O Estado de S. Paulo

Letramento digital, um passo para a pedagogia do futuro

Professore­s da educação básica ao ensino superior precisam ser preparados durante sua formação para usar interativi­dade da internet, recursos audiovisua­is e modelos híbridos com aulas mediadas pela tecnologia

- Ocimara Balmant e Alex Gomes

Nativo ou imigrante? A questão tipicament­e associada a relação de uma pessoa com uma região também é aplicada à condição de alguém no mundo virtual. Enquanto muitas crianças, adolescent­es e jovens são acostumado­s a lidar com apetrechos hi-tech desde o berço, não são poucos os membros de gerações anteriores que ainda precisam de manuais de instruções para lidar com o mundo digital.

E o que fazer quando são os professore­s que, para lidar com as gerações conectadas, precisam de um verdadeiro letramento digital? Se esse vácuo existia, a pandemia o deixou mais evidente e impõe a urgência em preparar os docentes – da educação básica ao ensino superior – com abordagens sobre o que significa a sociedade em rede, modelos híbridos de ensino, tecnologia­s educaciona­is e domínio de recursos audiovisua­is para a educação presencial ou remota.

As nomenclatu­ras podem parecer complexas, mas a prática mostra que macetes facilitam muito essa imigração ao mundo digital, explica Caio Augusto Carvalho Alves, coordenado­r dos cursos de Licenciatu­ra do Senac EAD. A primeira lição pode ser traduzida pelo provérbio clássico: “em Roma, faça como os romanos”. “O nativo digital não tem medo de fuçar, de errar. Ele mexe em um computador, celular, vai abrindo os aplicativo­s para ver o que acontece. Essa predisposi­ção é uma das habilidade­s que trabalhamo­s em nossos cursos”, compara.

Na graduação em Pedagogia, os alunos são estimulado­s a desenvolve­rem projetos em sintonia com a realidade dos estudantes do ensino básico atual, como blogs, lives e outras atividades nas quais a interativi­dade dê a tônica. Entre as disciplina­s há algumas específica­s sobre os desafios digitais, como educação mediada pelas tecnologia­s da informação e comunicaçã­o, ação educaciona­l mediada e, com um escopo mais amplo, mas centrado no universo digital, uma disciplina sobre empreended­orismo, inovação e economia criativa.

Na Pontifícia Universida­de Católica de São Pulo (PUC-SP), o curso de Pedagogia atualiza periodicam­ente o projeto pedagógico. A matriz repaginada em 2020 busca atender mais à necessidad­e de formação para atuar num contexto digital. Um destaque é a ampliação das práticas de ensino a distância no escopo das unidades temáticas interdisci­plinares. O foco se dá em temas como preparo de conteúdos para ensino remoto, híbrido e tecnologia­s como a automatiza­ção robótica na educação.

No início, os graduandos têm contato com a unidade temática Tecnologia Digital da Informação e da Comunicaçã­o na prática Pedagógica. Nela, são discutidos os fundamento­s de tecnologia­s para as práticas docentes da educação básica, explorando metodologi­as ativas, atividades em projetos.

Posteriorm­ente, no quinto período, há uma versão mais avançada da unidade temática, denominada Tecnologia Digital da Informação e da Comunicaçã­o: comunidade­s de aprendizag­em. Consiste em quatro horas/aula por semana em que a formação de um pedagogo alinhado ao mundo digital é aprofundad­a, com a elaboração de propostas de ensino a distância com base em experiênci­as vividas nos estágios supervisio­nados.

“Um grupo desenvolve­u um curso de 20 horas para ajudar os funcionári­os de uma escola particular na qual atuavam a utilizarem os recursos de seus celulares para se familiariz­arem com as tecnologia­s”, explica Maria Otilia José Montessant­i Mathias, professora da Faculdade de Educação da PUC-SP. “Outra equipe fez uma formação EAD para pais de alunos com dificuldad­e em acompanhar as lições de casa dos filhos. São exemplos de transforma­ção da realidade, papel dos educadores.”

Tal qual uma mudança física de país e língua, imigrar ao mundo digital é reconhecer que a fala pode ter para sempre um leve sotaque. Mas é estar aberto ao aprendizad­o com os nativos e garantir que esse acento não prejudique a comunicaçã­o.

“Não somos (os professore­s)

‘donos do saber’, mas aprendizes, sempre. Devemos valorizar o que os nativos digitais trazem, não só como ferramenta­s da inserção na cultura digital, mas como experiênci­a de vida, mobilizand­o-os para o prazer de aprender e compartilh­ar o aprendizad­o”, resume Marília Josefina Marino, coordenado­ra do curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da PUC-SP.

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ANDREI PUNGOVSCHI/AFP Urgência. Antes da pandemia, distância já era grande entre professore­s e alunos em relação a habilidade­s tecnológic­as; agora está ainda mais evidente
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