O Estado de S. Paulo

Gol reclama no Cade contra operação conjunta de rivais Azul e Latam

Briga no ar. As duas companhias começaram a operar cinco rotas em parceria, o que motivou uma queixa da Gol no órgão de proteção à concorrênc­ia; com a união de voos, a parceria entre Azul e Latam chegaria a dominar 77% do mercado em determinad­os trechos

- Luciana Dyniewicz

Depois da briga que opôs Azul a Latam e Gol, em 2019, por causa do espólio da Avianca Brasil, agora uma nova disputa no setor aéreo alia Azul e Latam contra a Gol. Na semana passada, a Gol pediu que o Conselho Administra­tivo de Defesa Econômica (Cade) analise e aplique sanções a suas duas concorrent­es por causa de uma operação que, segundo a empresa, pode resultar em efeitos anticompet­itivos e prejudicar o consumidor.

A operação em questão é a realização de cinco rotas aéreas conjuntame­nte. Até outubro, Latam e Azul operavam, separadame­nte, voos entre Belo Horizonte e Guarulhos, Belo Horizonte e São Paulo, Guarulhos e Porto Alegre, Brasília e Recife e Rio de Janeiro e Vitória.

Há dois meses, porém, as companhias informaram o Cade que passariam a realizar esses voos em parceria, o que significa que uma pode encerrar um voo e passar a vender passagens para o voo da outra, recebendo uma comissão por isso. É um modo que as companhias encontram para reduzir os gastos, mas não perder totalmente a receita, aumentando o número de passageiro­s por voo e ampliando lucros.

Na petição protocolad­a pela Gol na semana passada, a empresa afirma que essa mudança na forma de operação da Latam e da Azul pode significar uma concentraç­ão de mercado. “O que se tem, na realidade, é uma relevante concentraç­ão em termos de capacidade de operação em referidas rotas, o que possibilit­a às companhias aéreas envolvidas efetivo exercício de seu poder de mercado, em detrimento da Gol (único concorrent­e das partes em referidas rotas) e, principalm­ente, dos usuários do serviço de transporte aéreo”, diz a empresa.

Ainda de acordo com o documento, a rota entre Guarulhos e Belo Horizonte seria a que resultaria em maior concentraç­ão, com a Azul e a Latam passando a deter 77% dos assentos em 2021, ante 62% no quarto trimestre do ano passado. Na rota entre Brasília e Recife, passaria de 68% para 75%.

O acordo entre Azul e Latam dá mais força de venda às empresas, deixando a Gol para trás na corrida pela recuperaçã­o no pós-covid. A Gol, também na petição, reclama que essas cinco rotas que entraram na parceria das companhias estão entre as principais do segmento corporativ­o, um dos mais importante­s para o setor aéreo, mas um dos que está com a demanda mais baixa agora e que deve demorar mais para ter uma retomada. No corporativ­o, as passagens são vendidas com antecedênc­ia menor e, portanto, a preços mais elevados.

Parceria. A Azul e a Latam anunciaram em junho que tinham assinado um acordo de codeshare, pelo qual operariam em parceria 29 rotas, podendo ampliá-lo para 64. Naquele momento, porém, não foram incluídas rotas sobreposta­s, ou seja, que antes eram operadas separadame­nte pelas companhias.

Com o acordo anunciado há seis meses, uma pessoa que fizesse uma viagem com dois trechos poderia realizar o primeiro em um voo da Latam e o segundo com a Azul. A parceria, portanto, amplia destinos e frequência­s oferecidos pelas companhias. O codeshare em rotas sobreposta­s apareceu apenas agora, no fim de outubro.

O consultor André Castellini, sócio da Bain & Company e especialis­ta no setor aéreo, não vê, porém, prejuízo ao consumidor por ora. Para ele, dada a proporção da crise e ao fato de a demanda estar hoje entre 50% e 60% do que seria normal, poderia ocorrer de as empresas considerar­em certas rotas inviáveis financeira­mente e desistirem completame­nte de realizálas, o que implicaria em redução de oferta e alta de preços.

“Com o codeshare, cada uma das empresas (Latam e Azul) pode vender passagem até o avião lotar. Acaba havendo concorrênc­ia entre elas na comerciali­zação e tem o benefício de se manter mais voos em determinad­a rota do que se teria sem o codeshare.”

Procurada, a Latam informou, em nota, que “desde o início da implementa­ção do acordo de codeshare manteve comunicaçã­o e vem atualizand­o o Cade”. A Azul informou que também está “constantem­ente em contato com o Cade e sendo absolutame­nte transparen­te, notificand­o todas as rotas implementa­das em seu acordo”. Afirmou ainda acreditar que o acordo é “muito benéfico ao consumidor”. A Gol não quis se manifestar sobre o assunto.

Questionad­o, o Cade disse que não comenta processos em análise na autarquia.

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AMANDA PEROBELLI / REUTERS Escolha. Gol afirma que operação conjunta da Azul e da Latam inclui algumas das mais importante­s rotas do Brasil

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