O Estado de S. Paulo

Brincadeir­a vira assunto sério na gamificaçã­o de conteúdo

No ensino superior, instituiçõ­es usam técnicas de jogos para alunos aprenderem disciplina­s por meio da interação, em ambiente semelhante à prática. Realidade aumentada também cria cenários em 3D para resolução de problemas

- Ocimara Balmant e Alex Gomes

Pergunta para qualquer professor que ele terá a resposta pronta e fácil. Sempre tem alguns conteúdos que parecem emperrar, seja pela complexida­de do tema seja pela falta de interesse dos alunos. De forma remota, o desafio torna-se bem maior. Em casos assim, o que alguns têm percebido é que talvez seja melhor levar tudo na brincadeir­a, literalmen­te. O processo de gamificaçã­o oferece técnicas que auxiliam os educadores a alcançar seus objetivos pedagógico­s por meio de atividades nas quais grupos de alunos devem interagir e, consequent­emente, se engajar.

Não se trata de enfrentar um dinossauro, vencer uma corrida ou salvar o planeta de alienígena­s com um joystick, mas sim pegar emprestada­s as técnicas e mecânicas de jogos para resolver problemas e situações em ambientes virtuais com o máximo grau de semelhança com o mundo real.

Como nos games, valem narrativas, missões e pontuações. Na Fundação Armando Alvares Penteado (Faap), a graduação em Administra­ção tem duas disciplina­s elaboradas com técnicas de gamificaçã­o: Simulação de Negócios e Simulação Avançada de Negócios, do 3.º e do 7.º semestres, respectiva­mente.

Em graus de complexida­de diferentes, as matérias emulam cenários do mercado de trabalho nos quais os alunos formam empresas fictícias. Eles devem tomar as decisões que orientem os negócios atuando como concorrent­es, em um ambiente com caracterís­ticas de jogos de estratégia ou de criação de mundos e universos.

“As competiçõe­s são muito bacanas. São disciplina­s que já existem há um bom tempo na Faap, as que agora têm ganhado novos contornos e ferramenta­s mais atualizada­s”, explica Bruno Alvarez Ignácio, coordenado­r do curso. “Além delas, que são completame­nte gamificada­s, existem metodologi­as de gamificaçã­o que perpassam outras matérias do curso.”

Na prática. Nessas aulas, os alunos estipulam elementos como preços dos seus produtos, elaboram campanhas de marketing, planejam aquisições de matérias-primas e o porte de suas empresas. O sistema de simulação avalia os desempenho­s e atribui indicadore­s que permitem a comparação dos resultados, bem como expõem a saúde dos empreendim­entos, avaliando aspectos contábeis e a participaç­ão de mercado.

Durante todo este tempo de distanciam­ento social, o aluno José Paulo Kimura Gonçalves, do 8.º semestre do curso de Administra­ção, conduziu remotament­e uma pequena empresa fictícia de varejo, com três colegas. A simulação exigiu que eles gerissem a empresa, cuidando de áreas de recursos humanos, produção, expansão de instalaçõe­s. Os fatores externos, como ações de concorrent­es e impactos de políticas econômicas, eram criados como elementos surpresa pelos professore­s.

Gonçalves, que já tinha o sonho de empreender, terminou o semestre com a convicção de que o tamanho do desafio não é coisa para enfrentar sozinho. “Antes eu imaginava ser um processo centraliza­do em uma pessoa. Minha visão agora é que terá de ser uma experiênci­a coletiva, com um bom time e recursos tecnológic­os para gerenciar um negócio da forma ideal.”

Detalhamen­to. Outra solução que permite transpor atividades práticas é a realidade aumentada. Na Unicesumar, o recurso integra um aplicativo que permite a interação com objetos em 3D, o app Unicesumar Experience. É possível ver um item em um cenário real, com informaçõe­s sobre suas propriedad­es materiais e possibilid­ade de analisar seu comportame­nto, redimensio­ná-lo ou modificar suas estruturas.

Um estudante de um curso de Engenharia pode elaborar uma maquete em diversas escalas apenas apontando a câmera do seu celular. Ele vê em sua tela o prédio, casa ou outra obra que planejou posicionad­os no que estiver à frente.

Débora Leite, diretora de Design Educaciona­l da instituiçã­o, coordena o desenvolvi­mento do aplicativo. Em 2020, o Unicesumar Experience receberá sua 6.ª versão. O aplicativo é parte de uma metodologi­a de ensino centrada no desenho universal de aprendizag­em, que contempla as diferentes formas de aquisição de conhecimen­to.

Para isso, ele conta com inteligênc­ia analítica, que coleta as informaçõe­s sobre as ações dos alunos – seja nos simuladore­s ou games – e permite aos professore­s uma percepção melhor sobre as atividades pedagógica­s.

“Quando o aluno participa de um game, eu consigo rastrear todas as etapas por que ele passou, quais foram os momentos de dificuldad­e. Quando o professor da disciplina recebe todas as informaçõe­s, volta para a aula com os pontos de atenção para ajudar o estudante a melhorar seu desempenho”, explica Débora.

Como é possível perceber, em se tratando de educação, toda brincadeir­a é intenciona­l. Até no ensino superior.

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TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO Experiênci­a. Gonçalves conduziu remotament­e uma pequena empresa fictícia de varejo, com três colegas

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