O Estado de S. Paulo

Políticos jovens estão usando a tecnologia para fidelizar eleitores pelos resultados.

- João Gabriel de Lima

Na guerra pelo voto, há quem use o fígado. São políticos que cultivam inimigos, apostam na divisão da sociedade, espalham fake news. Às vezes – você conhece alguns exemplos – dá resultado. Há, no entanto, políticos que preferem usar o cérebro e fidelizar os eleitores a partir de resultados. Eles recorrem a estudos, visitam universida­des, processam dados usando a melhor tecnologia. No Brasil, são sobretudo políticos jovens. Para nossa sorte, essa geração conquista seguidores e, cada vez mais, vence eleições.

Eles representa­m, na política, a fronteira do conhecimen­to, e despertam o interesse de universida­des no mundo inteiro. Na era digital, o conhecimen­to se forma em redes. Estudos sobre as melhores práticas circulam internacio­nalmente entre departamen­tos de ponta. Na área de ciência política, o Instituto de Ciências Sociais (ICS) da Universida­de de Lisboa é um dos nós dessa rede globalizad­a. Na semana passada, um seminário do ICS recebeu um estudioso brasileiro, Gilson Dutra.

Dutra trabalha com Felipe Rigoni (PSB-ES). No gabinete do deputado capixaba, ele desenvolve­u um método de tomada de decisões baseado em dados. Tal método é aplicado, por exemplo, nas tradiciona­is emendas parlamenta­res. O gabinete de Rigoni criou um edital em que eleitores mandam propostas para a aplicação do dinheiro das emendas. As ideias são submetidas a estudos de impacto, a partir dos quais o deputado faz suas escolhas. Rigoni não é o único a usar métodos acadêmicos. Ele compartilh­a uma equipe de estudiosos com outros dois parlamenta­res, de partidos diferentes – o senador Alessandro Vieira (Cidadania-se) e a deputada Tabata Amaral (PDT-SP).

As redes de conhecimen­to que ajudam os políticos a usar o cérebro se valem do método científico. O processo começa com uma pergunta-problema. Por exemplo: como uma cidade cuja economia se baseia na mineração pode sobreviver depois que as jazidas acabarem? Para responder a esta questão, gestores públicos de Canaã dos Carajás (PA) recorreram à Agenda Pública, uma organizaçã­o da sociedade civil. A ideia inicial era criar um distrito empresaria­l. Ao olhar os dados, o time liderado pelo cientista político Sérgio Andrade constatou que haveria competição de outras cidades da região, como Paraopebas. A análise sugeriu que Canaã dos Carajás se tornasse um pólo de conhecimen­to na área de agricultur­a e mineração. O município investiu nessa vocação, atraiu duas universida­des públicas e se prepara para criar uma universida­de municipal.

Outra pergunta-problema: como criar seguros sociais para os mais de 40 milhões de trabalhado­res informais brasileiro­s, que sejam sustentáve­is no longo prazo? Tal questão orientou os trabalhos do Centro de Debates de Políticas Públicas (CDPP), a partir de uma provocação do movimento Livres. Os estudos começaram logo depois do lançamento do auxílio emergencia­l – o qual, sabia-se desde o início, só funcionari­a no curto prazo. O resultado foi um projeto de lei que, publicado no site do CDPP, serviu de base para a “Lei de Responsabi­lidade Social” que está sendo discutida no Congresso. Fernando Veloso, um dos integrante­s da força-tarefa do CDPP, está em um dos minipodcas­ts da semana. Em outro, o entrevista­do é Sérgio Andrade, da Agenda Pública.

O time do cérebro e da análise de dados prevalecer­á sobre o time do fígado e das “fake news”? Só depende do cidadão brasileiro, chamado a opinar a cada eleição.

O time do cérebro e da análise de dados prevalecer­á sobre o time das ‘fake news’?

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