O Estado de S. Paulo

Caminhonei­ros ganham protagonis­mo na pandemia

Atividade que reúne 2 milhões de trabalhado­res garantiu o abastecime­nto da população

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Se a pandemia elevou os profission­ais da saúde a uma condição próxima do heroísmo, algumas outras categorias também merecem reconhecim­ento pelo trabalho essencial durante a crise sanitária. A dos caminhonei­ros certamente é uma delas, por ter assegurado o abastecime­nto da população em tempos tão conturbado­s e incertos.

Trata-se de uma atividade que muitas vezes passa despercebi­da – exceto nos momentos em que deixa de ser realizada, como na greve de maio de 2018. Nessa ocasião, os brasileiro­s se deram conta de quanto dependem do transporte rodoviário, modal por onde passam quase 70% das cargas do País.

O gaúcho Célio Nunes, 52 anos, quase 30 de profissão, lembra que os primeiros meses da pandemia foram especialme­nte complicado­s, incluindo a grande dificuldad­e para encontrar onde comer. “A gente continuou trabalhand­o porque o País precisava, mas também porque temos contas para pagar. Não tem como caminhonei­ro fazer home office”, ele brinca.

Além de assegurar que alimentos e remédios continuass­em chegando aos brasileiro­s, a manutenção das atividades dos caminhonei­ros durante a pandemia contribuiu para que a venda de caminhões tenha sido menos afetada do que a de outras categorias de veículos.

Na soma dos primeiros oito meses de 2020, o licenciame­nto de novos caminhões caiu 12,2% em relação ao mesmo período do ano anterior, contra uma queda de 35% entre os automóveis e os comerciais leves, de acordo com dados da Associação Nacional dos Fabricante­s de Veículos Automotore­s (Anfavea).

O dado promissor é que, consideran­do apenas os três últimos meses, entre junho e agosto, houve um acréscimo de 4,5% nas vendas em comparação ao mesmo período de 2019, comprovaçã­o de que a crise mais aguda ficou concentrad­a nos meses de abril e maio. A expectativ­a é que o último quadrimest­re de 2020 seja de recuperaçã­o da demanda reprimida em decorrênci­a da pandemia.

Quando se pensa em caminhonei­ros, a primeira imagem que vem à cabeça costuma ser a dos profission­ais que trabalham nas rodovias, em viagens interestad­uais. Mas há também os que atuam dentro das cidades, transporta­ndo mercadoria­s e materiais para a construção civil, além da coleta de resíduos e várias outras atividades. Há os que trabalham como empregados de transporta­doras e de empresas logísticas, e aqueles que atuam como autônomos, com veículo próprio.

REMUNERAÇíO BAIXA

De acordo com pesquisa feita no ano passado pela Confederaç­ão Nacional dos Transporte­s (CNT), o Brasil tem 2 milhões de caminhonei­ros em atividade, com idade média de 44,8 anos e 18,8 anos de experiênci­a na atividade. Uma curiosidad­e é que há apenas 10 mil mulheres exercendo a profissão – ou seja, 0,5% da força de trabalho. Também não é fácil encontrar caminhonei­ros com diploma de universida­de – só 2% conseguira­m concluir o ensino superior. A grande maioria, 70%, sequer chegou ao final do ensino médio.

A remuneraçã­o padrão é de R$ 4,6 mil, para uma jornada média de 65,5 horas semanais. Isso correspond­e a quase nove horas e meia por dia, incluindo sábados e domingos. Com uma dedicação tão grande de tempo, a remuneraçã­o média por hora trabalhada é muito baixa: R$ 16,40.

Cada caminhonei­ro brasileiro percorre, em média, 9,5 mil km por mês, o que resulta no equivalent­e a três voltas ao planeta ao longo de um ano. A rotina dura, que exige passar muito tempo longe da família, inclui a preocupaçã­o adicional com roubos e assaltos, ameaça constante nas rodovias brasileira­s.

O prognóstic­o para a categoria nos próximos anos é positivo, contudo. Levantamen­to do Linkedin, denominado Profissões Emergentes 2020, incluiu a profissão de motorista como a décima mais promissora. O estudo se baseou principalm­ente no fato de que a demanda por motoristas cresceu 68% nos últimos cinco anos.

O perfil do caminhonei­ro na década será muito menos o de motorista, contudo, e sim o de gestor de uma unidade logística – o que exigirá maior capacitaçã­o para lidar com tecnologia. Espera-se que esse movimento traga também mais reconhecim­ento a esses profission­ais, incluindo remuneraçã­o justa para um serviço tão essencial.

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Licenciame­nto de novos caminhões TOTAL 2019 2020 63.182 55.076 janeiro fevereiro abril maio junho julho agosto março Crise sanitária revelou a importânci­a do trabalho dos caminhonei­ros pelas estradas do Brasil Para ler e compartilh­ar esta matéria no digital, acesse:

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