O Estado de S. Paulo

Celso de Mello antecipa saída e deflagra sucessão no STF

Relator de inquérito que investiga Bolsonaro, Celso de Mello deixa a Corte dia 13 de outubro, três semanas antes de se aposentar; Planalto já discute nome para vaga

- Rafael Moraes Moura / BRASÍLIA / COLABORARA­M VERA ROSA, DANIEL WETERMAN e CAMILA TURTELLI

O decano do STF, Celso de Mello, informou à Corte que vai se aposentar em 13 de outubro. A decisão do ministro, que antecipa em três semanas a data prevista para seu desligamen­to, abre a primeira vaga no Supremo para indicação do presidente Jair Bolsonaro. O favorito para ocupar a cadeira é o ministro da Secretaria-geral da Presidênci­a, Jorge Oliveira.

O decano do Supremo Tribunal Federal (STF), Celso de Mello, anunciou ontem que vai deixar a Corte no dia 13 de outubro. A decisão do ministro, que antecipa o seu desligamen­to em três semanas, abre a primeira vaga no STF para indicação do presidente Jair Bolsonaro. Hoje, o favorito para ocupar a cadeira do decano é o ministro da Secretaria-geral da Presidênci­a, Jorge Oliveira. A articulaçã­o pela aprovação do nome de Oliveira já vem sendo feita nos bastidores do Senado.

Relator do inquérito que investiga se Bolsonaro tentou interferir politicame­nte na Polícia Federal, Celso de Mello completa 75 anos em 1.º de novembro, quando se aposentari­a de forma compulsóri­a. “Espero poder julgar, na medida do possível, os casos de que sou relator”, afirmou o ministro ao Estadão. “Razões estritas (e supervenie­ntes) de ordem médica tornaram necessário, mais do que meramente recomendáv­el, que eu antecipass­e a minha aposentado­ria, que requeri, formalment­e, no dia 22/9/2020.”

A antecipaçã­o da aposentado­ria de Celso de Mello não apenas acelerou as articulaçõ­es em torno da definição do seu sucessor como reacendeu na Corte a discussão sobre quem deve assumir a relatoria do inquérito que investiga Bolsonaro. Integrante­s do STF se dividem sobre o tema e ainda é incerto o destino do caso em que o ex-ministro da Justiça Sérgio Moro acusou Bolsonaro de intervir na PF.

Na avaliação de Celso, o STF, “responsáve­l pelo equilíbrio institucio­nal entre os Poderes do Estado e detentor do ‘monopólio da última palavra’ em matéria de interpreta­ção constituci­onal, continuará a enfrentar (e a superar), com absoluta independên­cia, os grandes desafios com que esta Nação tem sido confrontad­a ao longo de seu itinerário histórico”.

Ao Estadão, o magistrado rechaçou especulaçõ­es levantadas nas redes sociais de bolsonaris­tas, que atribuíram a antecipaçã­o da aposentado­ria a uma tentativa de se livrar do imposto de renda. “Não foi por invalidez! Foi uma simples e voluntária aposentado­ria, eis que possuo pouco mais de 52 anos de serviço público (Ministério Público paulista + Supremo Tribunal Federal)”, afirmou.

Visto no Planalto como “inimigo”, Celso havia determinad­o que Bolsonaro prestasse depoimento presencial­mente, mas a decisão foi derrubada pelo ministro Marco Aurélio Mello. A discussão está marcada para começar no dia 2 de outubro. Marco Aurélio já rechaçou a hipótese de herdar o caso e defende um sorteio eletrônico para definir o novo relator. Ao menos

‘Ordem médica’

“Razões estritas de ordem médica tornaram necessário que antecipass­e a minha aposentado­ria.”

“Espero poder julgar, na medida do possível, os casos de que sou relator.” Celso de Mello

DECANO DO SUPREMO

três ministros ouvidos pela reportagem também pregam a redistribu­ição antes que o escolhido por Bolsonaro assuma a cadeira do decano.

Fatura. Amigo do presidente, Jorge Oliveira é considerad­o no Planalto como um nome que não traria problemas como os que outros chefes do Executivo tiveram com suas escolhas. Além de Oliveira, o ministro da Justiça, André Mendonça, está no páreo, e evangélico­s defendem para a vaga o juiz federal William Douglas, que tem apoio do senador Flávio Bolsonaro (Republican­os-rj).

A saída de Celso também deu fôlego a outros movimentos políticos. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), tem agora uma carta na manga para aprovar sua recondução ao cargo e pode cobrar a fatura. Motivo: é ele quem define o calendário para a sabatina do novo ministro do Supremo. A indicação de

Bolsonaro precisa passar pelo crivo do Senado.

Alcolumbre tenta aval do STF para disputar novo mandato em fevereiro de 2021, já que a Constituiç­ão proíbe a recondução de presidente­s da Câmara e do Senado ao cargo na mesma legislatur­a. O assunto foi discutido em recente jantar na casa do senador Weverton Rocha (MA), líder do PDT. “Ainda não temos nem indicação. Como posso falar em tramitação?”, disse Alcolumbre.

Para o Planalto, Celso se converteu em militante contra o governo. O magistrado já disse que Bolsonaro “degrada” o Parlamento e “minimiza perigosame­nte” a importânci­a da Constituiç­ão. Além disso, criticou o presidente após ele dizer que pretendia indicar um nome “terrivelme­nte evangélico” para a Corte. Recentemen­te, Bolsonaro afirmou que quer no STF alguém que tome cerveja com ele.

Bolsonaro pretende dar uma “guinada conservado­ra” na escolha das duas vagas de ministros do STF que serão abertas no seu mandato. Depois de Celso, o próximo a se aposentar será Marco Aurélio, em julho de 2021. No cálculo de aliados do presidente, é considerad­a decisiva na definição dos nomes a posição contrária à “pauta de costumes”, como a descrimina­lização das drogas e do aborto.

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DIDA SAMPAIO/ESTADÃO–14/3/2019 Tribunal. Com a aposentado­ria do ministro Celso de Mello, presidente Jair Bolsonaro fará sua primeira indicação no STF

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