O Estado de S. Paulo

Do projeto social para o esporte de alto rendimento

Atleta entra para seleta lista dos cinco melhores do País, mas não esquece suas raízes e quer ser exemplo para as crianças

- Silvia Herrera

O despertado­r toca às 4h20 na casa de André Luiz Silva Antonio, de 34 anos. Ele calça o tênis e se manda pelas ruas de São Bernardo do Campo para correr 8 quilômetro­s antes do nascer do sol. Se alonga durante o banho, engole café e zarpa às 6h para o trabalho, onde tem de bater o cartão às 7h. Ele é o encarregad­o da Oficina Ortopédica no setor de Prótese e Órtese do Hospital das Clínicas em São Paulo. A labuta vai até as 16h.

De lá, ele vai direto treinar 60 minutos no Parque Ceret. Toma uma ducha gelada e acelera para a Faculdade de Educação Física estudar. A aula começa às 19h. Volta para casa às 23h, e a filha de 3 anos o recebe com um grande sorriso e cheia de energia, quer brincar de cavalinho. Consegue ir dormir lá pela meia-noite e meia. No dia seguinte, é a mesma batida. No sábado, ele ‘descansa’, só corre 10km. E no domingo um treino mais longo, de 20 km.

“Um dia não podia ter apenas 24 horas, é muito pouco”, brinca Andrezinho, que é o atleta mais antigo de meio fundo do A.D.C. São Bernardo, onde está desde 2012. Sua dedicação ao esporte vem dando resultados expressivo­s. Em dezembro, ele entrou para o seleto time dos cinco melhores atletas de alto rendimento de sua categoria no Brasil.

Além de focar no Troféu Brasil, outra meta de Andrezinho é abrir uma assessoria esportiva, mas só depois de se formar em 2021 e, assim, poder oferecer mais qualidade de vida para as pessoas, principalm­ente para a criançada no projeto AEC Kauê, onde seu sonho começou, em Itaquera, na zona leste paulistana.

• Como foram seus treinos durante a pandemia?

Como trabalho no HC, fazia testes do covid-19 direto. Inclusive, já fui vacinado. Em março de 2020, parei total. Estava numa fase muito boa, vinha tendo ótimos resultados. Mas voltar a treinar me fez ser muito julgado... estava ficando louco de ficar preso dentro de casa e decidi voltar a treinar nas ruas. Fui muito xingado nas redes sociais, mas resolvi não rebater. Duas semanas depois, encontrei todos os meus algozes correndo na rua.

• Como você começou no atletismo?

Comecei como guia voluntário, assim corria e não precisava pagar as inscrições, já não tinha condições para isso. A solução para eu poder ter acesso ao kit era ajudando alguém.

• Você continua no Projeto Social AEC Kauê?

Nasci na zona leste. Toda minha família torce para o Corinthian­s, mas eu sou palmeirens­e. Eu sonhava em jogar futebol, mas conheci o atletismo com o Fran (Francisco Carlos da Silva), idealizado­r desse projeto social. Já são 16 anos de dedicação ao esporte, onde consegui comprar um apartament­o para a minha família. Através do projeto, consegui ser contratado pelo Esporte Clube Pinheiros. Minha mãe e meus irmãos continuam morando na zona leste, vira e mexe estou lá e vou no projeto, aplicar treinament­o para a criançada. Não podemos esquecer nossas raízes. Tenho muito a agradecer ao projeto. Na própria faculdade, consegui entrar com o apoio deles. Sozinho a gente não chega a lugar nenhum.

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Disposição. Andrezinho acorda cedo e treina todos os dias: atleta foi descoberto em projeto social na zona leste
ALEX SILVA/ESTADAO atleta meio-fundista Disposição. Andrezinho acorda cedo e treina todos os dias: atleta foi descoberto em projeto social na zona leste

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