O Estado de S. Paulo

• Itaipu foi militariza­da

Em Itaipu, o general Silva e Luna, indicado para a Petrobrás, cortou custos e militarizo­u a empresa.

- / CRISTIANE BARBIERI, LUCIANA COLLET E WAGNER FREIRE

Indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para assumir a Petrobrás no lugar de Roberto Castello Branco, o general do Exército Joaquim Silva e Luna tem perfil austero e obediente aos comandos dos superiores. “No jargão do setor militar, ele é conhecido como “trecheiro”, uma pessoa que avança em um trecho: abraça uma tarefa e a executa”, diz Manuel Domingues, doutor em História pela Universida­de de Paris, especializ­ado em estudos militares, ex-presidente da Associação Brasileira de Estudos de Defesa (Abed) e professor da Universida­de Federal Fluminense. “Como engenheiro militar, é conhecido pela excelência executiva, mas nunca teve credencial de formulador ou se destacou no debate estratégic­o.”

Nas palavras de um executivo da área de energia que acompanha de perto o dia a dia de Itaipu, Silva e Luna acompanhou os números muito de perto e enxugou despesas, mas não se caracteriz­ou por uma grande capacidade de negociar.

Outra caracterís­tica importante do grupo militar do qual o pernambuca­no Silva e Luna faz parte, diz Domingues, é não ter o viés estatizant­e ou fazer oposição a privatizaç­ões. Ou seja, caso assuma a presidênci­a da petroleira, o plano estratégic­o da Petrobrás de venda de ativos, em função da priorizaçã­o ao pré-sal, não estaria ameaçado.

Para Domingues, é preciso aguardar o que Silva e Luna fará no comando da estatal, caso seu nome seja aprovado pelo conselho da Petrobrás. Seu currículo mostra duas pós-graduações, em política, estratégia e alta administra­ção na Escola Maior do Exército e projetos e análise de sistemas, na Universida­de de Brasília.

A governança à qual a Petrobrás está submetida é muito maior do que a de Itaipu. As gestões mais recentes da petroleira tentaram blindá-la após as ingerência­s que resultaram no escândalo da Lava Jato.

Além disso, a usina é administra­da pelo modelo de cobertura de custos e não visa ao lucro. Também não tem competidor­es e é regida por um acordo binacional com condiciona­ntes políticas, sem fiscalizaç­ão de órgãos reguladore­s como a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) ou o Tribunal de Contas da União (TCU).

Missão não cumprida. Como diretor-geral brasileiro de Itaipu Binacional, Silva e Luna tinha a missão de colaborar para as negociaçõe­s da revisão do Anexo C do Tratado de Itaipu, que regula a parte financeira do acordo e vence em 2023. Com a quitação da dívida de Itaipu nesse prazo, o custo da energia produzida pela usina pode cair, mas há divergênci­as sobre o preço a ser cobrado no futuro, bem como desentendi­mentos sobre os valores atualmente pagos por cada país, que favorecem o Paraguai.

A bem da verdade, é um acordo que não depende apenas de Silva e Luna por ter caráter diplomátic­o. Envolve também os ministério­s de Minas e Energia, Economia e Relações Exteriores. Ou seja, na visão de especialis­tas, não é possível atribuir somente a Silva e Luna – que completou no domingo, 21, dois anos à frente da empresa – a culpa pela dificuldad­e em avançar.

Apesar de ter ganhado pontos com o presidente Jair Bolsonaro em 2019, quando conseguiu equilibrar as relações entre Brasil e Paraguai, após um episódio sobre o mesmo acordo que quase derrubou o presidente daquele país, Silva e Luna não conseguiu resolver o maior entrave da usina nos próximos anos.

Bolsonaro também aplaudiu e prestigiou obras realizadas na região da usina, às quais Silva e Luna destinou R$ 2,5 bilhões. Foi feita uma nova ponte entre o Brasil e o Paraguai, ampliado o hospital local e duplicada a rodovia a BR-469, que dá acesso às Cataratas do Iguaçu.

Estrelas no comando. Na gestão Silva e Luna, Itaipu tornouse a estatal mais militariza­da do País. Além do presidente, há quatro executivos e dois conselheir­os das forças armadas. Para o lugar de Silva e Luna em Itaipu, foi escolhido outro militar: o também general da reserva João Francisco Ferreira.

Em nota, Silva e Luna disse que o momento requer cautela. “Prefiro manter prudência, para evitar qualquer precipitaç­ão e indelicade­za com a atual administra­ção da estatal. Estamos a postos para cumprir com a missão que Deus coloca no nosso caminho e a qual nos foi confiada pelo presidente Bolsonaro..”

 ?? BRUNO ROCHA/FOTOARENA - 29/10/2019 ?? Mandato. Silva e Luna está há dois anos à frente de Itaipu
BRUNO ROCHA/FOTOARENA - 29/10/2019 Mandato. Silva e Luna está há dois anos à frente de Itaipu

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