O Estado de S. Paulo

O potencial produtivo dos jovens

-

Tendo a pandemia prejudicad­o o aprendizad­o das crianças ao fechar as escolas, substituin­do o ensino presencial pelo ensino virtual, as gerações de brasileiro­s nascidos nos últimos quatro a cinco anos poderão chegar ao mercado de trabalho, no futuro, com apenas 55% do seu potencial produtivo desenvolvi­do. Por isso, dificilmen­te conseguirã­o entrar no mercado formal de trabalho.

A estimativa é do Banco Mundial. Diante da velocidade das transforma­ções tecnológic­as, que estão reconfigur­ando o mundo do trabalho, somente terão vez os jovens com formação especializ­ada e capacitaçã­o técnica, diz o órgão, que acaba de aprovar um empréstimo de US$ 1 bilhão ao Brasil. A condição é que esse dinheiro seja destinado às famílias que estão na fila de espera do Bolsa Família. Segundo o Banco Mundial, essas famílias envolvem um total de 3 milhões de pessoas, muitas delas em situação de vulnerabil­idade, necessitan­do de apoio continuado em 2021 e em 2022.

Jovens sem remuneraçã­o básica terão remuneraçã­o mais baixa e, se encontrare­m algum emprego, certamente será na economia informal, gerando menos benefícios para a sociedade, afirma – no mesmo sentido da advertênci­a do Banco Mundial – o estudo As consequênc­ias da violação do direito à educação, feito pela Fundação Roberto Marinho e pelo Insper. Ele prevê que 17% dos brasileiro­s na faixa etária entre 15 e 17 anos não conseguirã­o concluir o ensino básico, o que correspond­eria a um total de 575 mil jovens. “Esses jovens não são bens materiais, mas o principal e gigantesco ativo que um país possui”, dizem os responsáve­is por esse estudo, Wilson Risolia, Ricardo Paes de Barros, Laura Machado e Juliana Leitão.

Diante do impacto que esse problema poderá causar na ampliação da informalid­ade, no aumento da exclusão social e na elevação da criminalid­ade, a única saída seria uma oferta imediata de cursos profission­alizantes de curto prazo, diz Ricardo Henriques, diretor executivo do Instituto Unibanco, que apoia projetos de melhoria de gestão escolar elaborados por Estados e municípios. “Precisamos de uma blitz para o período de 2021 a 2023, uma vez que a expansão das empresas mais intensivas em tecnologia exigirá mais mão de obra técnica numa escala muito maior do que a gente tem”, afirma.

As conclusões desses relatórios, estudos e opiniões sobre os gargalos do sistema educaciona­l brasileiro são convergent­es. O mesmo ocorre com as soluções que estão sendo propostas em caráter emergencia­l, para tentar evitar o cenário sombrio previsto para as novas gerações de brasileiro­s pelo Banco Mundial. A implementa­ção dessas propostas, no entanto, exige uma articulaçã­o nacional que permita a ampliação em larga escala – e no menor prazo possível – de cursos profission­alizantes capazes de assegurar a formação técnica dos segmentos menos escolariza­dos da juventude brasileira.

O problema é que, desde o início do governo Bolsonaro, o Ministério da Educação (MEC) encontra-se inoperante, em estado letárgico. Dirigido por ministros ineptos, mais preocupado­s com questões ideológica­s do que com a formulação de políticas educaciona­is, eles simplesmen­te deixaram de exercer as funções de articulaçã­o. “A economia das instituiçõ­es ensinou há décadas que, nas crises, é preciso mais coordenaçã­o. No caso da educação no Brasil ocorreu o contrário. O MEC saiu de cena. Não tenho bola de cristal, mas o cenário não é otimista”, afirma Ricardo Henriques.

Apesar de o País ter se comprometi­do constituci­onalmente a garantir o direito à educação de todos, sem distinção de origem, raça, sexo, cor e idade, o direito à educação está sendo violado, dizem os responsáve­is pelo estudo da Fundação Roberto Marinho e do Insper. Segundo eles, o MEC continua sendo incapaz de compreende­r que a falta de articulaçã­o do sistema educaciona­l significa desperdíci­o de recursos escassos. “Optou-se por gastar com o sinistro do que fazer o seguro. No Brasil não se investe em educação, gastase”, concluem. No que têm, infelizmen­te, toda a razão.

O MEC não tem plano para multiplica­r a oferta de cursos profission­alizantes

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil