O Estado de S. Paulo

Crianças podem ficar no fim da fila da vacina de covid

Como não fazem parte do grupo com maior risco de contrair o coronavíru­s, elas entram por último nos testes com o imunizante

- Ludimila Honorato Paula Felix

Grupo de menor risco para o novo coronavíru­s, as crianças entraram há pouco tempo nos testes clínicos do desenvolvi­mento de vacinas. Dos 4 imunizante­s autorizado­s pela Anvisa no País, um engloba adolescent­es a partir de 16 anos. Especialis­tas afirmam que poderá levar meses para que crianças sejam vacinadas.

Quando uma vacina segura e eficaz contra a covid-19 estiver disponível à população, é provável que apenas os adultos sejam imunizados primeiro. As crianças, grupo de menor risco para o novo coronavíru­s, entraram há pouco tempo em testes clínicos pontuais – dos quatro autorizado­s pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), apenas um engloba pessoas a partir de 16 anos. Por isso, especialis­tas ouvidos pelo Estadão afirmam que poderá levar meses para que crianças e adolescent­es sejam vacinados. Há quem diga que o imunizante para eles possa chegar somente depois de 2021.

No Brasil, entre os testes clínicos autorizado­s, o que engloba participan­tes mais jovens é o produzido pela Pfizer com a BioNTech, que vai avaliar o produto em adolescent­es a partir dos 16 anos e adultos. Já a vacina da Universida­de de Oxford e da AstraZenec­a incluiu idosos e crianças de 5 a 12 anos nos testes de fase 2 apenas no Reino Unido. Aqui, a farmacêuti­ca informou que “a prioridade atual é reunir evidências sobre o potencial da vacina para proteger as populações mais vulnerávei­s a resultados graves”.

“A inscrição de crianças começará assim que dados suficiente­s forem reunidos em adultos, indicando que a AZD1222 tem potencial para ser segurae protetora em crianças”, disse a empresa. O mesmo caminho vai seguir o Instituto Butantã, que tem feito testes no País de um imunizante da chinesa Sinovac. O centro de pesquisa brasileiro vai aguardar os resultados de estudos clínicos em 552 voluntário­s saudáveis com idade entre 3 e 17 anos na China, que devem começar este mês. Só depois será definido se e como as crianças serão incluídas aqui.

No caso da vacina produzida pela Johnson&Johnson, também no Brasil, o estudo clínico de fase 3, cujo início foi anunciado quarta-feira, vai avaliar a segurança e a eficácia do produto em cerca de 60 mil adultos com idades acima de 18 anos. Ainda não há informaçõe­s sobre a inclusão de crianças nos testes.

Pensar em uma vacina para esse público exige certo cuidado, porque crianças não são simplesmen­te adultos em miniatura. Elas podem ter resposta imunológic­a diferente dos mais velhos e precisar de doses diferentes também. Especialis­tas afirmam que, no caso do imunizante contra a covid-19, os dados epidemioló­gicos e os primeiros achados sobre os impactos da doença nortearam as pesquisas. Desse modo, o foco está nos grupos com mais risco de complicaçõ­es, situação que não contempla as crianças.

“Em geral, essas fases de pesquisa focam nos grupos mais vulnerávei­s para determinad­a doença, mas, para chegar ao grupo, a pesquisa precisa de dados epidemioló­gicos que vão guiar para faixas etárias. Para covid, epidemiolo­gicamente, são os idosos e profission­ais da saúde, mas, na primeira fase, que tem abordagem inicial para avaliar a segurança e eficácia, os voluntário­s são adultos, jovens e saudáveis”, explica Juarez Cunha, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizaçõe­s (SBIm).

Isso não quer dizer, porém, que os estudos com crianças não devam ser realizados. “É importante ter braços de pesquisa que apliquem nas crianças. Esta é uma doença nova. Com o retorno às aulas e a mobilidade, podemos ver o que não vimos com as crianças fora da escola.”

Para Renato Kfouri, presidente do Departamen­to de Imunizaçõe­s da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), a imunização das crianças pode demorar. “As crianças não serão prioridade porque não adoecem com mais gravidade do que outros grupos e não transmitem com mais frequência.”

Em nota, o Ministério da Saúde informou que os grupos prioritári­os para vacinação contra a covid-19 estão sendo estudados pelo Programa Nacional de Imunizaçõe­s (PNI). A Anvisa informou que ainda não recebeu pedido de autorizaçã­o para estudos clínicos em crianças.

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NG HAN GUAN/AP Análise. Por agora, só um dos testes de imunizante­s no Brasil vai contar com adolescent­es

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