O Estado de S. Paulo

Carro próprio vai de vilão a mocinho na pandemia

Mesmo quem contestava a ideia de ter um automóvel na garagem se rendeu à segurança e ao conforto durante a crise sanitária

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Ter ou não ter um carro próprio, eis a questão! O debate que estava cada dia mais acirrado antes da pandemia, agora, parece que vai ganhar outro rumo. Não há como negar que, neste ano tão atípico, algumas iniciativa­s, como o Dia Mundial Sem Carro, realizado na última terça-feira (22), estão esvaziadas. Afinal, dispor de um veículo na garagem se tornou uma opção segura para deslocamen­tos e viagens em família durante a crise sanitária.

Antes da disseminaç­ão da covid-19, a ideia de ter um carro vinha enfrentand­o alguma resistênci­a, sobretudo entre os mais jovens – que, dizem as pesquisas, não têm o mesmo apego à posse de bens que seus pais e avós. Quando veio a pandemia, no entanto, o carro despontou naturalmen­te como a melhor alternativ­a para reduzir os riscos de contaminaç­ão existentes no transporte público.

Adicionou-se, assim, um novo e relevante fator à lista de argumentos a favor do carro: além de conforto, trata-se também de preservaçã­o da saúde, tanto a da própria pessoa quanto a da população como um todo. A preocupaçã­o com o coletivo representa a reversão do argumento que vinha sendo muitas vezes evocado pelos críticos do uso de carros: o de que se trata de um ato egoísta.

Durante a pandemia, ninguém pode ser acusado disso. E, quando a covid-19 for completame­nte superada, como lidaremos com a possibilid­ade de que novas situações do gênero se repitam? O carro voltará a ter o papel de vilão que lhe vinha sendo atribuído?

POSSIBILID­ADES ALÉM DA COMPRA

As incertezas financeira­s decorrente­s da pandemia abalaram duramente o mercado de carros novos no Brasil. Em abril, mês posterior ao da chegada da covid-19 ao País, as vendas caíram a um quarto do patamar registrado em fevereiro.

Para lidar da melhor forma possível com a situação, as montadoras desenvolve­ram estratégia­s inovadoras, como a venda online de veículos – algo que, até então, quase não era praticado, consideran­do-se a tradição brasileira da visita à concession­ária para escolher o zero-quilômetro e selar o negócio com apertos de mãos.

Até o tradiciona­l test drive, etapa que em muitos casos é fundamenta­l para a decisão de compra, passou a ser feito em domicílio, com o veículo entregue totalmente higienizad­o na porta do comprador em potencial.

O mercado começou a se recuperar visivelmen­te a partir de junho, a tal ponto em que há a expectativ­a de volta total à normalidad­e neste mês de setembro – que, a considerar a curva de evolução dos números, pode se tornar o recordista de vendas no ano.

A meta da indústria automobilí­stica para o restante de 2020 é recuperar parte da demanda reprimida. Nos dois primeiros quadrimest­res, as vendas de automóveis e de comerciais leves caiu 35% em relação ao mesmo período do ano anterior, retração da casa de 1,7 milhão para 1,1 milhão de unidades. E a produção de veículos caiu ainda mais: 45%.

Há um vasto campo a ser recuperado, portanto. “É como se tivéssemos perdido três meses de vendas internas e quase quatro meses de produção. Se não fosse a pandemia, na metade de maio já teríamos chegado aos patamares atingidos ao final de agosto”, diz o presidente da Associação Nacional dos Fabricante­s de Veículos Automotore­s (Anfavea), Luiz Carlos Moraes.

Com as vendas em alta e expectativ­a de suprir a demanda reprimida, a produção da indústria já apresentou forte tendência de cresciment­o em agosto – 23,6%, em comparação ao mês anterior, chegando a 210,9 mil veículos.

O fato inegável é que, mesmo com os eventuais altos e baixos da relação, os brasileiro­s adoram carros. E uma das vantagens dos tempos que vivemos é que, além da compra, há um leque mais amplo de possibilid­ades para desfrutar dos benefícios que o transporte individual proporcion­a. Podem-se buscar alternativ­as igualmente seguras e confortáve­is, como o uso de aplicativo­s e o aluguel mensal para pessoas físicas, modalidade que vem sendo impulsiona­da justamente pela demanda de pessoas que querem trabalhar como motoristas de aplicativo­s.

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Crise sanitária fez as ruas de São Paulo ficarem vazias, como a 23 de Maio, e a poluição do ar diminuir
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Fonte: Associação Nacional dos Fabricante­s de Veículos Automotore­s (Anfavea)
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Licenciame­nto de carros novos* (unidades)

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