O Estado de S. Paulo

A vacina é a privatizaç­ão

- •✽ ADRIANO PIRES DIRETOR DO CENTRO BRASILEIRO DE INFRAESTRU­TURA (CBIE)

Oano de 2020 está terminando ou nunca começou? Bom é se nunca tivesse iniciado ou que pudesse ser deletado. Como nada disso é possível, vamos à realidade e fazer algumas constataçõ­es, análises e reflexões sobre este ano em que o mundo ficou de cabeça para baixo.

No início da pandemia, lá pelos meses de abril e maio, as previsões eram de que o PIB brasileiro iria cair uns 7% a 8%, o consumo dos combustíve­is e de energia elétrica começou a despencar e a inadimplên­cia, a aumentar. As privatizaç­ões seriam novamente empurradas para a frente, junto com as reformas no Congresso. As consequênc­ias principais: aumento do desemprego, queda na renda e fechamento de inúmeros negócios de todos os tamanhos. Tempestade perfeita.

O que ocorreu de fato: o PIB deve cair em torno de 4% a 4,5% e o consumo de energia elétrica e de combustíve­is teve uma recuperaçã­o mais rápida do que todos imaginavam. Na energia elétrica, tivemos no início da pandemia preços como R$ 50/MWH, e agora já passaram os R$ 500/MWH, e a demanda cresceu com a retomada da economia no terceiro trimestre. Assim, em ano de pandemia estamos passando por um momento de medo de apagão no setor elétrico. Isso porque o setor está refém de duas variáveis exógenas às adversidad­es climáticas, dado que a matriz elétrica está muito dependente de fontes intermiten­tes, como hidrelétri­cas a fio d’água, eólicas e solares, e que o cresciment­o econômico em 2021 deve voltar com a chegada das vacinas. Sem falar da governança do setor elétrico, que precisa ser revista.

As privatizaç­ões continuam não ocorrendo na velocidade esperada e desejada. Isso por falta de políticas públicas, legislaçõe­s e, principalm­ente, vontade política e determinaç­ão. Isso gera instabilid­ade regulatóri­a, inseguranç­a jurídica e, consequent­emente, as privatizaç­ões continuam sendo pouco atraentes para o investidor privado nacional e o estrangeir­o. Basta ver como a concorrênc­ia para a compra de ativos tem sido baixa, mesmo com um dólar supervalor­izado.

Exemplos não faltam. Na venda das refinarias da Petrobrás temos, praticamen­te, uma empresa por refinaria. Na Bahia, só apareceu o Fundo Mubadala. Nas duas melhores refinarias à venda, a do Paraná e a do Rio Grande do Sul, parece só haver dois interessad­os, a Raízen e a Ipiranga, que pela regra do jogo só poderão comprar uma das duas. Ou seja, no fundo, temos só uma empresa por refinaria. No caso da Gaspetro apareceram somente duas propostas e o processo aparenteme­nte estaria suspenso por causa de questões ligadas ao Termo de Compromiss­o de Cessação (TCC) firmado entre a Petrobrás e o Cade. Neste processo de venda da Gaspetro também foi veiculada na imprensa a intenção da Mitsui de vender a sua parte na empresa.

Ainda na área do gás natural a Petrobrás comunicou o cancelamen­to de investimen­to no projeto de adequação de infraestru­tura da unidade de tratamento de gás de Caraguatat­uba. A decisão teria sido tomada por causa da perda de atrativida­de econômica do projeto. Mas isso vai significar menos gás natural no sistema e mostra que a ideia é reinjetar mais gás do présal e importar GNL.

No setor elétrico, o apagão do Amapá reacendeu o discurso dos contrários à privatizaç­ão da Eletrobrás, alegando que o incidente do incêndio dos transforma­dores mostrou a ineficiênc­ia da administra­ção privada e a importânci­a de mantermos a Eletrobrás estatal.

Em 2021, precisamos apagar 2020 levantando esta bandeira, que tem ficado na retórica

Ao contrário, é de extrema importânci­a que o Congresso retome o projeto de privatizaç­ão da Eletrobrás e, concomitan­temente, a agenda de modernizaç­ão do setor. Apesar dos esforços por melhores resultados, a privatizaç­ão da Eletrobrás urge, diante da restrita capacidade de investimen­to. As seis últimas distribuid­oras pertencent­es à estatal foram privatizad­as em 2018, contribuin­do para cessar com a sangria nos cofres da companhia.

Em 2021, precisamos apagar 2020 levantando a bandeira da privatizaç­ão, que foi usada de forma correta na campanha do presidente Bolsonaro, mas que, infelizmen­te, por uma série de razões, tem ficado mais na retórica do que na prática. A vacina para a economia brasileira voltar a crescer em 2021 é a privatizaç­ão. E novos investimen­tos, em particular dos setores ligados à infraestru­tura.

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