, 700 pessoas compareceram à cerimônia de posse.
Em seu discurso, Lukashenko afirmou que seu país havia resistido a uma “revolução de cor” – apelido aos movimentos populares que expulsaram os regimes autoritários do poder desde o início de 2000, na Ucrânia, na Geórgia e no Quirguistão, com manifestantes usando cores específicas nos protestos. Para o governo russo e para Lukashenko, essas revoltas foram apoiadas pelo Ocidente.
“Não elegemos apenas o presidente do país. Defendemos nossos valores, nossa vida pacífica, nossa soberania e independência. É a decisão dos bielo-russos, que não queriam a queda de seu país”, afirmou. “Este é o dia da nossa vitória, convincente e fatídica.”
Depois da posse, em imagens publicadas pela imprensa oficial, o presidente apareceu com um uniforme militar, discursando aos soldados em formação.
“Vocês salvaram a paz neste pedaço de terra, defenderam a soberania e a independência de nosso país”, disse Lukashenko. Ele alega que países ocidentais pretendiam derrubá-lo para usar a Bielo-rússia como trampolim para uma guerra contra a Rússia. Durante uma recente visita à Rússia, o líder bielo-russo garantiu um empréstimo de US$ 1,5 bilhão (R$ 8,3 bilhões) de Putin, que havia prometido enviar uma força de segurança russa se os atos saíssem do controle.
Pavel Latushko, um ex-embaixador do país em Washington e em Paris, disse que o presidente não governa o país. “Ele é apenas o chefe da tropa de choque. Para nós, cidadãos da Bielo-rússia, e para a comunidade mundial, ele não é ninguém”, afirmou.