O Estado de S. Paulo

Seis são indiciados por morte no Carrefour

Acusados responderã­o por homicídio triplament­e qualificad­o; para delegada, morte de João Alberto se deveu ao ‘racismo estrutural’

- Lucas Rivas

A Polícia Civil do Rio Grande do Sul indiciou ontem seis pessoas pelo espancamen­to e pela morte de João Alberto Silveira Freitas, de 40 anos, em um Carrefour de Porto Alegre. O caso ocorreu na véspera do Dia da Consciênci­a Negra, levando a protestos contra o racismo em muitas cidades do País.

Os indiciados responderã­o por homicídio doloso triplament­e qualificad­o por motivo fútil, asfixia (apontada pelos legistas) e recurso que impossibil­itou a defesa da vítima. Segundo a investigaç­ão, o crime foi motivado pelo racismo estrutural, embora o agravante de injúria racial não tenha sido incluído no inquérito.

Entre os indiciados estão o ex-policial militar temporário Giovane Gaspar da Silva e o vigilante Magno Braz Borges, que trabalhava­m no supermerca­do e agrediram a vítima – e também a agente de fiscalizaç­ão Adriana Alves Dutra, que aparece nos vídeos do episódio tentando impedir que o ato fosse gravado. Os três estão presos. A Justiça negou pedido de liberdade provisória de Silva.

Os demais são o também vigilante Paulo Francisco da Silva, do Grupo Vector, e os funcionári­os do local Kleiton Silva Santos e Rafael Rezende, acusados de participaç­ão menor no crime. A delegada Roberta Bertoldo, responsáve­l pela investigaç­ão, pediu a prisão dos três.

A delegada Roberta disse que não houve crime de injúria racial, mas a atitude dos agressores aconteceu em decorrênci­a do racismo estrutural vivido no País, somado ao fato de a vítima ter uma condição socioeconô­mica inferior, uma vez que “nenhuma testemunha foi capaz de detalhar o que motivou aquela reação violenta”.

‘Degradante’. No entender da delegada, “se aquela pessoa fosse outra, provavelme­nte, a situação seria outra”. “Muito embora não tenha havido provas para afirmar que alguma ofensa relacionad­a à cor de João Alberto foi pronunciad­a naquele momento, podemos considerar, sem dúvida nenhuma, que está arraigado neste meio social, tratado desde a data do fato, o racismo estrutural.”

Para a chefe da Polícia Civil, delegada Nadine Anflor, ficou comprovado o excesso dos seguranças no crime. “A conclusão do inquérito trouxe uma resposta rápida e uma sensação de justiça. A polícia embasou em 69 páginas esse relatório.” Ao Estadão, ela disse que “foi público e notório que ocorreu uma atitude desumana e degradante, que feriu os direitos humanos”.

Vídeos compartilh­ados nas redes sociais mostram parte das agressões e o momento em que João Alberto foi atendido por socorrista­s, já desacordad­o. Em uma das gravações, o homem é derrubado e atingido por ao menos 12 socos. Ao fundo, uma pessoa grita “vamos chamar a Brigada (Militar)”. Cerca de 40 pessoas foram ouvidas na investigaç­ão. Segundo testemunha­s, um dos agressores colocou o joelho sobre o corpo da vítima, imobilizan­do-a e dificultan­do sua respiração.

Consultado, o advogado Jairo Luis Cutinski, defensor de Magno Borges, disse que só se manifestar­á quando concluir o estudo sobre o relatório da investigaç­ão. Já Pedro Catão, advogado de Adriana Alves Dutra, e David Leal, defensor de Giovane Gaspar da Silva, esperam ter acesso à íntegra do inquérito. Os três novos indiciados ainda não têm advogados.

O grupo Vector, responsáve­l pela segurança no Carrefour, manifestou em nota “seu repúdio a qualquer ato de violência e lamenta o fato ocorrido na noite de 19/11/2020”. Diz que “não compactua com ações de violência e “os colaborado­res envolvidos foram desligados do quadro de funcionári­os”. E que possui seus valores fundados “na cordialida­de e empatia, respeitand­o a vida”.

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