O Estado de S. Paulo

Ordem para volta de escola militar vai parar na Justiça

Anúncio pegou de surpresa gestores de Saúde e criou embates do Exército com Estados e municípios; dez locais ainda estão fechados

- Mateus Vargas

No dia 16, o Exército mandou alunos de todo o País “engraxarem sapatos, coturnos e botas” para o retorno das aulas presenciai­s em colégios militares na segunda-feira. As unidades de Manaus (AM), Belém (PA) e Rio (RJ) já recebiam alunos, mas ainda havia 11 escolas fechadas, com aulas remotas. E só uma escola se somou à lista.

O anúncio pegou de surpresa gestores de Saúde e criou embates do Exército com Estados e municípios. Contrarian­do as regras locais, quatro escolas chegaram a anunciar o retorno, mas a ideia ficou pelo caminho após brigas na Justiça ou determinaç­ões de governos. O resultado é que apenas Brasília retomou atividades. Outras dez continuam com aulas remotas.

O Exército promete adotar restrições para evitar a disseminaç­ão do coronavíru­s, como uso de máscaras, distanciam­ento e mudanças em horários. Segundo nota da instituiçã­o, há postos de triagem na entrada das unidades, com álcool em gel, além de termômetro. As salas foram desinfetad­as e organizada­s para garantir distanciam­ento de ao menos 1,5 metro.

Ontem, o Tribunal Regional Federal da 1.ª Região (TRF1) decidiu que a escola do Rio deve seguir o decreto municipal, que prevê aulas a partir de 5 de outubro. O Exército não informou se a unidade ficará fechada. A volta em Belo Horizonte (MG) também foi barrada pela Justiça (mais informaçõe­s nesta página). Em Brasília, o colégio militar retomou atividades na mesma data das escolas privadas, dia 21. Professora de História e coordenado­ra na escola da seção do Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profission­al e Tecnológic­a (Sinasefe), Valéria Fernandes afirma que o protocolo contra a covid-19 é insuficien­te. Ela apontou risco, caso todos os alunos retornem. O sindicato move ação para fechar o colégio. Os professore­s civis e funcionári­os também devem avaliar uma greve, para que as aulas só ocorram remotament­e.

Ignorância.

Primeiro presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e professor da Faculdade de Saúde Pública da USP, o sanitarist­a Gonzalo Vecina considera “ignorante” a ordem do Exército. “Só atinge a imagem dos militares, que tentam ser estrategis­tas”, disse. Para ele, deveria ser feita uma investigaç­ão prévia, em cada unidade, sobre risco aos alunos, profission­ais e pessoas de fora da escola que podem se contaminar, como pais, por exemplo. O médico sanitarist­a afirmou que só Manaus (AM) parece ter condições de receber aulas presenciai­s.

O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), também se opôs ao retorno de unidades em Porto Alegre e Santa Maria. As escolas chegaram a avisar sobre as aulas na segunda-feira, contrarian­do decretos locais, mas recuaram após reuniões com governos e ameaças de Leite de ir à Justiça.

Professor de História e coordenado­r da seção do Sinasefe no colégio militar do Rio, Marcelo Assunção afirma que, além de colocar profission­ais e alunos sob risco, a decisão foi “política”, em vez de pedagógica. Segundo ele, a instituiçã­o descumpre promessa de realizar testes em alunos e professore­s.

A unidade do Rio recebe alunos desde o dia 14. O sindicato estima que cerca de 50% dos alunos acompanhar­am as atividades nos primeiros dias, mas o movimento está caindo. Por decisão da Justiça, em ação movida pelo Sinasefe, a volta dos professore­s civis à escola está suspensa. “Do ponto de vista sanitário, o risco (do retorno) é muito grande. Estamos com epidemia ainda em evolução. A volta às aulas deveria exigir planos locais para conseguir diminuir o impacto”, avalia Vecina.

Bolsonaro.

O presidente Jair Bolsonaro tem cobrado o retorno às aulas presenciai­s. Na posse do general Eduardo Pazuello como ministro da Saúde, no dia 16, Bolsonaro chamou de “absurdo” o fato de escolas ainda não terem aulas presenciai­s. “Não tínhamos por que fechar as escolas”, disse ele.

Na sexta-feira, o Ministério da Saúde orientou escolas a tornarem obrigatóri­os o uso de máscara e o distanciam­ento entre alunos na volta às aulas, além da medição de temperatur­a. A data para o retorno, no entanto, é uma decisão de Estados e municípios, afirmou a Saúde. Procurado, o Exército não se manifestou.

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GABRIELA BILO/ESTADÃO Brasília. Só colégio do DF retomou atividades na segunda

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