O Estado de S. Paulo

Os republican­os contra as redes

- PEDRO DORIA E-MAIL:COLUNA@PEDRODORIA.COM.BR TWITTER: @PEDRODORIA

Os presidente­s executivos de Google, Facebook e Twitter foram convocados a se apresentar perante o Senado americano na próxima quinta-feira, dia 1.º de outubro. O convite – por enquanto é um convite – foi feito em cima da hora. Até o momento em que a coluna fechou, os executivos ainda não haviam se manifestad­o. Mas o momento é particular­mente delicado. As eleições presidenci­ais ocorrerão em 3 de novembro. Ou seja, a audiência é um mês antes. E o Partido Republican­o

está querendo fazer algumas mudanças muito importante­s na legislação que cobre a internet.

Tanto a Casa Branca quanto os senadores trumpistas querem mexer com a seção 230 do Ato da Decência nas Comunicaçõ­es, de 1996. Bill Clinton era presidente, a internet era um fragmentad­o de muitas páginas da web soltas, GIFs piscantes, placas de ‘site em construção’ e barulho de modem lento ligado à linha telefônica para conexão. Mas já estava crescendo tão rápido que foi preciso correr com uma lei que a regulasse. A preocupaçã­o dos parlamenta­res era com acesso de crianças a pornografi­a. Mas a lei se tornou mesmo importante pela seção 230: ela determinav­a que um site que abre espaço para terceiros publicarem algo não pode ser responsabi­lizado judicialme­nte pelo conteúdo.

Ou seja: quem escreveu pode ser processado. O site onde foi escrito, não. Naquela época, já havia dois ou três casos de empresas miúdas com risco de quebrar por processos milionário­s.

A lei criou uma barreira de proteção que permitiu à internet que crescesse. O Google seria fundado dali a dois anos. O Facebook, só oito anos depois. O Twitter nasceu quando a lei completava seus primeiros dez anos. Foram, todas, empresas miúdas, hoje são grandes corporaçõe­s. Esta lei, exatamente como ela é, permitiu que se desenvolve­ssem sem ameaças de uma enxurrada imediata de processos que as sufocariam. É até irônico, claro. Mas foi assim.

Não são poucos os críticos da seção 230. Afinal, estas mesmas empresas seguem não tendo rigorosame­nte nenhuma responsabi­lidade por tudo o que é publicado em seus domínios. E, no tempo das fake news em que a desinforma­ção rege a política, corporaçõe­s que passam do US$ 1 trilhão como o Google, ou estão quase lá como o Facebook, parecem estar se saindo na melhor.

Mas o que o Partido Republican­o deseja não é controlar as fake news. É controlar o que chama de “remoção seletiva” de conteúdo. Ou seja, impedir que as redes sociais produzam algum tipo de controle, de moderação. Não é só nos EUA – também aqui no Brasil, assim como em certos países da Europa – políticos de direita acusam as redes sociais de censurarem sua voz. Enquanto pesquisado­res, especialis­tas e adversário­s acusam estes grupos de terem chegado ao poder manipuland­o informação, falseando dados, explorando teorias conspirató­rias, tudo pela hábil exploração das fraquezas estruturai­s das próprias redes.

As eleições em 3 de novembro são chaves. Segundo análise do site FiveThirty­Eight, que desenvolve modelos estatístic­os para analisar o conjunto de pesquisas, o democrata Joe Biden tem 77% de chances de vencer Donald Trump e seu partido tem 63% de chances de fazer maioria no Senado.

Existe, portanto, a possibilid­ade de os republican­os estarem completame­nte fora do poder em 2021 – com minoria nas duas casas do Congresso e sem a Casa Branca. Mas, ainda assim, nada pode ocorrer.

O problema imposto pelo digital à democracia é grave e tudo começa por compreendê-lo. O Dilema das Redes, que estreou na Netflix, é didático como só. Explica o mecanismo. Todo eleitor deveria assisti-lo.

O problema imposto pelo digital à democracia é grave e tudo começa por compreendê-lo

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil