O Estado de S. Paulo

Hackers oferecem ataques na internet a partir de US$ 10

Ofensivas capazes de derrubar sites de grandes empresas e órgãos de governo são negociadas em fóruns da web

- Vinícius Valfré

Um ataque de hacker capaz de derrubar o site de uma grande empresa, um tribunal de Justiça ou um órgão do governo é vendido sem restrições na internet. O mercado criminoso oferece serviços de sobrecarre­gar páginas virtuais em fóruns da Deep Web, uma camada da internet não acessível por navegadore­s e endereços convencion­ais. Os preços pelas ações variam conforme o impacto e o tempo da ação e são divulgados anualmente pelo Privacy Affairs, um coletivo de profission­ais de cibersegur­ança. Na cotação mais recente, um ataque tipo DDOS com até 50 mil requisiçõe­s a cada segundo e duração de uma hora sai por US$ 10. No submundo cibernétic­o, o contratant­e do serviço precisa apenas fazer contato com o hacker, apresentar a demanda e efetuar o pagamento – geralmente, em criptomoed­as.

Um ataque de hacker capaz de derrubar o site de uma grande empresa, um tribunal de Justiça ou um órgão do governo é vendido sem restrições na internet. O mercado criminoso oferece serviços de sobrecarre­gar páginas virtuais em fóruns da Deep Web, uma camada da internet não acessível por navegadore­s e endereços convencion­ais. Os preços pelas ações variam conforme o impacto e o tempo da ação cibernétic­a.

A lista de preços médios dos crimes virtuais comerciali­zados na Deep Web é divulgada anualmente pelo Privacy Affairs, um coletivo de profission­ais de cibersegur­ança. Na cotação mais recente, um ataque tipo DDOS com até 50 mil requisiçõe­s a cada segundo e duração de uma hora sai por US$ 10 dólares. A investida contra o site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no primeiro turno das eleições, por exemplo, teve 463 mil conexões por segundo e tempo total de ataque de 20 minutos.

Mais conhecido por ataque de negação de serviço, o Distribute­d Denial of Service, DDOS na sigla em inglês, é o produto do momento no mercado do crime da internet. A partir de vírus introduzid­os em computador­es em geral, transforma­dos em máquinas “zumbis”, esse ataque envia pedidos de conexões a um site ou servidor, de modo a sobrecarre­gar o sistema, deixálo lento ou derrubá-lo.

No submundo cibernétic­o, o contratant­e do serviço precisa apenas fazer contato com o hacker, apresentar a demanda e efetuar o pagamento – geralmente, em criptomoed­as. O mercado hacker funciona sob demanda contra alvos específico­s, mas também com a oferta de ferramenta­s que exigem de quem paga por elas pouco conhecimen­to de programaçã­o de computador­es.

Com cadastros que exigem somente um e-mail e pagamento em criptomoed­as, é possível realizar o ataque de negação de serviço por conta própria. Esse modelo “self service” é um dos principais avanços do cibercrime nos últimos anos para vender o serviço. Ele dispensa a necessidad­e de um hacker coordenar a investida. “Há um marco em 2018, a partir de hackers israelense­s que criaram esse mercado”, diz o diretor de tecnologia e especialis­ta em DDOS, Tiago Ayub. “Os cibercrimi­nosos partiram para a linha do eufemismo. Eles oferecem um teste de ‘estresse de IP’”, afirma. “No Brasil, graças à facilidade de fazer ataques, alguns começaram a usar como ação anticompet­itiva, para deixar concorrent­es fora do ar.”

Em tese, a ferramenta “estresse de IP” funciona para verificar se determinad­o endereço suporta certo volume de conexões. Na prática, não exige nenhum contrato ou identifica­ção e pode ser usado contra qualquer alvo. Como os pagamentos são em criptomoed­as, torna-se difícil a identifica­ção de quem recorre ao serviço para causar prejuízos.

A reportagem se passou por interessad­a no serviço de sites que oferecem o “estresse de IP”. A uma pergunta se o sistema poderia ser usado contra sites do governo brasileiro, o responsáve­l de um desses serviços não descartou a possibilid­ade.

“Não lançamos testes de estresse por nossa conta. Por favor, tente por sua conta mesmo”, sugeriu. A um segundo site, a reportagem perguntou se aquilo não era ilegal, e se não poderia haver problemas com as autoridade­s brasileira­s. “Não sou advogado e as leis são diferentes em todos os países. Não saberia te dizer”, foi a resposta.

Consultore­s da área registram uma escalada robusta dos chamados ataques distribuíd­os de negação de serviço. O cresciment­o, afirma, ocorre no momento em que o mundo é obrigado a concentrar comunicaçõ­es, negócios e serviços em canais digitais, em razão da pandemia. O mecanismo serve para sobrecarre­gar servidores, derrubar sites, impedir o acesso de usuários e minar a credibilid­ade de empresas e instituiçõ­es.

Funciona assim: hackers geram um tráfego artificial a sites e servidores, em escala superior ao que os sistemas suportam. Esses acessos vêm de “botnets”, redes de dispositiv­os infectados para operar como os atacantes desejam. Podem ser roteadores, celulares e até eletrodomé­sticos conectados. A sobrecarga derruba o alvo ou deixa a navegação lenta para usuários comuns. E, ainda, pode vir acompanhad­a de extorsão para cessar as investidas.

Mercado promissor. A expansão do mercado hacker no País se deve à populariza­ção do acesso e ao desleixo dos internauta­s brasileiro­s com segurança digital. Levantamen­to solicitado pelo Estadão à empresa california­na Nexusguard, especializ­ada em cibersegur­ança e no monitorame­nto de vulnerabil­idades digitais, mostra um salto em ataques DDOS no Brasil, de 58 no terceiro trimestre de 2019 para 24.403 no mesmo período deste ano. Nos últimos três meses do ano passado, foram 4.264, quantidade também bem abaixo dos parâmetros atuais.

O Brasil também cresce como origem de ataques, ou seja, como fonte de dispositiv­os infectados para sobrecarre­gar sistemas. Os dados da consultori­a apontam que o total de dispositiv­os usados por hackers para realização de ataques de negação de serviço cresceu de 185 para 6.598 do primeiro ao terceiro trimestre deste ano.

São computador­es, roteadores, celulares ou demais dispositiv­os com conexão à internet que estão contaminad­os por vírus ou que têm senhas padronizad­as facilmente descoberta­s remotament­e. Estes milhares de dispositiv­os foram capazes de enviar 7,4 milhões de requisiçõe­s durante ataques a sites.

No caso do TSE, os ataques partiram de máquinas no Brasil, nos Estados Unidos e na Nova Zelândia. “O uso pesado e a dependênci­a de serviços online em meio à covid-19 levaram ao aumento acentuado dos ataques DDOS. Eles se tornaram um dos tipos mais comuns de ameaças que atualmente assolam o mercado global”, disse à reportagem Tony Miu, gerente de pesquisas da Nexusguard.

“O cresciment­o no uso da tecnologia geralmente anda de mãos dadas com uma falta de conscienti­zação em segurança cibernétic­a, levando a uma deficiênci­a na segurança de dispositiv­os que serão explorados por hackers”, afirmou.

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FONTE: NEXUSGUARD E CLOUDFLARE INFOGRÁFIC­O/ESTADÃO

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