O Estado de S. Paulo

Anvisa concede aval à vacina da Pfizer, ainda em negociação

Imunizante é o 1º a ter aval para uso em massa no Brasil; governo brasileiro negocia com farmacêuti­ca americana, mas diz que os itens sobre responsabi­lização por eventuais efeitos adversos impedem acordo – as mesmas cláusulas estão em contratos com outros

- Mateus Vargas Anne Warth Daniel Weterman COLABOROU ERIKA MOTODA /

A Anvisa aprovou o registro definitivo no Brasil da vacina da Pfizer. É o primeiro imunizante a ter autorizaçã­o para uso em massa no País. O governo brasileiro, porém, ainda negocia a compra da vacina da Pfizer. Projeto apresentad­o pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), prevê permissão ao poder público para assumir riscos referentes à vacina.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou o registro definitivo no Brasil da vacina produzida pela Pfizer. É o primeiro imunizante a ter autorizaçã­o para uso em massa no País – Coronavac e Oxford tem autorizaçã­o emergencia­l, para grupos específico­s. O governo brasileiro, porém, ainda negocia a compra do produto da Pfizer e vê entraves ao contrataçã­o. Já o Congresso procura destravar a compra.

A proposta mais recente da farmacêuti­ca é de 100 milhões de doses, sendo 8,71 milhões entregues até julho; e o restante, entre outubro e dezembro. Há divergênci­as, porém, em relação a cláusulas impostas pela farmacêuti­ca, como a previsão de que a União assuma riscos e custos de efeitos colaterais dos produtos – mesma exigência feita a outros países e pela farmacêuti­ca Janssen.

Como revelou o Estadão, um artigo para destravar justamente essas compras chegou a ser sugerido pelo Ministério da Saúde em discussões para elaboração da MP 1026/2021, mas foi excluído da versão final do texto. Agora, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEMMG), apresentou projeto de lei para permitir ao poder público assumir riscos. A proposta foi protocolad­a após reunião na segunda-feira com o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello.

O texto de Pacheco autoriza as empresas privadas a comprar doses dos laboratóri­os. As companhias, porém, deverão doar os produtos integralme­nte ao Sistema Único de Saúde. O setor privado só estará autorizado a comerciali­zar ou utilizar as vacinas diretament­e após o término da imunização dos grupos prioritári­os. “Desse modo, estaremos colaborand­o com o Poder Executivo da União, Estados, Distrito Federal e municípios”, afirmou.

Tanto a cláusula quanto a compra pelo setor privado são polêmicas no Senado. O líder do PSD na Casa, Nelsinho Trad (MS), apresentou um projeto diferente, autorizand­o a aquisição por empresas para que as doses sejam aplicadas diretament­e nos funcionári­os, respeitand­o as prioridade­s. “O empresário dificilmen­te vai querer comprar para o SUS.” Os dois projetos poderão ser discutidos em um só ou até incorporad­os em uma medida provisória.

Ontem, a Câmara concluiu a votação da MP 1026, que também permite que os imunizante­s sejam comprados antes do registro ou uso emergencia­l ser concedido pela Anvisa. Também

dispensa a necessidad­e de licitação para essa compra e estabelece regras mais flexíveis para os contratos.

O relator ainda propôs mudanças nas regras que determinam a análise, pela Anvisa, de pedidos de importação e uso emergencia­l de vacinas ou medicament­os que já receberam autorizaçã­o em outros países. Ele incluiu agências como as da Índia e Rússia no rol de autoridade­s sanitárias que podem levar a Anvisa a conceder o aval de forma mais rápida, o que beneficiar­ia diretament­e a aprovação dos produtos Covaxin e Sputnik V. Em outra proposta, a MP 1003/2020, que aguarda sanção presidenci­al, o Congresso já aprovou mudança similar, que contraria a agência.

Aval e negociação. A validade do registro dessa vacina da Pfizer é de três anos, e não de dez anos, o prazo mais comum. Agora a empresa pode, se quiser, comerciali­zar o imunizante com o setor privado, mas depende que um órgão interminis­terial defina o preço máximo.

Em nota, a Pfizer informou que o registro permite o uso para pessoas acima de 16 anos, com esquema de duas doses e intervalo de 21 dias entre as aplicações. O imunizante tem eficácia global de 95%. Para a população acima de 65 anos, alcança 94%, segundo avaliou a Anvisa.

“Esperamos poder avançar em nossas negociaçõe­s com o governo para apoiar a imunização da população”, declarou Marta Díez, presidente da Pfizer Brasil, em comunicado. Não há, porém, dados de eficácia em variantes, como a de Manaus, já relatada em 17 Estados.

Procurada, a Associação Brasileira de Clínicas de Vacinas disse que clínicas privadas têm interesse em comprar “qualquer imunizante” com registro, mas que a última posição da Pfizer à entidade é de que o setor público terá prioridade. Desde meados de 2020, o governo negocia a compra de doses desse produto da farmacêuti­ca. Nesta segunda-feira, em reunião com senadores, um representa­nte da Pfizer disse que só Brasil, Argentina e Venezuela negaram acordo com a empresa por rejeitarem as exigências feitas pelo laboratóri­o.

A resistênci­a do governo à compra da vacina da Pfizer foi tornada pública pelo presidente Jair Bolsonaro e pelo ministro da Saúde, Eduardo Pazuello. Em 23 de janeiro, a pasta disse que comprar esta vacina seria uma conquista de “marketing, branding e growth” para a Pfizer, mas causaria “frustração em todos os brasileiro­s”.

Isso porque a oferta de doses seria pequena – o laboratóri­o ofereceu 70 milhões, com entrega a partir de dezembro de 2020. Mas, em uma ação rara, o ministério resolveu solicitar de forma pública ao Planalto um auxílio para a compra de novas vacinas e recorreu à Casa Civil.

Já Bolsonaro, no fim do ano passado, ironizou as condições. “Lá no contrato da Pfizer está bem claro: ‘Não nos responsabi­lizamos por qualquer efeito colateral. Se você virar um jacaré, é problema de você’.”

“Esperamos poder avançar em nossas negociaçõe­s com o governo brasileiro para apoiar a imunização da população.” Marta Díez

PRESIDENTE DA PFIZER BRASIL,

EM COMUNICADO OFICIAL

 ?? JOHN LOCHER / AP–22/1/2021 ?? Eficácia. Imunizante tem eficácia global de 95% e registro permite aplicação, em 2 doses, em pessoas acima de 16 anos
JOHN LOCHER / AP–22/1/2021 Eficácia. Imunizante tem eficácia global de 95% e registro permite aplicação, em 2 doses, em pessoas acima de 16 anos

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