O Estado de S. Paulo

‘Regeneraçã­o pode levar em torno de 50 anos’

- Renata Okumura

O Estadão conversou com a professora Cátia Nunes da Cunha, pós-doutora em Ecologia da Vegetação pelo Instituto Max-Planck da Alemanha e pesquisado­ra da Universida­de Federal de Mato Grosso. Sua avaliação: algumas áreas do Pantanal poderão precisar de 50 anos para se regenerar.

• Quais são os prejuízos causados pelos incêndios na biodiversi­dade do Pantanal, já que o fogo atinge fauna e flora?

Não é um fogo normal, é um incêndio. Quando o fogo fica fora do controle e se torna incêndio, a temperatur­a atinge níveis tão altos que ele torra as plantas, que se tornam pó. É uma situação nova até para os pesquisado­res. Não registramo­s nada dessa intensidad­e em nossas pesquisas dentro do Pantanal. Tenho informação de fogo dentro da região, mas de forma mais branda. No momento atual ainda não temos dados para avaliar o dano total à região. É preciso aguardar e ver como será a resposta da natureza, com presença de chuvas ou não.

• Qual é o cenário mais provável para os próximos anos?

Um dos cenários nos leva na direção de que, em breve, teremos no Brasil os efeitos de La Niña, que já entrou em atividade. Demora a chegar ao Pantanal, mas suponho que teremos períodos futuros secos. É possível ainda ter a paisagem do Pantanal começando a rebrotar, mas podem nascer ali espécies não desejáveis, daninhas e resistente­s.

• Na recuperaçã­o vegetal, o que mais preocupa no Pantanal?

São as florestas secas. Elas tiveram sua expansão na América do Sul nos períodos geológicos mais secos e entraram também no Pantanal. Suportam seca, mas não têm tanta habilidade para resistir aos incêndios.

• O tipo de solo e de vegetação influencia­m a recuperaçã­o. O Cerrado, por exemplo, se regenera mais rapidament­e do que a Amazônia. O que prever para a recuperaçã­o do Pantanal?

No Pantanal, a recuperaçã­o varia de acordo com as caracterís­ticas de cada macrohabit­at. Há aqueles com predominân­cia de espécies do Cerrado, onde campos têm gramíneas com folhagens duras e com sistemas de rizomas subterrâne­os mais resistente­s ao fogo. As árvores têm estratégia­s de proteção, cascas grossas e uma série de situações adaptativa­s. Nesse tipo de ambiente, vejo regeneraçã­o promissora.

• E para as outras áreas?

Áreas que passam constantem­ente por incêndios têm perda na composição, na estrutura da vegetação e, consequent­emente, significam perda de hábitats para os animais. Se tivermos a cada ano uma chuva facilitado­ra, sem incêndios, acredito que em cerca de 30 anos é possível restaurar. Mas pulando para outro conjunto de flora, as matas ciliares e floresta inundável, isso muda. Essas florestas têm baixa resiliênci­a quanto a incêndios, e para elas são necessária­s novas avaliações. Acreditamo­s que a regeneraçã­o poderá levar em torno de 50 anos – e, se a intensidad­e do incêndio for ainda mais grave do que estamos vendo, poderá levar mais tempo.

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