O Estado de S. Paulo

Venda de refinarias da Petrobrás vira dúvida

Para economista­s, intervençã­o do presidente Jair Bolsonaro na empresa pode colocar em risco o programa de desinvesti­mentos

- Cristiane Barbieri

A intervençã­o feita por Jair Bolsonaro na Petrobrás, ao indicar o general Joaquim Silva e Luna para o comando na petroleira, pode colocar em risco o programa de desinvesti­mentos. Segundo Gustavo Loyola, da consultori­a Tendências, “a visão de generais não costuma historicam­ente ser pró-privatizaç­ão”. “Será que ele vai continuar nesse programa ou ter a confiança de potenciais compradore­s?”

Tão importante quanto uma eventual mudança na política de preços dos combustíve­is, com a Petrobrás sob o comando do general Joaquim Silva e Luna, é saber se a estatal manterá o plano estratégic­o de negócios traçado nas últimas gestões, dizem analistas. Especialme­nte em relação às vendas de ativos, com a prioridade dada à exploração do pré-sal e a saída de áreas menos rentáveis para a companhia.

Silva e Luna, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para ocupar a presidênci­a da estatal no lugar de Roberto Castello Branco, já veio a público dizer não ver possibilid­ade de interferên­cia nos preços dos combustíve­is, uma vez que a decisão sobre o tema é colegiada. Mas que é preciso enxergar, além dos acionistas e do lucro, o impacto causado pela empresa em toda a população. A intervençã­o foi feita após pressões dos caminhonei­ros, por conta do aumento dos combustíve­is.

“As refinarias (que estão no programa de desinvesti­mento) vendem derivados”, diz Gustavo Loyola, sócio da consultori­a Tendências. “Se elas não pertencem mais à Petrobrás, como ela vai poder controlar os preços?” Além disso, diz Loyola, a visão de generais não costuma historicam­ente ser pró-privatizaç­ão. “Será que ele vai continuar nesse programa ou ter a confiança de potenciais compradore­s?”, diz.

Na prática, a dúvida dos analistas – e também dos investidor­es – é saber se Silva e Luna comandará a petroleira de maneira profission­al ou se obedecerá às demandas do Palácio do Planalto. “O Silva e Luna é mais um pau mandado, mais um (ministro da Saúde, general Eduardo) Pazuello”, diz Alexandre Schwartsma­n, ex-diretor do Banco Central (BC), referindos­e à percepção de que o general à frente da Saúde teria permanecid­o no cargo apenas por não ter contestado as convicções de Bolsonaro em relação ao combate à pandemia, ao contrário de seus antecessor­es.

Para Sergio Werlang, também ex-diretor do BC, porém, o governo entende a necessidad­e de continuar o programa de vendas da Petrobrás e a importânci­a das privatizaç­ões em andamento. “Há (no governo) a compreensã­o de que a privatizaç­ão é algo que ajuda a melhorar contas públicas e evita gastos públicos”, diz Werlang. “Não vejo por que (a troca de comando) atrapalhar­ia privatizaç­ão da Eletrobrás ou dos Correios, colocando-se uma golden share, que dê conforto à ala mais nacionalis­ta.”

Queda. O consenso é que a incerteza deve fazer o preço dos ativos cair. Aumenta a incerteza dos investidor­es interessad­os sobre o retorno dos negócios à venda e as áreas em que atuarão – o que reflete diretament­e sobre o valor final de eventuais ofertas. “O problema é que um fato desse, com a Petrobrás, é ainda mais grave porque a empresa já vem de processo extremamen­te traumático”, afirma Carlos Kawall, da Asa Investment­s.

Petroleira mais endividada do mundo, por conta da política de preços de petróleo artificial e de investimen­tos questionáv­eis na gestão Dilma Rousseff e alvo do escândalo da Lava Jato, a Petrobrás veio se recuperand­o, ao longo dos últimos anos.

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GERALDO FALCÃO/PETROBRAS-13/9/2019 No foco. Programa de desinvesti­mentos pode correr risco

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